Pedro Conrade, do Neon: o negócio nasceu há apenas dois anos. Aos 26 anos de idade, Conrade precisa resolver um grande pepino (Leandro Fonseca/Exame)
Naiara Bertão
Publicado em 19 de junho de 2017 às 11h34.
Última atualização em 20 de junho de 2017 às 14h13.
São Paulo – O paulista Pedro Conrade é um daqueles empreendedores incansáveis. Quando ainda cursava o ensino médio, decidiu usar os 5.000 reais que o pai tinha lhe deixado ao morrer, alguns anos antes, para montar um negócio de revenda de biquínis. De lá para cá, já abriu e fechou uma empresa de compras coletivas e uma startup que financiava projetos. Enquanto estudava administração de empresas na Fundação Getulio Vargas, passou por um tipo de situação que qualquer brasileiro já viveu um dia — irritou-se com seu banco. “Entrei no cheque especial por causa de uns poucos reais, e o banco me cobrou 46 reais de taxa”, diz.
É o tipo de situação que não costuma mudar a vida de ninguém. Mas frequentar o cheque especial iniciou, para Conrade, uma sequência de eventos que acabaram fazendo com que tomasse uma decisão radical: virar banqueiro. Em julho de 2016, impulsionado pelo interesse de investidores que quiseram apostar no projeto, ele lançou o Neon, um banco digital com 120 funcionários e cerca de 100.000 clientes — que acessam suas contas por meio de um aplicativo no celular e sem pagar tarifas. Com apenas um terno no guarda-roupa e sem cartões de visita na carteira, Conrade é, aos 25 anos, o banqueiro mais jovem do Brasil.
Na época em que comandava a gigante de tecnologia Microsoft, Bill Gates dizia que as empresas tinham muito a aprender com clientes infelizes. Quem não aprende, afinal, abre caminho para concorrentes e empreendedores revolucionários, como o próprio Gates. Para empreendedores à caça de consumidores insatisfeitos, os bancos criaram um gigantesco mercado. Dependendo da pesquisa que se olhe, de 40% a 80% dos consumidores dizem não gostar dos bancos em que têm conta, por diferentes razões.
Um levantamento da consultoria EY, feito com 55.000 clientes bancários de 32 países, mostra que apenas um quarto deles acredita que os gerentes dão conselhos imparciais sobre produtos financeiros. De acordo com a consultoria Scratch, sete em cada dez jovens americanos preferem ir ao dentista a encarar uma conversa com o gerente da agência. A aversão aos bancos se deve, em parte, ao fato de que ser cliente deles não é uma escolha, mas uma obrigação para qualquer cidadão comum que precise pagar contas, receber e transferir dinheiro etc.
Mas virar cliente pode ser uma experiência desagradável: é preciso ir a uma agência, aguardar na fila, levar uma série de documentos, esperar o envio de outros documentos para ser assinados, cadastrar senhas com dez dígitos alfanuméricos e — só então — começar a pagar 30, 50, 80 reais de tarifa todos os meses. É verdade que clientes que têm dinheiro investido no banco recebem descontos e outras vantagens.
Mas aí surge outro problema: os bancos não têm tantas boas opções de investimento assim. Nada disso é exclusividade do Brasil: no mundo todo, os bancos exigem documentos e senhas, e fazem isso por uma necessária preocupação com a segurança. Cobrar por produtos e serviços também é, ou deveria ser, algo normal. O problema para os bancos é que a maioria dos clientes acha que paga muito e recebe pouco. Se “disrupção” é o termo da moda, o setor bancário era um que estava maduro para ser virado de pernas para o ar. Nesse ambiente, surgiram as fintechs, startups especializadas em finanças que estão protagonizando a maior transformação do mercado financeiro em décadas.
Estima-se que existam cerca de 12.000 fintechs no mundo. Segundo a consultoria KPMG, desde 2010 cerca de 130 bilhões de dólares foram investidos nessas empresas (72 bilhões somente nos últimos dois anos). No Brasil, são 244, número quatro vezes maior do que o de dois anos atrás, de acordo com dados do FintechLab, divisão de pesquisa da consultoria de inovação Clay Innovation, que compila dados desse setor. Cerca de 60% delas receberam recursos de fundos de investimento — estima-se que o total já tenha ultrapassado 1 bilhão de dólares. Em 2016, o Brasil ficou na oitava posição entre os países que mais receberam investimentos em fintechs, acima de Austrália e Japão: o total, aqui, somou 161 milhões de dólares (os líderes do ranking são China e Estados Unidos, que receberam 6,4 bilhões e 4,6 bilhões de dólares, respectivamente).
Ainda que concorram com os bancos, as fintechs funcionam de forma bastante diferente. Primeiro porque são altamente especializadas: algumas têm dois ou três produtos, mas a grande maioria oferece apenas um — cartão de crédito, cartão de débito, crédito pessoal, empréstimo com garantia, seguro de automóveis, aplicativo de planejamento financeiro, investimentos. Além disso, tentam automatizar o que podem para ser mais ágeis e ter custos menores do que os bancos. No Brasil, têm de 3 milhões e 5 milhões de clientes.
Ainda que não haja um marco preciso, os especialistas consideram o PayPal a primeira fintech do mundo. Fundado em 1999 nos Estados Unidos por cinco amigos, entre eles Peter Thiel (que posteriormente investiu no Facebook) e Elon Musk (fundador da fabricante de carros elétricos Tesla), o PayPal é um site que permite fazer pagamentos e transferir recursos, inclusive internacionais, sem a intermediação de bancos no modelo tradicional — basta cadastrar um cartão. Foi comprado pelo site de leilões eBay em 2002 e, em 2015, abriu o capital na bolsa americana Nasdaq. Hoje, tem 203 milhões de clientes cadastrados e valor de mercado de 64 bilhões de dólares, 69% mais do que o eBay.
Mas o que impulsionou de fato a geração fintech foi a crise de 2008, que gerou uma onda de desconfiança em relação aos bancos, e a facilidade de acesso a novas tecnologias. Além de mais consumidores terem smartphones e internet, os serviços de armazenamento de dados na nuvem tornaram muito mais barato montar uma empresa digital. Hoje, 27 fintechs são avaliadas em mais de 1 bilhão de dólares. Algumas já abriram o capital, como as startups americanas de empréstimos Lending Club (que reúne investidores interessados em emprestar dinheiro e pessoas e empresas que precisam de crédito) e OnDeck Capital (especializada em pequenas empresas). As quatro maiores fintechs do mundo ficam na China. No topo do ranking está a Ant Financial, que oferece um serviço de pagamento muito parecido com o PayPal, pertence ao site de comércio eletrônico Alibaba e está avaliada em 60 bilhões de dólares.
Antes de montar uma fintech, o colombiano David Vélez era um empreendedor frustrado. Cursou engenharia na Universidade Stanford e achou que sairia de lá com alguma ideia inovadora de negócio próprio, mas nada prosperou. Em 2007, acabou sendo contratado pelo fundo de private equity General Atlantic para encontrar empresas para investir. No ano seguinte, foi enviado a São Paulo para abrir o escritório da empresa. A ideia mágica finalmente surgiu quando ficou preso na porta giratória do banco. “Para completar, descobri que o juro do cartão de crédito era incrivelmente alto, de 450% ao ano. Nem sabia que era possível cobrar tanto”, diz. Vélez pesquisou sobre o assunto e, em 2014, em conjunto com os sócios Edward Wible e Cristina Junqueira, ex-executiva da área de cartões do Itaú, montou o Nubank, uma emissora de cartões de crédito que não tem tarifas — e que cobra juros de 20% a 60% inferiores aos dos grandes bancos.
Isso é possível, segundo os sócios, porque os custos da empresa são menores: quase todas as dúvidas ou reclamações de clientes são resolvidas por meio do aplicativo, e o contrato e a fatura são digitais, o que elimina a necessidade de impressão e envio pelo correio. O modelo atraiu investidores — o Nubank recebeu 180 milhões de dólares de diferentes fundos em cinco rodadas de investimento — e clientes. Já emitiu mais de 1 milhão de cartões e, com isso, tornou-se a sexta maior empresa de cartões de crédito do país, acima de Citibank, HSBC e Banrisul (o ranking exclui as varejistas).
É natural que, num país de juros altíssimos, as fintechs de crédito estejam entre as mais populares. A maior delas é a Creditas, fundada pelo espanhol Sergio Furio, que já recebeu 30 milhões de dólares de fundos, em duas rodadas de investimento. A Creditas é especializada em conceder empréstimos com garantia de imóveis e veículos. A empresa tem uma média de 18.000 reais emprestados por transação e juros em torno de 25% ao ano, ainda altíssimos, mas menores do que os 108% da média do crédito pessoal. “É difícil entender por que não existem mais alternativas com juros menores no Brasil”, diz Furio, que se mudou para São Paulo em 2012, depois de se casar com uma brasileira (na Europa, foi diretor do Deutsche Bank e da consultoria Boston Consulting Group).
A alemã Lendico, que funciona no Brasil em parceria com o banco BMG, e a brasileira Geru, que tem como parceiro o banco AndBank, concedem empréstimos de até 50.000 reais a quem tem um bom histórico de pagamentos, cobrando juros médios de 55% e 47% ao ano, respectivamente. “Como não temos agências, nossos custos são muito mais baixos do que os dos bancos e, assim, cobramos menos”, diz Marcelo Ciampolini, fundador da Lendico no Brasil. A Biva capta recursos com investidores para financiar pequenas empresas e a Work Capital antecipa recebíveis — os juros variam de 2% a 6,5% ao mês; nas financeiras, às quais essas empresas costumam recorrer, as taxas chegam a 16% ao mês.
A revolução das fintechs é um filhote das tecnologias móveis. Sem o ecossistema criado por empresas como Apple e Google nos celulares, ela não teria o impacto que tem hoje. As pessoas se acostumaram a não interagir com vendedores para pedir comida, chamar táxi, alugar filmes, e é natural que a expectativa se estenda ao mercado financeiro. Não são apenas os novos empreendedores que perceberam o potencial. Google, Apple e também a rede social Facebook decidiram entrar nesse setor: começaram a permitir que os usuários transfiram dinheiro para seus contatos e entraram na briga do mercado de meios de pagamento.
Um terço dos 33.000 entrevistados numa pesquisa da consultoria Accenture, concluída em janeiro, afirmou que estaria disposto a abrir uma conta no Facebook, no Google e também na Amazon. No Brasil, a taxa sobe para 50%. “Os clientes, especialmente os mais jovens, estão em busca de empresas financeiras que facilitem sua vida financeira e eliminem etapas. Podem ser bancos, fintechs, sites, o que for”, diz Marcelo Bradaschia, fundador do FintechLab e coordenador do primeiro curso de extensão sobre fintechs na Fundação Getulio Vargas de São Paulo.
Pode ser uma corretora, como mostra a transformação por que passou a empresa de investimentos XP. Fundada em 2001 numa salinha em Porto Alegre, tem hoje 230.000 clientes e 65 bilhões de reais sob gestão. A XP cresceu oferecendo dezenas de alternativas de investimento que não estão disponíveis nos bancões — fundos DI com taxas de administração baixíssimas, títulos de renda fixa de todo tipo, fundos multimercado sofisticados, fundos imobiliários. O discurso é que o banco pode ser bom em muitas coisas, mas é melhor ter alguém especializado cuidando de seus investimentos.
Talvez por essa razão tenha sido um choque para muitos clientes quando, em maio, a XP desistiu de abrir o capital e vendeu 49,9% do capital ao Itaú, por cerca de 6 bilhões de reais. Logo depois do anúncio, Candido Bracher, presidente do Itaú, disse que a XP continuaria operando de forma independente. “Com essa associação, vamos garantir a continuidade do modelo de negócios da XP com total independência de gestão e, assim, contribuir para o crescimento da empresa e para a geração de valor ao acionista”, afirmou Bracher.
Por ser originalmente uma corretora, a XP não é considerada uma fintech pelos especialistas na área. E, de fato, não é. Mas, tecnicalidade à parte, a XP mostrou que há uma demanda gigantesca por serviços financeiros fora dos bancos — e estão surgindo fintechs para tentar abocanhar parte desse mercado. É o caso das startups Vérios, Magnetis e Warren (cujo fundador, Marcelo Maisonnave, é ex-sócio da XP). Elas são robô-advisors, ou seja, desenvolveram um software de inteligência artificial capaz de fazer sugestões de investimento por meio de um questionário online preenchido pelos clientes.
O acompanhamento e as eventuais mudanças também são feitos de forma digital. Insatisfeito com os investimentos que tinha em seu banco, o gerente de consultoria Ricardo Carraretto decidiu testar uma delas, a Magnetis, que havia sido indicada por um amigo. Transferiu parte dos recursos para os fundos indicados pela empresa e ficou monitorando. Depois de um ano, o rendimento era cerca de 30% superior ao de aplicações semelhantes em seu banco. “Gosto do meu banco e preciso dele no dia a dia, mas encontrei alternativas de investimentos melhores fora dali”, diz.
No mundo das fintechs, também há alternativas para quem só precisa organizar melhor as contas. O aplicativo de planejamento GuiaBolso reúne automaticamente todas as informações financeiras dos usuários — cartões, empréstimos, saldo em conta-corrente (para isso, é preciso cadastrar todos os dados bancários). A partir daí, o aplicativo classifica os gastos por categoria (alimentação, lazer, educação, transportes etc.), indica há quanto tempo está sobrando ou faltando dinheiro no fim do mês e, para quem está no cheque especial ou precisa de dinheiro, mostra opções de empréstimos mais baratos.
Já tem mais de 3 milhões de usuários cadastrados. “Muitos clientes cuidam de suas finanças como se estivessem dirigindo um carro sem painel: só descobrem que estão sem gasolina quando param no meio da rua”, diz Thiago Alvarez, um dos fundadores do GuiaBolso. No setor de seguros, as fintechs Minuto e Bidu permitem que parte da contratação de seguros de automóveis seja feita por sites ou aplicativos — a conclusão da venda, porém, só acontece depois da ligação de um corretor. Já na Youse, startup de seguros da Caixa Econômica Federal, a venda também é concluída pelo site.
Quem aderiu à moda das fintechs está satisfeito com o que tem recebido. Uma pesquisa da consultoria CVA, que ouviu 4 160 brasileiros, mostra que o Nubank é o cartão mais bem avaliado do mercado nacional. Segundo outro levantamento da CVA, os bancos digitais Neon, Original (da holding J&F) e Inter (antigo Intermedium, controlado pela incorporadora MRV) têm notas melhores do que Bradesco, Itaú e Santander.
A microempresária Carina Quirino, que produz biscoitos para cachorros, só conseguiu um financiamento para expandir sua produção na Creditas: pegou 10.000 reais emprestados em 2016, pagando juros de 2% ao mês. Usou parte do dinheiro para refazer a embalagem dos biscoitos para cachorros que produzia em casa e outra parcela para encomendar biscoitos já prontos de uma indústria e revendê-los. Viu que podia lucrar mais se abandonasse a produção e ficasse só na revenda, e decidiu investir nisso: hoje, está criando um site para comercializar os produtos.
Antes do empréstimo, produzia 1 quilo de biscoitos por hora; agora, tem 100 quilos por hora para vender. A estudante de direito Nicolly Galvão cancelou os cartões de crédito do Itaú e da Lojas Americanas e, há seis meses, só tem o Nubank, que é gratuito e deu a ela um limite maior de crédito. Ela também usa o GuiaBolso e diz que o aplicativo a fez acordar mais cedo. “Quando vi a divisão de meus gastos, percebi que gastava cerca de 30% da renda só com o Uber, por pura comodidade. Achei que valia a pena acordar mais cedo e pegar ônibus sempre que possível”, diz. Assim, cortou as despesas com o Uber pela metade. “As fintechs normalmente se especializam em um único segmento do mercado, muitas vezes num único produto, e assim são capazes de atingir níveis elevados de qualidade e satisfação dos clientes”, diz Candido Bracher, do Itaú.
Mas o que esse fenômeno pode fazer com os bancos? É só questão de tempo até que as fintechs — ou Google, Amazon e Facebook — dominem de vez o mercado financeiro? E como as crianças e os adolescentes de hoje vão se comportar quando forem adultos? Será que verão utilidade em ter uma conta-corrente num bancão? O cenário que analistas e executivos do setor bancário veem hoje como o mais provável é o de divisão de mercado.
Os bancos devem perder terreno em áreas em que são pouco competitivos — a consultoria McKinsey estima que os grandes bancos internacionais perderão 90 bilhões de dólares em lucros previstos nos próximos três anos (o que representa 25% do total) em razão das fintechs e também de exigências mais rígidas de controle de riscos. Mas dificilmente vão deixar de ser o coração do mercado financeiro. As mesmas pesquisas que mostram que os clientes estão insatisfeitos com os bancos também revelam que eles confiam nas instituições financeiras e não pretendem abandoná-las.
Segundo a consultoria EY, que ouviu 33.000 pessoas de 32 países, 77% delas dizem confiar nos bancos tradicionais como provedores de seus serviços financeiros básicos, como transferências, pagamentos e poupança. No Brasil, esse índice é ainda maior: 80%. “As pessoas precisam do serviço financeiro, e o banco tradicional ainda é um meio que passa segurança. Mas as fintechs podem oferecer alternativas, muitas vezes mais ágeis e baratas, para alguns tipos de produto e serviço”, diz Rafael Schur, sócio de serviços financeiros da consultoria EY.
A regulação também tende a prolongar a relevância dos bancos. “Precisamos garantir que as fintechs tenham condições de manter os dados e o patrimônio dos clientes em segurança”, diz Otavio Ribeiro Damaso, diretor de regulação do Banco Central. O BC levou anos para autorizar as contas digitais, que dispensam o envio de documentos em papel. Além disso, aqui, só as fintechs que têm parcerias com bancos podem emprestar dinheiro — as startups fazem a análise de crédito, mas os recursos saem dos bancos, que estão sujeitos às normas internacionais de exigência de capital.
O problema, para os bancos, é que o grosso dos entrevistados nessas infindáveis pesquisas de consultorias são seus atuais clientes – muitos têm mais de 40 anos e aquele medo natural de mudar. O pensamento dominante é: meu banco é um mal necessário. Quanto mais jovem o cliente, menor o apego a marcas e hábitos estabelecidos. “Empresas nativamente digitais têm uma facilidade maior de relacionamento com esse cliente, porque as marcas são amadas. Os bancos dão uma noção de segurança, mas a burocracia é vista como um risco”, diz Guilherme Horn, responsável pela área de inovação da consultoria Accenture.
Para tentar não perder esses clientes, os bancos começaram a se mexer. Alguns dos principais bancos e financeiras do país fecharam parcerias com a startup de renegociação de dívidas Kitado, para ajudar na recuperação de dívidas em atraso. No ano passado, o banco Santander comprou, por 150 milhões de reais, a Superdigital, que oferece um aplicativo e um cartão pré-pago que permite fazer transações e pagar contas.
O Banco do Brasil abriu em junho do ano passado um escritório no Vale do Silício, onde testa novas tecnologias. Também tem, juntamente com o Bradesco, o Digio, cartão de crédito concorrente do Nubank que já emitiu 100 000 unidades. E, claro, o Itaú comprou a XP. “As fintechs são respostas comerciais diferentes para as mesmas necessidades financeiras”, diz Luiz Carlos Trabuco, presidente do Bradesco. “Não vemos as fintechs como concorrentes. Queremos incorporar essas ideias.”
Só que nem sempre é fácil. Um exemplo é o que está acontecendo com as contas digitais. BB, Itaú e Bradesco pararam de abrir contas digitais gratuitas — elas ainda existem, mas agora o cliente precisa optar por um pacote pago. As instituições não admitem, mas o que se fala no mercado é que a mudança aconteceu porque a operação não se mostrou rentável. Na lógica das startups, dar prejuízo nem sempre é sinal de fracasso.
A Amazon levou mais de seis anos para fechar o primeiro balanço no azul — já tinha o capital aberto quando isso aconteceu. A XP também ficou anos no prejuízo. Nubank e Neon deram prejuízo em 2016. Enquanto o Santander está desenvolvendo um banco digital, o Bradesco acaba de lançar o seu, o Next. Tem 150 funcionários e consumiu 120 milhões de reais em investimentos. A promessa é oferecer serviços “inovadores”, mas não gratuitos. O valor das tarifas varia de 19,95 a 39,35 reais por mês, por um pacote que inclui conta-corrente digital, cartões de crédito e débito, planejador financeiro nos moldes do GuiaBolso e dicas personalizadas de investimentos. “Aceitar perdas é mais difícil para os bancos, mas eles precisam se livrar da mentalidade de que em time que está ganhando não se mexe se quiserem inovar”, afirma Bruno Diniz, sócio da consultoria Innercore.
Faz sentido na teoria, mas, na prática, ainda é difícil saber quem tem razão. No exterior, algumas fintechs quebraram, como a empresa de pagamentos americana Clinkle, que chegou a captar 30 milhões de dólares em investimentos, e, mais recentemente, a também americana Plastc, que prometeu entregar um supercartão que substituiria todos os cartões que as pessoas levam na carteira. Para isso, havia levantado 9 milhões de dólares e já tinha 80 000 pedidos na fila de espera.
Os especialistas do setor acreditam que muitas startups devam fechar as portas até surgirem modelos indiscutivelmente bem-sucedidos. Os investidores também estão mais ressabiados e colocando menos dinheiro nessas empresas. Para os consumidores, faz pouca diferença se os melhores produtos e serviços virão do Google, do Facebook, das fintechs ou dos bancos mesmo. É evidente que uma nova geração de empreendedores está obrigando os bancos a inovar. Num mercado altamente concentrado em grandes instituições, quanto mais concorrência, melhor.