Sorrindo: Gomes já tem franquias em Portugal e quer ir à Índia e à China (Leandro Fonseca/Exame)
Da Redação
Publicado em 25 de abril de 2019 às 05h36.
Última atualização em 24 de julho de 2019 às 17h17.
Quando tinha 30 anos, em 2001, o administrador paranaense Oséias Gomes resolveu dar uma mão a um amigo dentista que conheceu na juventude em Telêmaco Borba, cidade de 80.000 habitantes no interior do Paraná, onde ambos moravam. O consultório, mal administrado, ia de mal a pior. Gomes trabalhava como consultor de empresas, principalmente do setor de papel e celulose, e não entendia nada de serviços de saúde. Não mirou o tratamento em si, mas percebeu que havia muita oportunidade na atração de clientes. A principal ideia foi parcelar os pagamentos em muitas vezes, já que boa parte da clientela não tinha condição de pagar à vista. Ele também organizou o fluxo de caixa e conseguiu baixar a inadimplência no consultório.
A experiência serviu de laboratório para Gomes criar em 2009 a Odonto Excellence, rede de franquias de atendimento odontológico. No ano passado, a empresa faturou 300 milhões de reais, o triplo de três anos atrás. A expectativa para este ano é chegar a meio bilhão.
A Odonto Excellence abre uma franquia a cada 72 horas. A empresa já tem mais de 700 unidades em quase todos os estados, a maioria em cidades do interior — há unidades em municípios como Ariquemes e Cacoal, em Rondônia. Também tem franquias em Portugal, Paraguai e Angola. O foco são áreas com carência de profissionais de saúde e potencial de crescimento e gente que consegue pagar um tratamento parcelado. Segundo o Conselho Federal de Odontologia, cerca de 55% dos dentistas brasileiros estão concentrados em São Paulo, no Rio de Janeiro e em Minas Gerais.
Mesmo em cidades com abundância de mão de obra especializada, o tratamento dentário sempre foi inacessível para boa parte da população. Apenas 45% dos brasileiros vão ao dentista todo ano e mais de 25 milhões nunca entraram num consultório odontológico. Na Odonto Excellence, que oferece de implantes a tratamentos estéticos, o serviço pode ser pago em até 48 vezes para tratamentos que custam, em média, 2.000 reais. Quem indica novos clientes ganha desconto. “O cliente diz quanto pode pagar. O parcelamento é uma ótima forma de conquistar clientes e fidelizá-los”, diz Gomes. Como sempre há um novo tratamento a ser oferecido, os clientes podem voltar muitas e muitas vezes.
Os fundamentos do negócio justificam o crescimento. Para a conta fechar, Gomes — filho de agricultores que começou a trabalhar aos 17 anos como office-boy no banco Bamerindus — aposta na escala. Uma cadeira de dentista dificilmente custa menos do que 10.000 reais e os materiais usados, na maioria importados, também são caros. Assim que a rede começou a crescer e o volume de compras de insumos aumentou, de 2011 para cá, o empreendedor passou a fazer acordos com fornecedores. Hoje, ele obtém descontos que chegam a 50% do preço do produto.
Gomes consegue crescer rápido também porque cobra pouco dos novos franqueados — a taxa de franquia é de 18.000 reais — e não exige bagagem em saúde (os dentistas, evidentemente, precisam ter experiência). Para não perder a mão, o franqueador investe em treinamento e em acompanhamento constante. “É difícil encontrar bons profissionais, e isso pode pôr em risco um negócio de saúde que cresce de forma acelerada”, diz Marcelo Cherto, consultor especializado em franquias. Os pacientes ganham bonificação sempre que avaliam, pelo aplicativo, o tratamento recebido. As avaliações e o fluxo de caixa de cada sete unidades são acompanhados por um gerente que fica na sede da empresa, em Ponta Grossa, no Paraná.
Crescer rápido também ajuda a ocupar o terreno antes da concorrência. Mais de 20 redes odontológicas seguem um modelo parecido com o da Odonto Excellence. Algumas, como a Odontoclinic, fundada há 30 anos, chamaram a atenção de fundos de investimento — em 2010, a empresa, que fatura cerca de 200 milhões de reais, foi comprada pelo fundo Bravia Capital. A companhia diz ter deixado para trás os problemas de gestão e planeja intensificar o ritmo de crescimento.
Outras redes também tiveram problemas causados por um setor que tem dificuldade de aliar qualidade no atendimento em larga escala com finanças em ordem. A Sorridents, uma das líderes do ramo, quase quebrou em 2009, quando mudaram as condições de um empréstimo bancário que acabara de fazer. Na época, a Sorridents crescia rapidamente e tinha dezenas de franquias. A empresa conseguiu renegociar a dívida e seguir em frente. Sua fundadora, Carla Sarni, gosta de dizer que aprendeu uma lição: é mais importante se preocupar em ser a melhor empresa, e não a maior.
Muito a explorar
As clínicas odontológicas faturam cerca de 38 bilhões de reais por ano no Brasil, quase o dobro do obtido dez anos atrás. O crescimento dos consultórios populares vem contribuindo para a expansão. “Quando as pessoas vão a uma clínica e conseguem ver os efeitos do tratamento, que muitas vezes dá a oportunidade de sorrir de novo, elas costumam voltar”, diz Gomes.
A Odonto Excellence, nesse contexto, preenche uma lacuna entre a saúde pública e os planos privados. É uma lacuna que também impulsionou, nos últimos anos, clínicas de medicina popular. Apenas 47,3 milhões de brasileiros, menos de 25% da população, têm um plano de assistência médica privada. Redes como o Dr. Consulta, criado em 2011, cresceram ao oferecer exames e tratamentos a preços populares para a classe C. Com mais de 70 unidades, o Dr. Consulta recebeu em 2017 investimentos de 95 milhões de dólares de seis fundos estrangeiros para pavimentar a expansão.
Gomes planeja levar o negócio para países com carência de saúde pública, como Índia e China, onde diz já ter franqueados interessados. Ele quer, também, diversificar os negócios e abrir redes de casas de repouso para idosos de classe média. Até o final do ano Gomes pretende criar um centro de inovação em São Paulo nas áreas de saúde, alimentação e entretenimento para pensar em projetos futuros. O desafio de crescer depressa e manter o controle vai ser ainda mais posto à prova.