Revista Exame

Quando empresário conversa demais com governo, algo vai mal

Cada empresário que vai às autoridades econômicas defender seu patrimônio obtém alguma vantagem. Mas o governo sempre atende com decisões incoerentes. Resultado: é difícil achar alguém satisfeito com a economia

Encontro no Planalto: nas reuniões com o governo, todos são capazes de demonstrar que estão sendo prejudicados (Agência Brasil)

Encontro no Planalto: nas reuniões com o governo, todos são capazes de demonstrar que estão sendo prejudicados (Agência Brasil)

DR

Da Redação

Publicado em 20 de setembro de 2013 às 19h06.

São Paulo - Num país em que boa parte dos empresários se habituou a conversar a portas fechadas com as autoridades econômicas do governo, levando pilhas de números, queixas a respeito das dificuldades em seus negócios e, ao final, um pedido para alterar isso ou aquilo, é natural que acabem se formando entre as partes relacionamentos pouco sadios.

Quanto menos assuntos elas tivessem de tratar, melhor seria para todos — as empresas, o governo e a população brasileira em geral. Teríamos, aí, um sinal de que os mecanismos essenciais da economia estão funcionando com a normalidade possível: em vez de conversar com o governo, as empresas estariam conversando com seus consumidores e aplicando seu tempo em desenvolver competências para prosperar dentro das regras existentes.

Da mesma forma, quanto mais assuntos têm para tratar, ou acham que têm, pior — o sinal, nesse caso, é que o governo está errando muito na operação da máquina econômica ou que as empresas estão pedindo demais, ou então, o que seria menos saudável ainda, que estão pedindo o que não deviam.

Em vez de colocarem todo o foco nas tarefas básicas de competir, ganhar em qualidade, aumentar sua eficiência, crescer em produtividade — enfim, fazer melhor o que estão fazendo —, acham que o caminho mais indicado para fechar o ano com um bom balanço é ficar indo a Brasília.

Esse vaivém contínuo raramente dá bom resultado. As conversas nos gabinetes ministeriais e seus satélites, na maioria das vezes, são improdutivas — discute-se muito, resolve-se pouco. Cada setor empresarial vai a Brasília para defender o próprio patrimônio, e isso frequentemente prejudica o patrimônio dos outros.

Não há coerência nas decisões nem um conjunto de regras ou procedimentos iguais para todos; o que fica resolvido num caso não vale para casos equivalentes. Todos são capazes de demonstrar que seu setor está sendo prejudicado por esse ou aquele motivo — o que torna impossível atender a todos ao mesmo tempo e na mesma medida.

Muitos reclamam de dificuldades que não foram criadas pelo governo, pedem mudanças que criariam precedentes ou reivindicam solução para problemas derivados de sua baixa produtividade, atraso tecnológico ou pura e simples má gestão. No fim das contas, fica estabelecida uma dessas situações em que ambas as partes cedem em alguma coisa e as duas acabam infelizes.


Os casos de “desoneração” são um clássico no gênero. O governo se sente prejudicado porque abriu mão de impostos que esperava arrecadar. Os empresários se sentem prejudicados porque receberam menos do que esperavam levar.

Temos, no momento, uma situação curiosa. Os dirigentes de empresa continuam adorando “ir a Brasília” e, sobretudo, contar que foram; suas secretárias às vezes dão, por conta própria, um upgrade na viagem, informando ao telefone que “O doutor fulano foi chamado a Brasília”. Mas gostam apenas da viagem de ida; na viagem de volta passam o tempo falando mal do governo.

O resultado é que vai se tornando cada vez mais difícil encontrar um empresário satisfeito com a situação atual da economia e com as respostas que vêm sendo dadas aos problemas apresentados por ela. As autoridades da área, ao mesmo tempo, estão convencidas de que já fizeram e continuam a fazer tudo o que podiam.

Lembram que o dólar já esteve a 1,60 real, cotação que, na opinião de todos, tornava impossível às empresas brasileiras competir no mercado internacional e defender-se da inundação de importações. Hoje, por ação do governo, está acima de 2,20 reais. A redução nos custos das empresas, também solicitada por todo mundo, foi auxiliada pelas múltiplas “desonerações” concedidas pelo Fisco.

As taxas de juro dos bancos públicos foram fortemente reduzidas, o que puxou para baixo o custo financeiro em geral — outra queixa universal no mundo dos negócios. O governo, em suma, acha que está sendo muito amigo.

Está? Não o suficiente para receber a nota 10 que espera do empresariado.

Acompanhe tudo sobre:economia-brasileiraEdição 1047EmpresasGoverno

Mais de Revista Exame

Invasão chinesa: os carros asiáticos que chegarão ao Brasil nos próximos meses

Maiores bancos do Brasil apostam na expansão do crédito para crescer

MM 24: Operadoras de planos de saúde reduzem lucro líquido em 191%

MM 2024: As maiores empresas do Brasil