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Propostas para aumentar gastos públicos ganham força na política, mostra estudo

Eleição nos Estados Unidos é exemplo claro da falta de preocupação com o aumento do endividamento público

“No tax on tips”:  Trump e Kamala prometem na campanha retirar impostos sobre gorjetas  (Ellen Schmidt/AFP/Getty Images)

“No tax on tips”: Trump e Kamala prometem na campanha retirar impostos sobre gorjetas (Ellen Schmidt/AFP/Getty Images)

Rafael Balago
Rafael Balago

Repórter de macroeconomia

Publicado em 18 de outubro de 2024 às 06h00.

Um tema curioso une os dois candidatos na disputa presidencial dos Estados Unidos: acabar com o imposto sobre gorjetas. Donald Trump prometeu primeiro, Kamala Harris o seguiu, e ambos defendem a isenção de impostos sobre a gratificação a garçons, carregadores de malas e outros funcionários. É um exemplo de uma onda detectada de forma mais precisa por um estudo recente do Fundo Monetário Internacional (FMI): propostas que aumentam gastos públicos têm se tornado mais comuns ao redor do mundo, tanto à esquerda quanto à direita.

O estudo do FMI analisou mais de 4.500 plataformas políticas de partidos em 720 eleições nacionais, realizadas entre 1960 e 2022, e fez uma divisão na forma como a questão fiscal foi abordada. De um lado, a defesa de medidas como aumento de gastos em programas sociais e de investimentos públicos para estimular a demanda e superar momentos de crise foi classificada como “expansionista”. Do outro, a opção pela redução de déficits públicos e de gastos foi chamada de “restritiva”. Os dados mostram que houve aumento da defesa de medidas expansionistas, tanto pela esquerda quanto pela direita, especialmente a partir dos anos 1980 (veja quadro).

As propostas geralmente seguem padrões cíclicos. “O discurso fiscal se torna mais conservador sob condições econômicas mais adversas, como após uma alta na dívida pública, mas por tempo limitado. E mais discursos em favor do gasto público se traduzem em déficit fiscal maior ao longo dos cinco a oito anos seguintes”, diz o estudo. O gasto público teve alta nos últimos anos por causa da pandemia. Em 2020, governos de vários países lançaram pacotes para ajudar as empresas e os cidadãos que perderam renda. Em países como EUA e Brasil, houve pagamentos diretos e em larga escala a milhões de pessoas, com a conta sendo jogada para depois.

A partir de 2021, houve alta forte nas taxas de juro nas principais economias do mundo, o que aumentou o custo das dívidas. Apesar disso, ainda há muita demanda por gastos, para custear ações como o combate às mudanças climáticas e ao aumento da pobreza.

Propostas que custarão trilhões

Aqui, de novo, a campanha americana serve de exemplo. Kamala promete usar recursos públicos para baixar o preço de produtos e, assim, tentar baixar a inflação geral. Já Trump promete estimular a economia com grandes cortes de impostos. A Tax Foundation, uma entidade não partidária, revela que os planos do republicano custariam algo entre 1,3 trilhão e 4 trilhões de dólares na próxima década. As ideias da democrata gerariam um gasto de 4 trilhões de dólares no mesmo período. Como comparação, o déficit americano no ano fiscal de 2024 deve atingir 1,9 trilhão de dólares.

Segundo previsão da Escritório de Orçamento do Congresso. O valor é próximo ao PIB do Brasil em 2023, de 2,2 trilhões de dólares. O governo americano tem hoje uma dívida pública total de 26, 2 trilhões de dólares, ou 99% do PIB do país. Em dez anos, a dívida deve quase dobrar e atingir 47,8 trilhões de dólares, ou 122% do PIB. Nem Kamala nem Trump parecem preocupados com isso. “Grandes déficits fiscais e dívidas elevadas pedem maior prudência fiscal, mas isso pode ser difícil quando as forças políticas puxam na direção oposta”, alerta o FMI.

Como o exemplo americano indica, falar sobre gastos deve continuar como um tema para a eleição seguinte.


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