Eduardo Campos: busca de espaço fora do eixo governista (Lia Lubambo/EXAME.com)
Da Redação
Publicado em 3 de junho de 2013 às 06h28.
São Paulo - O calendário eleitoral brasileiro é inclemente. É uma eleição atrás da outra, sem descanso. Mal os vitoriosos são conhecidos e uma nova campanha tem início. É dentro dessa lógica que as peças começam a ser dispostas no tabuleiro para 2014. Estamos vivendo um momento decisivo: é a hora do flerte, mas também do blefe. O jogo se desenrola em dois níveis, envolvendo não apenas as candidaturas e as coligações para as eleições presidenciais do ano que vem.
Todas as 27 disputas para governador também são definidas neste momento-chave. Progressivamente, de 1994 para 2010, as eleições aconteceram a partir de duas grandes alianças: a do PT e a do PSDB. Mais do que isso: esses dois campos foram reproduzidos no nível estadual. A disputa pela Presidência e pelos governos estaduais se entrelaçam.
Em nenhuma das últimas cinco eleições presidenciais, o terceiro colocado se aproximou dos dois primeiros ou os ameaçou seriamente. A candidatura de Anthony Garotinho em 2002, então no PSB, pode ser vista como a exceção que confirma essa regra. Naquela ocasião, houve alguma incerteza se o candidato socialista ou José Serra, do PSDB, passaria para o segundo turno. Mas vale lembrar que naquela eleição o presidente Fernando Henrique Cardoso não era candidato. A disputa foi, portanto, mais aberta do que será a de 2014. Desde 1994, o candidato e o partido do terceiro colocado perdem estatura na disputa presidencial seguinte.
Enéas Carneiro, Ciro Gomes, Garotinho, Heloísa Helena e Marina Silva compõem esse quinteto. O roteiro é semelhante: eles despontaram, foram vistos como promessas e possibilidades, mas amargaram um desconfortável esquecimento na eleição posterior. Ciro foi o único a alcançar visibilidade em duas oportunidades e, assim, conseguiu alguma sobrevida política. Marina é a dúvida desta vez. Será que ela conseguirá ter um papel importante na eleição para o Planalto do ano que vem?
PT e PSDB, nessa ordem, têm as candidaturas mais fortes e viáveis. Há alguma razão para supor que, em 2014, esses partidos perderão sua hegemonia sobre a disputa presidencial? Não creio, sobretudo quando se leva em conta que presidentes, independentemente do país de origem, raramente perdem uma reeleição. Somente sob condições econômicas muito adversas eles não são reeleitos. A presidente Dilma Rousseff é a candidata natural do PT. Resta saber quem será a cara da oposição.
O PSDB está prestes a colocar em marcha a campanha de Aécio Neves. Conta para isso com uma base sólida, o controle dos governos estaduais de Minas Gerais, São Paulo e Paraná, o que não é pouca coisa. O que está em jogo, portanto, é a composição das chapas aos governos estaduais. Saberemos quem se alinhará, em cada unidade da federação, com as duas candidaturas presidenciais, de Dilma e Aécio. Muito se fala sobre a movimentação do governador pernambucano Eduardo Campos, do PSB. Seu partido foi o grande vitorioso das eleições municipais de 2012.
Cresceu, ganhou musculatura, mas uma candidatura presidencial em 2014 pode ser arriscada. Há quem diga que ele tem muito a perder e pouco a ganhar. Os recentes movimentos de Campos passam a impressão de que o PSB não está à vontade na posição a que foi relegado. A situação do partido foi definida na bem-sucedida montagem das alianças de 2010 que levaram Dilma à Presidência. Aí, sim, tivemos novidade. Houve uma reconfiguração importante naquela oportunidade, com a incorporação do PMDB à base petista. O PSB perdeu, então, a posição de principal aliado do PT.
A despeito do folclore de que os petistas não faziam alianças eleitorais, o fato é que o PT foi o único grande partido em 1989 a ter sua candidatura apoiada por uma coligação. O PSB estava na chapa e lá ficou nas demais eleições. A exceção se deu em 2002, quando Garotinho conseguiu impor sua candidatura contra a vontade da liderança do partido. O PSB voltou à família petista já no segundo turno da primeira eleição de Luiz Inácio Lula da Silva. A candidatura de Garotinho custou ao partido a vaga de vice-presidente, ocupada pelo PL. Dilma não é tão dada a inovações para romper com o PMDB. Por que o faria? Não há como viver sem o apoio do PMDB. Fernando Henrique e Lula bem que tentaram. Desistiram. Dilma nem tentou.
A aliança PT e PSB tem sido vantajosa para ambos. Houve, por assim dizer, uma divisão de mercados. O PT se dedica à Presidência; o PSB, aos estados. Essa divisão de mercados, porém, não foi tão clara nas eleições municipais de 2012. PSB e PT se enfrentaram em capitais onde antes cooperavam. Testaram forças, e os socialistas mostraram que conseguem defender seu território. Contudo, o PSB não se mostrou capaz de sair do Nordeste. Ganhou, fundamentalmente, onde já estava consolidado. Mesmo derrotado, o PT mostrou que não é carta fora do baralho onde o PSB governa. Improvisou candidaturas de última hora e incomodou. O recado está dado.
Eduardo Campos e o PSB, agora, têm três opções. A primeira é entrar em acordo com o PT para repetir a estratégia de 2010. O PSB apoia a chapa PT-PMDB em troca de garantias de que os dois parceiros deixarão o campo aberto — não lançarão candidatos ao governo estadual nas áreas de influência dos socialistas. Ambições pessoais e projetos políticos individuais podem atrapalhar aqui ou ali, mas as candidaturas ao Senado sempre podem funcionar como prêmio de consolação.
Uma segunda alternativa é a travessia do Rubicão, uma aliança com o PSDB em que Campos ficaria com a vaga de vice no ticket de Aécio. O acordo poderia ser selado com garantias análogas às dadas pelo PT. O PSDB e seus aliados se retirariam de alguns estados, apoiando os candidatos socialistas aos governos estaduais.
O acordo seria muito bom e vantajoso para Aécio, não tanto para o PSB. Isso porque o PSDB ganharia uma entrada e uma base eleitoral no Nordeste, algo que o PFL deu a Fernando Henrique e que o DEM não parece capaz de oferecer a Aécio. O PSB, contudo, chamaria o PT e o PMDB para a briga. A chapa Dilma-Temer construiria candidaturas de oposição nos estados dominados pelo PSB. Ou seja, o PSB colocaria em risco sua hegemonia em estados do Nordeste.
A terceira alternativa é uma aposta de longo prazo. Eduardo Campos pode se lançar à Presidência em 2014 com os olhos em 2018. Usaria a candidatura presidencial como forma de nacionalizar sua imagem, sair de Pernambuco e passar a ser uma figura nacional. Por que não tentar? No mínimo, o partido colhe uma terceira posição e se qualifica para a próxima rodada, a sucessão de Dilma, quando a chapa PT-PMDB não terá um candidato natural. A eleição de 2018 seria a oportunidade de ouro e a corrida começaria agora. Faz sentido. Mas há um problema. Um terceiro lugar não está garantido. O risco é não decolar e, em vez de mostrar força, escancarar fraqueza.
A sucessão de 2018 começou
Uma candidatura presidencial solo do PSB implicaria chamar as baterias de duas forças, PT e PSDB, que muito provavelmente apresentariam candidaturas próprias nos estados sob o controle do PSB. Em estados-chave, como Pernambuco e Ceará, o PSB não tem candidatos naturais, seus dois governadores estão num segundo mandato e não podem concorrer à reeleição. Sem controlar governos estaduais, não há trampolim para saltos em 2018.
O fato de Eduardo Campos ter diminuído sua exposição fora de Pernambuco nas primeiras semanas de maio mostra que o governador não quer adiantar o momento de sua decisão. Definir seu destino agora só aumentaria a possibilidade de virar alvo preferencial dos petistas. Mais discreto, ele dá sinais de que continua sonhando com o Planalto em 2014.
O cenário atual foi desenhado em 2010 com a bem-sucedida aliança PT-PMDB. O PSB, contudo, não pode se acomodar. Já está claro que não quer manter o status quo. Deve exibir o enorme atrativo que suas forças teriam para a oposição. Precisa fazer barulho, chamar a atenção e flertar. Quem conseguirá tirar o PT do Planalto? Quando isso vai acontecer? Bem-vindos à sucessão de Dilma.