Revista Exame

Parceria entre rivais melhora concorrência na crise

Pequenas empresas estão montando centrais para fazer compras em conjunto e, assim, conseguir preços melhores. O objetivo: não ser engolidas pela concorrência

Luis Martins, da JK (em pé), e Sorrentino: mudança para competir com os grandes laboratórios  (Leandro Fonseca/Exame)

Luis Martins, da JK (em pé), e Sorrentino: mudança para competir com os grandes laboratórios (Leandro Fonseca/Exame)

DR

Da Redação

Publicado em 4 de agosto de 2016 às 05h56.

São Paulo — Há dois anos, um grupo de pequenos laboratórios do interior e do litoral paulista começou a traçar estratégias para conseguir competir com as grandes companhias do setor. O Fleury já havia adquirido 27 concorrentes em pouco mais de uma década, e a Dasa, outros 22 — e esse grupo não queria ser o próximo da fila.

Uma opção era fundir as atividades dos laboratórios, o que demandaria meses de negociação sobre como a nova empresa funcionaria e quem comandaria o quê. A outra era unir apenas algumas áreas, em especial a de compras.

Com a ajuda de uma assessoria financeira, a JK Capital, os empresários estruturaram uma central que compra de forma conjunta os principais materiais que os laboratórios usam, como filmes radiológicos e contrastes para os exames. Hoje, dez empresas participam do sistema. Por ter escala, elas conseguem negociar melhor com os fornecedores e, assim, têm obtido descontos médios de 22%.

Em 2015, a decisão mostrou-se ainda mais acertada. Como boa parte do material de diagnóstico é importada, os preços dispararam com a valorização de quase 50% do dólar. Ao negociar em conjunto, os laboratórios dizem ter conseguido descontos de até 35%.

“Ainda pagamos mais caro do que no passado, claro, mas o impacto foi menor do que poderia ter sido”, diz Luis Fernando Sorrentino, dono da Clínica Radiológica de Santos, que faz parte do grupo. Neste ano, os laboratórios contrataram serviços contábeis em conjunto e, agora, preparam a compra de equipamentos. 

Um levantamento inédito do Sebrae mostra que há 675 centrais de negócios no país que fazem compras conjuntas para cerca de 10 000 empresas. No passado, as centrais mais comuns eram ligadas ao comércio e ao agronegócio, mas, recentemente, o modelo se expandiu para os mais diferentes setores: de padarias e salões de beleza a hospitais e faculdades.

Na média, cada central reúne 15 empresas, mas há modelos mais abrangentes. A Associação Pizzarias Unidas é formada por cerca de 200 pizzarias em 11 estados. A Sthem Brasil reúne 44 instituições de ensino (entre elas a Faap e a PUC de Goiás), que dividem os cursos de capacitação de professores. A demanda crescente tem feito surgir empresas especializadas em montar e administrar centrais de compras.

É o caso da CMV Solutions, criada há seis meses, que abastece 25 bares, restaurantes e hotéis em São Paulo. Além de conseguir descontos em razão da escala, os clientes se beneficiam de promoções, porque a CMV orça diariamente os produtos mais pedidos e compra quando estão com desconto.

“Como precisam adquirir produtos de muitas categorias, os compradores dificilmente conseguem cotar os preços em mais do que três fornecedores. Nós conseguimos”, diz Marcus Prianti, ex-diretor do Walmart e sócio da CMV.

No exterior, o alcance das centrais é maior. A Independent Buyers, do Reino Unido, reúne cerca de 2 500 empresas de diversos setores para comprar em conjunto cerca de 100 produtos básicos, como itens de papelaria e produtos de limpeza.

A Capricorn Society, maior cooperativa de compras da Austrália, especializada no setor automotivo, tem 15 000 membros. Nos Estados Unidos, o setor de saúde é um dos que mais utilizam esse sistema: cerca de 70% das compras dos hospitais são feitas por meio de centrais unificadas.

Ação na justiça

Para que as empresas consigam se beneficiar de fato dessas centrais, porém, é preciso que o volume de compras seja grande o suficiente para compensar os custos de criar e manter o sistema. Não entram na conta produtos muito específicos de cada empresa — por exemplo, iguarias usadas em pratos típicos ou tecidos utilizados em roupas de grife.

A JK diz ter sido procurada por um grupo de escolas que queriam montar um sistema de compras parecido com o dos laboratórios, mas os descontos que seriam obtidos com as compras em conjunto não eram suficientes para pagar os gastos com o projeto. Além disso, os empresários precisam estar dispostos a abrir mão de parte das decisões de compras.

A marca dos produtos e os fornecedores têm de ser decididos em conjunto e dificilmente vão agradar a todos os participantes. Um grupo de construtoras associadas à Cooperativa da Construção Civil do Cea­rá passou por uma situação complicada recentemente.

Importou cerca de 150 elevadores em conjunto, pagando 15 milhões de reais, mas a empresa vendedora deixou de prestar os serviços de montagem como tinha sido acordado. As construtoras tiveram de contratar outra empresa para fazer o serviço e a cooperativa entrou com uma ação na Justiça pedindo indenização. Nesse caso, a economia não compensou.

Acompanhe tudo sobre:Edição 1118EmpreendedoresEmpreendedorismoEstratégiagestao-de-negociosJustiçaPequenas empresasSebrae

Mais de Revista Exame

Borgonha 2024: a safra mais desafiadora e inesquecível da década

Maior mercado do Brasil, São Paulo mostra resiliência com alta renda e vislumbra retomada do centro

Entre luxo e baixa renda, classe média perde espaço no mercado imobiliário

A super onda do imóvel popular: como o MCMV vem impulsionando as construtoras de baixa renda