Alair, dono do atacadista Martins: expediente diário e viagens para se reunir com fornecedores (Germano Lüders/EXAME.com)
Da Redação
Publicado em 15 de junho de 2012 às 10h16.
São Paulo - A bordo de seu jato Cessina Excel, o empresário mineiro Alair Martins do Nascimento, de 76 anos, cumpre religiosamente um ritual. Pelo menos uma vez por mês, ele deixa a cidade de Uberlândia, no interior de Minas Gerais, para visitar fornecedores e clientes espalhados pelo país.
À frente do grupo Martins, maior atacadista distribuidor brasileiro, com vendas de 3,5 bilhões de reais em 2009, "seu" Alair, como é mais conhecido, costuma intensificar a frequência dessas visitas nos meses de setembro e outubro, quando são feitas as encomendas para o final do ano.
Por isso, nos últimos dois meses, reuniu-se com a diretoria de dez de seus maiores fornecedores - entre eles Unilever e Procter&Gamble - a fim de definir as estratégias de vendas de Natal. Nessas viagens, Alair tem frequentemente duas companhias que, segundo ele, estão por trás de sua disposição e boa forma física.
Uma delas é seu personal trainer, que o orienta a cumprir 2 horas de exercícios físicos diários, pela manhã. A outra, mais prosaica, são chinelos Havaianas.
"Um par eu uso dentro do banheiro e o outro debaixo do chuveiro", afirma o empresário, o maior comprador de Havaianas do país, com cerca de 30 milhões de pares por ano (o Martins é também o maior comprador de outros produtos, como chocolates Garoto e lâmpadas Philips). "É muito mais seguro. Nesses pequenos espaços, você pode escorregar e aí já era."
O fundador do grupo que hoje distribui 16 000 tipos de produtos, de chocolates a laptops, para 350 000 varejistas do Amazonas ao Rio Grande do Sul, não perde a mania de negociar. Desde 1953, quando criou a empresa a partir de um armazém montado com o dinheiro da venda da fazenda do pai, acumulava os papéis de chefe das operações e estrategista.
Hoje, embora ocupe apenas a posição de presidente do conselho do Martins, Alair ainda dá expediente diário na companhia. "Mais do que um inspirador, o ‘seu’ Alair ajuda a definir os rumos da operação e participa das principais decisões", diz Walter Faria, presidente executivo desde fevereiro deste ano, após uma carreira de mais de 20 anos em multinacionais como Colgate, Danone e Coca-Cola.
Sucessão é um assunto que entrou para a agenda de Alair há mais de uma década. Nos anos 90, Juscelino - o segundo de seus três filhos - foi nomeado diretor-geral de operações do grupo, cargo que exerceu de 1995 a 2001. Hoje, ele ocupa a presidência do conselho do Tribanco, braço financeiro do grupo, responsável pela emissão de cartões de crédito que movimentam 100 milhões de reais por mês.
"Percebi que o Juscelino levava mais jeito para o banco, e também precisávamos deixar a gestão do atacado mais profissional", diz o pai. O paulista César Suaki, que havia passado pelo Martins nos anos 90 e depois pelo grupo Pão de Açúcar, ocupou o mesmo posto de Juscelino entre 2006 e 2008.
Suaki foi então promovido à presidência executiva e Alair passou a responder formalmente pelo recémcriado conselho de administração, formado por quatro executivos externos e seus três filhos (além de Juscelino, nenhum deles possui cargo executivo na empresa). "Hoje, a empresa é totalmente profissionalizada", diz Alair.
Ele ainda faz questão, porém, de conduzir à sua maneira tarefas como negociar o preço final de grandes compras. Em maio, para fechar a aquisição de 250 caminhões da Iveco, Alair chamou o presidente da montadora, o italiano Marco Mazzu, para um almoço em sua casa, em Uberlândia.
O convidado entrou com um preço e levantou da mesa concordando em oferecer um desconto um pouco maior. "Os veículos eram de uma nova linha de caminhões e o ‘seu’ Alair lançou o argumento de que não haveria marketing melhor para nós do que chegar a todo o país com a frota do Martins", diz Alcides Cavalcanti, diretor de vendas da Iveco, cujo maior cliente no país é o Martins.
No momento, as atenções de Alair estão voltadas para a maior transformação enfrentada pelo Martins desde os anos 90, quando expandiu sua atuação com a criação de um banco e, anos depois, colocou um pé no varejo ao criar a rede de lojistas associados Smart.
O Martins iniciou neste ano um processo de regionalização de suas operações no Norte e no Nordeste. Entre maio e outubro, foram inaugurados três novos centros de distribuição em Pernambuco, Bahia e Pará e ampliados os que já existiam no Amazonas e na Paraíba.
As novas instalações praticamente dobraram para 180 000 metros quadrados a área de operações, que antes estava concentrada em Uberlândia. No início deste mês, Alair percorreu cada um dos centros inaugurados para se reunir com funcionários locais e ajudar a definir os rumos futuros.
"Com distâncias menores entre a indústria e nossos clientes, vamos oferecer um sortimento de produtos adaptado às regiões, diferentemente do que temos hoje na sede", afirma.
Concorrentes
Aprimorar essas operações é o principal desafio para o Martins recuperar espaços que perdeu nos últimos anos. Num momento em que a economia toda cresce, o faturamento do atacadista caiu 3,7% no ano passado. O movimento de regionalização é uma tentativa de neutralizar o avanço de concorrentes locais, que ganham espaço por ter atuação mais próxima de seus clientes.
Ao mesmo tempo, o grupo mineiro tenta frear os efeitos da recente expansão das lojas de atacarejo. Bandeiras como Atacadão, comprada pelo Carrefour, e Assaí, comprada pelo Pão de Açúcar, dobraram de tamanho nos últimos três anos.
"Com esse modelo, o Martins perde força em duas frentes", afirma Silvio Laban, especialista em varejo da escola de negócios Insper. "Os donos de pequenos comércios antes atendidos pelo Martins preferem se abastecer no atacarejo e muitos consumidores que antes iam a esses mercadinhos agora compram em lojas de bandeiras como Atacadão e Assaí."
Em 2011, 40% do movimento de mercadorias que antes estava concentrado em Uberlândia passará às unidades regionais do Martins. A mudança, como é de imaginar, dado o perfil de Alair, será acompanhada de perto pelo fundador. "Só saio daqui quando não estiver mais lúcido", diz ele. "Já deixei avisado que, se eu começar a ter umas ideias meio estranhas, podem me aposentar."