Roberto Perosa, presidente da Abiec: “Há quatro mercados prioritários para o Brasil neste ano, que juntos representam quase 30% da demanda global por carne bovina” (Arquivo Pessoal/Divulgação)
Repórter de agro e macroeconomia
Publicado em 23 de janeiro de 2025 às 06h00.
O ano de 2025 promete consolidar ainda mais a presença da carne bovina brasileira no mercado internacional. Essa é a avaliação de Roberto Perosa, atual presidente da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec) e ex-secretário de Comércio e Relações Internacionais do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa).
Em entrevista à EXAME, Perosa se diz otimista de que, neste ano, Japão, Turquia, Vietnã e Coreia do Sul, que juntos representam cerca de 30% da demanda global por carne bovina, abrirão suas portas para a proteína brasileira — pelo menos um deles até o final do primeiro trimestre de 2025.
Embora o Brasil ainda não exporte para esses países, as negociações estão avançadas. Durante seu período no Mapa, de 2023 ao final de 2024, Perosa foi um dos responsáveis pela abertura de 248 novos mercados para a carne bovina brasileira.
Segundo projeções da consultoria Safras & Mercado, o país deve exportar 4,032 milhões de toneladas em equivalente carcaça em 2025, um ligeiro aumento na comparação com 2024. Mas trata-se de um novo patamar.
No ano passado, os embarques de carne bovina brasileira tiveram recorde histórico — 26% mais do que em 2023. A depender de Perosa e do Brasil, nem mesmo as sinalizações protecionistas de União Europeia e China atrapalharão os planos ambiciosos do setor para 2025.
A carne bovina brasileira alcançou um recorde histórico em 2024, com aumento na quantidade exportada e no valor arrecadado. Na sua avaliação, o que foi feito de diferente para alcançar esse resultado?
Realizamos um importante trabalho de abertura de mercados com o time do Ministério da Agricultura e Pecuária. Agora, como presidente da Abiec, a perspectiva é dar continuidade a esse esforço, promovendo a carne bovina brasileira, que atende a uma demanda global significativa. Em 2024, alcançamos um recorde histórico, com um crescimento de quase 26% em relação a 2023. O faturamento do setor passou de 10 bilhões para quase 13 bilhões de dólares, marcando um avanço expressivo. A projeção para 2025 é igualmente positiva, com a expectativa de consolidar e ampliar esses resultados.
E quais mercados estão no radar para este ano?
Há quatro mercados prioritários para o Brasil, que juntos representam quase 30% da demanda global por carne bovina: Japão, Turquia, Vietnã e Coreia do Sul. Atualmente, o Brasil ainda não pode exportar a proteína para esses países, mas está em negociações intensas com o Mapa para viabilizar a abertura desses mercados. Grande parte do trabalho já foi realizada. As tratativas com Japão, Turquia e Vietnã estão na reta final, enquanto o processo com a Coreia do Sul encontra-se um pouco mais atrasado. Ainda assim, os avanços nas negociações com os três primeiros países nos deixam confiantes na possibilidade de iniciar as exportações em breve.
Já é possível definir uma data para o anúncio?
Em fevereiro, viajarei com alguns empresários ao Japão para uma audiência com o ministro da Agricultura japonês, assim como ao Vietnã, para tratarmos da abertura do mercado vietnamita à carne brasileira. O Japão ainda depende de aceites e certificados específicos relacionados ao produto brasileiro. No caso do Vietnã, a parte técnica já foi concluída, mas é necessária uma ação diplomática para que os governos oficializem a abertura. É isso que estamos solicitando ao governo brasileiro. Já na Turquia, resta um detalhe técnico sobre uma testagem da carne que será enviada, questão que deve ser resolvida nas próximas semanas. Estamos otimistas de que no primeiro trimestre deste ano poderemos celebrar uma importante abertura de mercado em pelo menos um desses países. Quanto à Coreia do Sul, o processo encontra-se mais atrasado por causa de entraves burocráticos. Além disso, o atual cenário político no país tem dificultado o andamento das análises, o que provavelmente atrasará ainda mais o processo.
Os Emirados Árabes Unidos foram o terceiro maior mercado para a carne brasileira no ano passado. Quais medidas estão sendo planejadas para ampliar essa participação em 2025?
Os Emirados Árabes Unidos se consolidaram como um grande hub de distribuição de carne bovina, atendendo tanto o Oriente Médio quanto a Ásia. O país tornou-se um importante ponto de interseção entre compradores e vendedores. Em fevereiro, participarei em Dubai da GoFood, a maior feira de alimentos do mundo, com o objetivo de estimular a continuidade das compras de carne brasileira pelas empresas da região. Além disso, em 2024, o governo brasileiro tomou uma decisão estratégica ao abrir um posto de adido agrícola em Abu Dhabi, capital dos Emirados Árabes Unidos. Essa iniciativa facilitará os diálogos e as negociações, além de incrementar as oportunidades de venda da carne bovina brasileira para o país. Os sinais são muito promissores de que essa parceria continuará forte e de que haverá um crescimento significativo nas exportações para a região.
A China, principal parceiro comercial do Brasil, abriu uma investigação para avaliar os impactos da importação de carne bovina. Essa iniciativa preocupa o setor?
A investigação aberta pela China não é específica contra o Brasil, mas engloba todos os países exportadores de carne bovina. Trata-se de uma medida de salvaguarda, que é diferente de uma investigação de dumping. Essa medida consiste em uma análise da competitividade da indústria nacional, o que consideramos legítimo, já que cada país tem o direito de avaliar como suas indústrias estão sendo- -impactadas pelas importações. A Abiec está se credenciando para participar oficialmente, contribuindo com informações necessárias ao governo chinês de forma cooperativa. Acompanharemos de perto as investigações.
Ao mesmo tempo, alguns países da União Europeia sinalizam aumentar o protecionismo, mesmo depois do acordo UE-Mercosul...
O mercado europeu tem forte proteção governamental, o que compromete sua competitividade. O acordo cria oportunidades para que o Brasil e os demais países do Mercosul aumentem as exportações de carne para a União Europeia. Atualmente, o Brasil exporta quantidades limitadas de carne bovina para lá. Em situações recentes em que algumas empresas fizeram sinalizações negativas sobre a carne brasileira, o setor reagiu de forma articulada, levando essas empresas a reverem seus posicionamentos. Entretanto, o volume esperado para exportação permanece relativamente pequeno e próximo ao já praticado, por causa das limitações impostas pelo mercado europeu. Por isso, a estratégia brasileira deve priorizar mercados mais promissores, como Ásia e Estados Unidos, que apresentam maior potencial de crescimento e demanda.
Então a Lei Antidesmatamento da UE, que deve entrar em vigor a partir de dezembro deste ano, não assusta a pecuária brasileira?
Pode haver impacto, mas estamos preparados para enfrentá-lo com o apoio do governo. Em dezembro, o Mapa lançou dois planos essenciais para a cadeia produtiva. O primeiro é o Plano de Rastreabilidade Individual dos Animais, uma demanda dos mercados internacionais, especialmente da União Europeia e de outros países que exigem maior controle e transparência. O segundo é a plataforma Agro Brasil Mais Sustentável, que visa garantir conformidade e competitividade às exportações brasileiras. Essas medidas serão suficientes para evitar restrições às exportações brasileiras.