Rodrigo Galindo, da rede de ensino Kroton: esforço para economizar mais de 150 milhões de reais por ano (Lia Lubambo/Exame)
Da Redação
Publicado em 31 de maio de 2016 às 12h38.
São Paulo — Há cinco anos à frente da Kroton, o paulista Rodrigo Galindo tem na ponta da língua uma série de números do maior grupo de educação do mundo. Muitos sempre foram disciplinadamente acompanhados por ele, como a quantidade de alunos por sala de aula, um dos principais fatores para manter a rentabilidade das turmas.
Outros só começaram a fazer parte de seu repertório agora — e revelam uma minúcia quase obsessiva. É o caso da espessura das chapas de aço que estruturam as cadeiras usadas pelos alunos nas salas de aula da rede. Desde junho, elas passaram a ter 1,2 milímetro — 0,3 a menos em relação à versão anterior.
Realizada com o apoio de um especialista americano, consultor de companhias de aviação como a Boeing, a redução micrométrica ajudou a poupar 15% do custo das cadeiras, sem afetar a qualidade ou a durabilidade. Outras 77 categorias que somam gastos superiores a 750 milhões de reais por ano também passaram por análise semelhante.
O resultado é uma economia de 151 milhões de reais em 12 meses, o equivalente a uma redução de pouco mais de 20% do total desses gastos. Ao longo deste ano, outras 56 delas que equivalem a 900 milhões de reais anuais em compras passarão pelo mesmo tipo de análise. “Estamos buscando desperdícios com lupa”, diz Rodrigo Galindo, presidente da Kroton.
Num aspecto, em meio a uma das mais severas recessões da história do país, Galindo permanece como uma das exceções. A companhia faturou 5,2 bilhões de reais em 2015, 40% mais em relação ao ano anterior. O lucro líquido cresceu 47% no mesmo período e chegou a 1,7 bilhão de reais.
Mas, mesmo sem vestígios da turbulência no balanço, tanto cuidado em dissecar a operação em busca de redução de gastos dá uma medida do senso de urgência instaurado na maioria das empresas brasileiras.
Segundo uma pesquisa exclusiva realizada pela consultoria BTA, da especialista em comportamento organizacional Betania Tanure, a pedido de EXAME, 44% dos 679 executivos consultados afirmam ter realizado cortes de custos em 2015. E o mesmo percentual continuará empenhado em deixar o negócio mais enxuto neste ano.
Uma atitude conservadora é o que se espera em qualquer crise, ainda mais numa tão grave e persistente quanto esta. O que mais chama a atenção é a falta de perspectiva em relação a um novo ciclo de prosperidade. Em meio às dificuldades e às dúvidas, mais de 70% dos executivos estão pessimistas ou neutros em relação aos resultados do negócio para os próximos dois anos (veja quadro ao lado).
“A quantidade de incertezas torna qualquer decisão mais difícil neste momento”, afirma Betania Tanure. Acertar a data e a profundidade dos cortes está longe de ser uma discussão simples. Cortar como se não houvesse amanhã pode trazer alívio imediato, mas compromete o futuro. Investir demais, na expectativa de uma recuperação rápida, pode ser uma atitude igualmente perigosa.
É uma tarefa ainda mais complexa neste momento em que vivemos. A possibilidade iminente de impeachment da presidente Dilma Rousseff, o efeito da Operação Lava-Jato no cenário nacional de investimentos e a dúvida que paira sobre a condução da política econômica brasileira, sobretudo diante de um rombo fiscal, engrossam um caldo de desconfiança geral.
Na hipótese da manutenção do governo Dilma até o final do mandato, em 2018, a previsão da consultoria Tendências é que a queda do PIB chegará a 6% neste ano, seguida de uma queda de mais 0,6% em 2017. Nesse cenário, o agravamento dos principais indicadores econômicos até lá é irrefreável.
As projeções mostram que a inflação deverá chegar a quase 10% ao ano, o desemprego ultrapassará a taxa de 13% e o dólar chegará perto dos 5 reais até o ano que vem. Os investimentos deverão recuar quase 20% ainda neste ano. Na hipótese de renúncia ou impeachment nos próximos meses, as dificuldades devem seguir, embora menores.
Nesse caso, o PIB poderia retrair 4% em 2016, mas voltaria a crescer a uma taxa de 1,2% em 2017. A inflação se aproximaria do centro da meta a uma taxa de 5,2% e, na seara dos investimentos, haveria um aumento de 2,3% no ano que vem. Consultores, acadêmicos e gurus de gestão há tempos investigam o comportamento das empresas na tentativa de descobrir a estratégia mais vitoriosa em uma crise.
A primeira constatação não é muito animadora: a maioria tende mesmo a se dar mal. Um dos mais completos estudos sobre o tema foi publicado por pesquisadores da Universidade Harvard, nos Estados Unidos, em 2010. Os autores analisaram 4 700 empresas abertas durante três grandes crises nos Estados Unidos — as de 1929, 1990 e 2001.
E observaram o desempenho dessas companhias nos três anos anteriores ao período de recessão, durante e três anos depois. Apenas 63% delas sobreviveram. Dessas, a maioria — cerca de 80% — não recuperou os índices de crescimento de receita e de lucro nos três anos que se seguiram à recessão.
Há um alento, porém. Existe certo consenso sobre algumas diretrizes que podem aumentar a chance de sucesso, embora não haja ciência infalível nessa área. No caso do levantamento de Harvard, os pesquisadores encontraram quatro perfis de comportamento (veja quadro ao lado).
E avaliaram qual deles concentrava mais companhias bem-sucedidas, ou seja, que obtiveram um crescimento 10% maior na receita e no lucro em relação às concorrentes diretas. No topo da lista estão as que pisaram no freio de um lado, mas aceleraram de outro. São as que os pesquisadores chamam de progressistas. Elas priorizaram ganhos de eficiência operacional, em vez de demissões.
E investiram bem mais do que suas concorrentes em marketing e em pesquisa e desenvolvimento. Para elas, a taxa de sucesso chegou a 37%. Um exemplo é a varejista Target, uma das maiores dos Estados Unidos. Entre 2000 e 2002, em plena recessão, a varejista ampliou o número de lojas de 947 para 1 107 e abriu 88 pontos de sua versão megastore.
Chamou designers conhecidos para criar produtos exclusivos que reforçassem a imagem de empresa que vende moda sem perder o apelo dos preços baixos. Ao mesmo tempo, reduziu custos e fez programas para melhorar a produtividade e aumentar a eficiência.
Com isso, conseguiu aumentar as vendas em 40% e os lucros em 50% ao longo da recessão. (É curioso notar que, nos últimos anos, a Target baixou a qualidade de seus produtos e, com os maus resultados da mudança, foi obrigada a retomar a estratégia vencedora do passado.)
O pior destino coube às empresas que agiram nos extremos. Numa ponta, estão as defensivas demais, que assumiram como único imperativo o corte de custos em relação a pessoas, despesas operacionais, investimentos em marketing, novos negócios, ativos ou pesquisa e desenvolvimento. A probabilidade de uma empresa com esse perfil sair bem-sucedida da crise não passa de 21%.
No outro extremo estão as que levaram a sério demais o mantra de que é na crise que estão as melhores oportunidades para ganhar mercado e se distanciar das concorrentes. Para isso, atraíram profissionais caros, adquiriram ativos e abriram novos negócios. Também promoveram ostensivas campanhas de marketing. São as agressivas demais.
A tese do equilíbrio está em sintonia com o pensamento do americano Jim Collins, um dos mais renomados especialistas em gestão na atualidade. Para ele, as melhores empresas conseguem manter uma trajetória linear de crescimento, sem abraçar um crescimento desenfreado na bonança nem paralisar o negócio na crise.
Esse ritmo tem sido seguido, com bons resultados, pela varejista de moda Renner (veja reportagem na pág. 42). “As melhores empresas não cedem à tentação de avançar demais quando o mercado está bom e se preparam melhor para resistir aos reveses”, diz Collins. O guru de negócios Ram Charan, por sua vez, costuma falar da necessidade de manter o realismo “temperado com otimismo”.
Segundo ele, a crise exige a seleção de prioridades — mas convém nunca perder de vista o que torna o negócio sustentável no longo prazo. O levantamento realizado pela consultoria BTA mostra que a maioria das empresas brasileiras — 54% — concentrou os esforços em corte de custos. Outros 36% estão predominantemente investindo.
Uma minoria absoluta, de 10%, dosa de maneira equilibrada as duas coisas. “Essa minoria que corta e investe costuma se dar melhor na crise e depois dela”, diz Betania. No Brasil atual, no entanto, dosar de maneira equilibrada investimentos e cortes é uma conta que não fecha para muitas empresas. Na média, as companhias brasileiras entraram muito mal nesta crise.
Segundo um levantamento da consultoria Bain & Company com 298 empresas de capital aberto, o endividamento médio aumentou 31% de 2014 para 2015, em parte puxado pela alta do dólar. A capacidade de geração de caixa caiu 20% no mesmo período. Em média, 53% do patrimônio dessas companhias está comprometido com a dívida bruta, segundo a Economatica.
Para muitas, a questão é sobreviver — e há pouco espaço para sutilezas nesses casos. As demissões já atingiram mais de 1 milhão de pessoas na indústria brasileira apenas entre novembro de 2015 e janeiro deste ano. No estado de São Paulo, quase 4 500 fábricas foram fechadas no ano passado no setor de transformação.
Os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) revelam que o cenário continua a piorar: em fevereiro, 104 600 postos formais de trabalho foram fechados — o pior resultado para o mês desde 1992, ano de início dessa série histórica. Apertar o cinto representa uma antítese radical do momento que a maioria das empresas viveu por quase uma década.
Até pouco tempo atrás, as energias estavam concentradas em crescer. Agora é preciso aumentar a produtividade. E, se é possível ver alguma boa notícia hoje, eis uma delas: se o momento do salto quantitativo passou, chegou a hora do ganho qualitativo. “É um trabalho menos glamouroso, mas até mais necessário”, afirma Alfredo Pinto, sócio da consultoria Bain & Company.
Para muitas empresas, os cortes serviram para colocar ordem na casa e corrigir distorções típicas do crescimento acelerado. A fabricante de bebidas Leão, por exemplo, abriu metade de seus oito centros de distribuição nos últimos seis anos. No auge desse período, cada um tinha um gerente e o planejamento era independente. Com isso, vários caminhões circulavam com pouca ou nenhuma mercadoria.
Com a gestão centralizada, milhares de viagens inúteis deixaram de ocorrer. No escritório central da empresa, na cidade de São Paulo, cerca de 100 funcionários cujo trabalho tinha muita relação com a fábrica da companhia, em Americana, no interior paulista, foram transferidos para lá. Com isso, as despesas de aluguel caíram 40%.
O grupo Mexichem, dono da marca de tubos plásticos Amanco, aproveitou o contexto para se desfazer de um problema antigo. Numa de suas aquisições, em 2008, a empresa herdou uma fábrica num terreno alugado em Maceió, em Alagoas. Desde o início, havia planos de fechá-la e transferir as máquinas para outra fábrica da companhia, em Suape, em Pernambuco.
Com a economia aquecida, a decisão acabou postergada. Até o final de 2014, ano em que o Mexichem cresceu 12%, a fábrica em Maceió operou em três turnos para dar conta da demanda. “Parar a produção naquele momento era impossível”, afirma Mauricio Harger, presidente do Mexichem. Em outubro, com a forte queda na demanda, a fábrica foi fechada.
Cerca de 80 pessoas foram demitidas e as máquinas transferidas para Suape. Renegociar aluguéis, fechar fábricas, demitir. Após a fase dos cortes mais óbvios, as empresas começam a sofisticar os mecanismos de ganho de produtividade e de inteligência para encontrar nichos de crescimento. No caso da rede de laboratórios Fleury, esse esforço sucedeu a um impressionante estirão.
Entre 2007 e 2012, a companhia viveu seus anos dourados, período em que o faturamento dobrou. Logo em seguida, com o endividamento em alta e a rentabilidade em queda, iniciou-se uma ampla reestruturação.
Após uma faxina no organograma que ceifou 6,5% dos 459 cargos de liderança, os diretores da empresa partiram para a tentativa de elevar a rentabilidade olhando em detalhes os números de cada laboratório da rede. Assim decidiram, por exemplo, que deveriam fechar algumas salas dedicadas a exames de curva glicêmica, que passavam boa parte do tempo vazias.
No lugar, deram espaço a exames mais demandados, como os de ultrassonografia. “Temos de fazer cada metro quadrado suar”, afirma Carlos Marinelli, presidente do Fleury desde setembro de 2014.
Para dar mais agilidade a esse monitoramento, indicadores das unidades antes acompanhadas quinzenalmente passaram a ser vistos diariamente. A reação já começa a ser percebida. Em 2015, o Fleury faturou 1,9 bilhão de reais, 13% mais do que no ano anterior, e o lucro líquido cresceu 70%.
Ter um termômetro da operação em tempo real também começa a fazer diferença na multinacional de eletrodomésticos Whirlpool, dona das marcas Brastemp e Consul. Em fevereiro, depois de oito meses de preparação, entrou em operação uma versão mais moderna do software que ajuda a empresa a gerenciar todos os números e os indicadores do negócio. A última atualização do sistema havia sido feita em 2007.
Mas, em meados do ano passado, com a crise, os executivos da companhia decidiram que era hora de ganhar agilidade. Para colocar a nova versão em funcionamento, foi preciso parar quase todas as atividades — com exceção das áreas de vendas, logística e atendimento ao consumidor — durante oito dias.
“Fazer essa parada nos custou caro, mas decidimos bancar porque sabíamos que a mudança permitiria avanços na gestão do negócio”, afirma João Carlos Costa Brega, presidente da Whirlpool, que faturou 9,4 bilhões de reais em 2015, uma queda de 3% em relação ao ano anterior.
Dezenas de relatórios sobre diferentes áreas da companhia, que demoravam horas e até mesmo dias para ser processados, agora ficam prontos em minutos. Antes, com o receio de ficar sem suprimentos, funcionários da fábrica com frequência faziam solicitações desnecessárias aos fornecedores. Agora, a atualização do volume de matérias-primas é feita praticamente em tempo real.
É algo essencial quando a demanda sofre uma variação drástica. O mercado de eletrodomésticos vem encolhendo desde 2013 e, no ano passado, ficou 19% menor. No grupo mineiro Martins, maior atacadista do país, com vendas de 4,6 bilhões de reais, a crise também impôs um novo ritmo ao relacionamento com os 50 maiores fornecedores.
Até o fim do ano passado, eles recebiam um relatório sobre as vendas ao final de cada mês. Em fevereiro, porém, todos passaram a ter acesso a um portal na internet que lhes permite ver o desempenho dos produtos diariamente. Graças a ele, a efetividade das promoções, que se tornaram mais frequentes com a recessão, pode ser testada com agilidade.
A razão para tanta rapidez tem sido a brusca variação de comportamento dos consumidores. Depois de anos se esmerando em atender uma população com ambições de compra cada vez mais sofisticadas, as empresas agora têm de fazer exatamente o contrário.
Uma pesquisa da consultoria BCG realizada entre agosto e outubro de 2015 revelou que a parcela de brasileiros disposta a comprar alimentos mais baratos é a mais alta dos últimos cinco anos: 59%. Para todo o resto que não é comida, a proporção é ainda maior: 67%.
“O que está hoje na cabeça da maioria dos consumidores é uma lógica de comprar apenas o que é realmente necessário, e, ainda assim, o mais barato”, afirma Eduardo Leone, sócio da BCG. Em escala e proporções diferentes, esse é um comportamento observado pelas empresas em diversas categorias.
A fabricante de bens de consumo Kimberly-Clark, que cresceu 15% no ano passado e faturou 4 bilhões de reais, é um dos muitos exemplos de empresas que se moldaram à onda crescente de consumidores cautelosos em relação aos gastos. A estratégia de marketing da Kimberly-Clark sempre privilegiou suas três marcas de fraldas mais caras.
No segundo semestre de 2015, porém, quando as vendas de sua fralda mais barata, a Huggies Tripla Proteção, cresceram 12%, a empresa decidiu rever a tática. Desde março, pela primeira vez, é ela quem está sendo propagandeada na TV aberta.
A Via Varejo, dona das lojas de eletroeletrônicos Casas Bahia e Ponto Frio, e que pertence ao Grupo Pão de Açúcar, também ampliou 15% ao longo do ano passado a oferta aos clientes de produtos menos sofisticados, como geladeiras sem freezer e fogões manuais. A seguradora Liberty lançou neste ano linhas de seguro para automóveis cerca de 30% mais baratas, com coberturas menos abrangentes.
Sem possibilidade de expandir a base de clientes, diversas empresas aceleram esforços para vender mais aos já existentes. Em 2015, a varejista de brinquedos Ri Happy abriu 21 minilojas com artigos para bebês dentro de suas maiores unidades. Isso gerou, em média, vendas adicionais de quase 10% por loja.
Depois de passar por uma reestruturação que resultou na demissão de 13 000 funcionários — cerca de 20% do quadro de pessoal —, a Via Varejo começou a buscar novos caminhos de expansão. Criou “lojas dentro das lojas”, com espaços exclusivos para venda de smartphones e tablets, e espaços de móveis, com uma casa decorada.
Juntas, todas as mudanças geraram um ganho de 400 milhões de reais, embora a receita da rede tenha caído 15% em 2015. “A crise traz o pensamento ‘ou colaboro, ou posso não estar aqui amanhã’”, diz Ronaldo Iabrudi, presidente do Grupo Pão de Açúcar. “Cria-se uma boa vontade muito maior, as defesas e os atritos diminuem.”
A Cielo, maior processadora de pagamentos com cartões do país, passou a oferecer serviços para tornar os clientes mais fiéis e obter uma nova fonte de receita. Um deles é a venda de dados como o perfil de consumo de microrregiões, informação que a companhia já tem. São dados que interessam aos varejistas que usam as maquininhas da Cielo.
Uma padaria, por exemplo, pode descobrir se está vendendo mais ou menos do que seus vizinhos. “Estamos revendo cada linha de despesa”, diz Rômulo Dias, presidente da Cielo. “E também analisamos tudo o que pode ser feito em mercados inexplorados.” A exemplo do que fizeram com os cortes, algumas empresas passaram a buscar novas oportunidades de crescimento com lupa.
“Num momento de crise, não adianta apenas olhar as médias de crescimento, que em geral são decrescentes”, afirma Sven Smit, diretor da consultoria McKinsey na Holanda, que cunhou o conceito de “granularidade”. O princípio é deixar de julgar o potencial de mercados apenas com base em dados da evolução da média geral e passar a observar nichos regionais que se mantenham como exceção.
“É preciso prestar atenção em dados fragmentados, como os de regiões e segmentos correlatos, para buscar oportunidades.” É o olhar que o empresário Frederico Trajano, presidente da varejista de eletrodomésticos Magazine Luiza, adotou recentemente. Nos meses de novembro e dezembro, sua equipe elaborou um diagnóstico meticuloso da operação país afora.
No total, foram analisadas 90% das categorias de produto que a empresa vende por região e cidade. Com isso, desde fevereiro, cada um dos 786 gerentes da rede em 520 cidades passou a saber, por exemplo, a fatia exata de participação de mercado de dezenas de produtos no município. Também recebe o desempenho comparado ao de outras lojas da rede que têm perfil semelhante.
Se uma dada loja tem 20% de participação na venda de celulares num município e outra loja tem apenas 5% numa cidade semelhante, esta última terá de se mexer. “Nunca tínhamos coletado e usado dados de participação de mercado de maneira tão cirúrgica. O momento pede isso”, diz Trajano.
Crescer neste momento não é uma questão tão simples quanto abrir lojas ou colocar mais produtos ou serviços na prateleira. Mas a sofisticação obtida por empresas que decidiram encontrar maneiras de driblar as dificuldades pode ajudar a melhorar os resultados no momento atual — e depois da recessão. A história mostra que, cedo ou tarde, a demanda volta a crescer.
É interessante notar que o otimismo de que isso vai ocorrer no médio prazo é maior entre os que já vivenciaram momentos semelhantes, como mostra a pesquisa realizada pela consultora Betania Tanure. Entre os que já passaram por uma crise, 42% acham que o negócio voltará a crescer em 2018, ante 29% dos que nunca passaram por uma situação parecida.
Os executivos da fabricante de tubos e conexões Tigre batalham para entrar no time das que vão voltar a crescer até lá. Com a severa queda na demanda, o ano de 2015 não foi fácil. A empresa demitiu cerca de 580 funcionários, abandonou marcas para simplificar o portfólio e iniciou um esforço extra para cortar custos operacionais, num projeto de orçamento base zero.
Ao mesmo tempo, passou a investir em frentes que deverão ajudar a garantir o futuro da empresa. Uma delas é a recém-criada área de inovação. Parte do esforço compreendeu a formação de um fundo no valor de 5 milhões de reais para investir em startups.
“Queremos ampliar nossa participação em novos segmentos da construção civil”, diz Otto von Sothen, presidente da Tigre. Para fechar a conta, não só hoje mas também amanhã, ele sabe que precisa ir além da austeridade.