Revista Exame

Ordem no tribunal gaúcho

Um programa de aperfeiçoamento da gestão da Justiça gaúcha gera economia e serviços melhores — e pode inspirar mudanças em outros órgãos públicos

Escultura "A Justiça", de Alfredo Ceschiatti, em frente ao prédio do STF (Valdemir Cunha/VIAGEM E TURISMO)

Escultura "A Justiça", de Alfredo Ceschiatti, em frente ao prédio do STF (Valdemir Cunha/VIAGEM E TURISMO)

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Da Redação

Publicado em 6 de outubro de 2011 às 19h49.

Brasília - Reza um velho ditado que “a justiça tarda, mas não falha”. Mas, devido à morosidade de boa parte das cortes do país, que submete cidadãos e empresas a anos de espera por uma sentença, no nosso caso a Justiça não só tarda como falha.

Para escapar dessa sina, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul vem seguindo um programa de melhoria de gestão desde 2009 com o objetivo de eliminar desperdícios e tornar mais ágil o atendimento.

A boa notícia é que o tribunal, assessorado pelo Instituto de Desenvolvimento Gerencial, comandado pelo guru de gestão Vicente Falconi, tem colhido resultados que vão da economia nos gastos de custeio ao aumento da rapidez na distribuição e no julgamento de processos.

A racionalização de tarefas já resultou num ganho de 120 milhões de reais. “Vamos usar os recursos no treinamento dos servidores e na compra de equipamentos para acelerar nossa informatização”, diz Omar Amorim, diretor-geral do tribunal gaúcho. “A folga de caixa representa uma autonomia orçamentária inédita para o tribunal.”

Na ponta do usuário, a redução do tempo foi significativa. O indicador mais notável diz respeito à distribuição dos processos de segunda instância — os que, após um julgamento inicial, sofreram uma apelação —, despachados das 164 comarcas do interior para a sede, em Porto Alegre. Antes, demorava 20 dias úteis para um processo chegar à mão do juiz responsável. Agora, o prazo é de apenas um dia. 

Tal desempenho já repercute em Brasília. “As soluções criadas pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul são tão positivas que devem servir de modelo aos demais estados”, diz Cezar Peluso, presidente do Supremo Tribunal Federal e também do Conselho Nacional de Justiça, órgão criado para aprimorar os serviços judiciários.

Boa parte da morosidade se concentra nos 93 tribunais estaduais, como os TJs e as cortes trabalhistas, que acumulam 80% do volume de processos do país.

Força-tarefa

No Rio Grande do Sul, a história começou a mudar com um diagnóstico para detectar gargalos e ineficiências. No setor de compras, havia nada menos do que 58 procedimentos. Com isso, a aquisição de uma simples lâmpada levava meses. Os gastos com água, luz e telefone não tinham controle.

Não havia manutenção periódica de equipamentos nem identificação dos responsáveis pelas ligações. E o mais grave: o tribunal só conhecia seu estoque de processos acumulados, sem nenhum controle sobre quando os casos chegavam e quais eram distribuídos aos juízes.


Além disso, a rotina era ditada pelo acúmulo incessante do papelório. De posse do diagnóstico — e apesar da resistência de boa parte dos 8 000 funcionários da instituição, incluindo muitos juízes —, o programa começou a avançar.

“À medida que os servidores e os magistrados percebiam o potencial de ganhos, eles aderiam à mudança, que incluía o redesenho de tarefas e a criação de ferramentas de gestão online”, diz Bayard Loureiro, sócio da consultoria INDG.

A principal ferramenta desenvolvida é um software de gerenciamento matricial, um painel de controle que possibilita ao tribunal monitorar o fluxo dos processos e o desempenho das comarcas e dos juízes.

Foi com a comparação permitida pelo software que o juiz José Luis Vieira descobriu que sua comarca, em Frederico Westphalen, no norte do estado, estava atrasada. “Assim que soube do problema, montei uma força-tarefa de servidores e em dois meses conseguimos cumprir a meta de atendimento ao cidadão”, diz Vieira.

O prazo dos julgamentos na comarca, que era de dois anos, caiu pela metade. A tecnologia também ajuda os escritórios de advocacia. Hoje, 270 deles já fazem petições online. “Só em despesas com correio, papel e impressão, economizo 120 reais por processo”, diz Wagner Segalla, o primeiro advogado gaúcho a aderir ao peticionamento virtual.

A atual fase do programa prevê o uso mais intensivo do meio digital. A meta é que todas as ações feitas em papel migrem para o computador até 2014.

Por enquanto, o vaivém dos carrinhos atulhados de processos ainda domina o visual. Mas a situação já foi bem pior. “Antes do programa, tínhamos um ambiente opressivo, com pilhas de processos para todo lado”, diz Lilian Tomii, diretora do departamento processual, com 236 funcionários. A fim de motivá-los, o tribunal criou um sistema que premia com folgas quem cumpre as metas de distribuição.

O exemplo gaúcho está se repetindo em estados como São Paulo e Rondônia. O Tribunal de Justiça paulista contratou em janeiro a consultoria do Movimento Brasil Competitivo, fundada pelo empresário Jorge Gerdau Johannpeter. “Já detectamos oportunidades de ganhos de 82 milhões de reais”, diz Erik Camarano, presidente do MBC.

Também em fase inicial, em Rondônia o programa se concentra em diagnóstico e treinamento de pessoal. Mas, de acordo com o CNJ, a Justiça dos estados cumpriu menos de 50% da meta de desempenho de 2010. Além da morosidade, o Poder Judiciário peca pela gastança.

Recentemente, os ministros do STF aprovaram uma proposta de orçamento que prevê aumentos de seus salários de 26 700 para 30 600 reais, além da construção de um prédio de 4 milhões de reais para a TV Justiça. Ainda falta muito para a iniciativa do TJ gaúcho se tornar a regra, e não a exceção, na Justiça do país.

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