Operadores na Bovespa: 4 000% de valorização real em 46 anos (Germano Lüders/EXAME.com)
Da Redação
Publicado em 20 de fevereiro de 2014 às 06h00.
São Paulo - Paul Samuelson, o primeiro americano a receber o prêmio Nobel de Economia, em 1970, disse certa vez que investir deveria ser algo tão monótono quanto “ver a grama crescer”. “Quem quer adrenalina”, afirmou ele, “pode pegar 800 dólares e ir jogar em Las Vegas.” Na prática, só mesmo os muito frios e disciplinados conseguem encarar seus investimentos desse jeito.
A ciclotimia dos mercados cria nas pessoas aqueles dois sentimentos que teimam em causar prejuízos — o excesso de medo (quando vai tudo mal) e o excesso de ganância (quando parece que todos vão ficar ricos). Em momentos como o atual, isso fica claro.
A julgar pelo o que se ouve por aí, os países emergentes podem ser engolidos por uma crise, e o Brasil, tido como um dos “cinco frágeis” do cenário atual, vai penar. O que fazer numa hora dessas? Estudos encomendados por EXAME mostram que é possível se dar bem na bolsa do jeito zen descrito por Samuelson. Ou seja, entrar em desespero em fases como a atual não adianta nada.
Um desses estudos indica quanto um investidor pode perder se errar a mão e entrar e sair da bolsa nas horas erradas. A gestora Mint Capital analisou o desempenho do Ibovespa desde que o índice foi lançado, em 1968, até janeiro passado. Nestes 46 anos, o índice teve valorização de 4 000%, já descontada a inflação.
Foi um retorno 15 vezes maior do que o da caderneta de poupança, a aplicação mais conservadora disponível durante todo esse intervalo. Mas o investidor que, por azar, resolveu vender suas ações justamente nos curtos períodos em que a bolsa mais subiu perdeu dinheiro.
De acordo com a pesquisa da Mint, quem ficou fora do mercado em apenas nove meses de forte alta nestes 46 anos teve prejuízo de 38%. Como se sabe, muitas vezes esses períodos de alta súbita acontecem pouco depois da hora do pânico absoluto. A bolsa brasileira valorizou 83% em 2009, na sequência da crise que ameaçou levar o mundo de volta à Idade da Pedra.
É claro que o inverso também é verdadeiro. No levantamento da Mint, quem acertou o momento de sair do mercado e fez isso antes das grandes quedas ganhou muito mais dinheiro do que aqueles que se mantiveram fiéis à estratégia de ver a grama crescer. O duro, nesse caso, é que vender na hora certa é coisa para poucos.
Na bolsa, errar é muito mais fácil do que acertar. “Quem é muito bom acerta seis de cada dez decisões de investimento. Não dá para acertar nove de dez”, afirmou certa vez o americano Peter Lynch, que geriu por 13 anos o Fidelity Magellan, um dos fundos de ações mais rentáveis dos Estados Unidos.
É por isso que os assessores de investimento costumam recomendar que os investidores mantenham seus recursos na bolsa por anos, e apliquem aos poucos, para aumentar a chance de comprar ações quando elas estão baratas — sem ficar tentando adivinhar quando o mercado vai melhorar.
O estudo da Mint mostra que isso funcionou para quem investiu, por décadas, em papéis do Ibovespa. Mas, em prazos mais curtos, nem sempre a bolsa vai melhor que a renda fixa.
A empresa de informações financeiras Thomson Reuters analisou o desempenho de cinco mercados emergentes (Brasil, Rússia, China, Índia e México) e cinco desenvolvidos (Alemanha, Estados Unidos, França, Japão e Reino Unido) nos úlimos 16 anos.
Todas essas bolsas subiram no período. Na comparação com a renda fixa, porém, três mercados saíram perdendo. Na França, no Japão e no Reino Unido, o rendimento médio dos títulos de dez anos do governo foi maior do que a alta da bolsa de 1998 para cá.
No Brasil, a Bovespa ganhou do CDI — por pouco, é verdade. Na China e nos Estados Unidos, houve empate. E nos demais países, como Índia e Rússia, a bolsa foi melhor do que a renda fixa (veja detalhes no quadro da pág. 91).
Países ricos X Emergentes
Esses resultados foram bastante influenciados pela crise de 2008. É por isso que só há países desenvolvidos na lista de mercados em que a renda fixa foi melhor do que a bolsa. No Japão, anos de deflação e baixo crescimento afastaram os investidores do mercado de ações.
Para os países emergentes, a última década foi essencialmente positiva, em razão da alta dos preços das commodities e da entrada de investimentos estrangeiros. Em meio a esse cenário, as bolsas da Índia, do México e da Rússia tiveram altas impressionantes. Mas quem investiu em ações chinesas penou.
O excesso de euforia com o país fez a bolsa ter um pico de valorização em 2007. Depois da crise de 2008, a maioria dos papéis caiu e, desde então, o mercado praticamente não saiu do lugar.
No Brasil, a alta da Bovespa de 1998 para cá, de 939%, medida pelo índice IBrX, foi uma das maiores do período — e algumas ações chegaram a subir mais de 20 000%. Mas o país também conviveu com juros altíssimos a partir de 1998, o que aproximou a rentabilidade da renda fixa do retorno médio da bolsa.
As taxas são menores hoje e, se tudo correr bem, podem cair mais no futuro, o que, ao menos em tese, pode beneficiar a bolsa. Um levantamento do banco Citi mostra que, de forma geral, as ações brasileiras estão no mesmo patamar de preço da última década (a conta é feita com base num índice que mede a relação entre o lucro das companhias e o valor de seus papéis).
“A diferença é que os juros caíram, o que reduz o custo de captação das empresas. Levando isso em consideração, os papéis estão mais baratos hoje”, afirma Stephen Graham, diretor de análise de ações latino-americanas do banco Citi.
Na opinião da maioria dos analistas, para quem pretende manter seus recursos na bolsa por anos, este pode ser um bom momento para começar a ver a grama crescer.