Colheita de soja: a produtividade das lavouras não cresce há dez anos, mas poderia ser duplicada (Paulo Fridman/Bloomberg)
Da Redação
Publicado em 20 de setembro de 2013 às 06h00.
São Paulo - A japonesa Ihara, instalada em Sorocaba, no interior paulista, é uma das maiores fabricantes de defensivos agrícolas do Brasil. Seus 4% de participação de mercado são obtidos principalmente com a venda de fungicidas, inseticidas e outros itens para o combate de pragas em frutas e verduras — diferentemente de concorrentes como a suíça Syngenta e as alemãs Bayer e Basf, cujas vendas se concentram em produtos usados nas principais commodities agrícolas, como soja e algodão.
Em janeiro, a Ihara conseguiu a liberação pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) de um produto vital para sua estratégia de avanço no mercado brasileiro: um regulador de crescimento das macieiras, que permite o surgimento de maçãs maiores, de melhor valor comercial.
O plano de liberação do produto vingou — mas com sete anos de atraso. “Sempre diziam na Anvisa que estava faltando um documento no nosso pedido de licença, mas na verdade até sobrou papel”, diz Rodrigo Naime, responsável por produtos na Ihara. “Foi preciso entrar na Justiça para que a licença fosse liberada.”
A demora na obtenção de licenças para novos agrotóxicos é uma das queixas mais frequentes de fabricantes de defensivos e de produtores rurais. Se nos Estados Unidos essa análise leva em média dois anos, aqui chega a demorar sete. No Brasil, três órgãos são responsáveis pelo licenciamento: Ministério da Agricultura, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e Anvisa.
Mesmo com o trabalho a seis mãos, é sobre a Anvisa — responsável pela avaliação dos riscos para a saúde — que recaem as principais críticas. Com uma fila de 1 267 pedidos de licença, a agência libera cerca de 150 defensivos por ano. A falta de pessoal é uma das principais razões da lentidão.
A Anvisa tem 22 técnicos para as análises. O ideal seria ter pelo menos o triplo. Mas a escassez de gente não explica todo o problema. “Já ouvi de uma técnica que seu trabalho é barrar os pedidos. Estão misturando ideologia com análise científica”, diz um executivo ouvido por EXAME que prefere não ser identificado. A ideologia em questão é o radicalismo contra as inovações tecnológicas nas lavouras.
A paquidermia das licenças não é só mais um exemplo das amarras da burocracia brasileira. É também um golpe na própria tentativa do país de crescer mais. Isso fica evidente com o atraso na liberação de defensivos para a soja, nosso principal produto agrícola. De 1993 a 2003, a produtividade das lavouras de soja cresceu 27%, puxada pelo avanço da profissionalização da agricultura brasileira.
Nos últimos dez anos, no entanto, a produtividade praticamente estagnou — o crescimento desde 2003 foi de apenas 4%. Não é razoável esperar que os ganhos de produtividade sejam sempre os mesmos — a base de comparação, afinal, é cada vez maior.
Ainda assim, uma queda tão abrupta sugere um problema muito além de uma limitação estatística. “Poderíamos dobrar a produtividade em alguns anos — e sem precisar abrir novas áreas para o cultivo”, diz Glauber Silveira, presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Soja.
Ainda na fila
A Anvisa admite as limitações. Dirceu Barbano, presidente da agência desde 2011, diz que os técnicos que davam tom ideológico às análises foram exonerados em novembro e que um concurso para reforçar os quadros está em andamento. “As liberações já estão mais rápidas”, afirma Barbano. Mas a indústria ainda não teve essa percepção.
A Syngenta pôs na fila das análises, há mais de dois anos, um fungicida cujo ingrediente ativo é considerado uma das grandes esperanças no combate à ferrugem da soja, doença que causou perdas de 25 bilhões de dólares aos produtores brasileiros desde 2003. “Se o andamento melhorou, ainda não percebemos. Estamos na fila do mesmo jeito”, diz Laércio Giampani, presidente da Syngenta no Brasil. Definitivamente, ideologia e burocracia não rimam com desenvolvimento.