Metrô em São Paulo: aumento de tarifa adiado a pedido de Guido Mantega (Germano Lüders / EXAME)
Da Redação
Publicado em 7 de fevereiro de 2013 às 07h08.
São Paulo - Em uma de suas célebres tiradas antiestatais, o economista americano Milton Friedman disse que governos nunca aprendem — apenas os indivíduos aprendem. Por trás da frase está a percepção de que, se a sociedade não fiscaliza, governos logo se sentirão tentados a repetir erros do passado.
Pode-se discutir eternamente se Friedman tinha ou não razão — mas o governo brasileiro teima em provar que ele estava certo. Dilma Rousseff e sua equipe têm repetido algumas das piores experiências vividas pelo país no campo econômico. A lista inclui intervenções, controle de preços e dribles no orçamento. Como se sabe, é o tipo de coisa que não acaba nada bem.
O exemplo mais gritante é o conjunto de iniciativas para tentar conter os preços. Desde 2010, para ajudar a segurar a inflação abaixo de 6,5% ao ano, teto da meta perseguida pelo Banco Central, os preços da gasolina e do diesel são mantidos à base de congelamento e redução de tributo — e de prejuízo para a Petrobras.
Há algumas semanas, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, evitou o reajuste das tarifas de ônibus e metrô em São Paulo e no Rio de Janeiro pedindo a autoridades locais que adiassem o aumento. O objetivo foi conter a inflação de janeiro para não "contaminar as expectativas" de 2013. Mas segurar a inflação na marra ou na base do jeitinho nunca deu certo. Nem a pena de morte funciona.
No ano 301, preocupado com a desvalorização do denário, o imperador romano Diocleciano criou o Édito dos Preços Máximos, listando o valor de produtos, salários e serviços. Um professor de latim ou grego não poderia cobrar mais que 200 denários por mês de um aluno. Se passasse disso, corria o risco de ser atirado de um precipício ou afogado.
No Brasil do século 20, diversos governos tentaram impedir a escalada de preços à força. Uma das iniciativas mais esdrúxulas foi a criação do Conselho Interministerial de Preços, em 1968. Empresas levavam planilhas ao CIP para convencer os técnicos do governo a permitir um reajuste. Nenhuma das medidas jamais deu resultado consistente.
A inflação só foi domada, após décadas de tentativas malsucedidas, com o Plano Real, e foi contida nos anos seguintes com a entrada em vigor do hoje famoso "tripé" macroeconômico — uma política monetária voltada para o cumprimento de metas de inflação, o câmbio flutuante e o controle das contas públicas. É chato e dá trabalho, mas é o que dá certo. "Não há exemplo de controle de preços que funcione", diz o economista Alexandre Schwartsman, ex-diretor do Banco Central.
A reedição de velhas gambiarras para segurar os preços é, infelizmente, coerente com outras medidas recentes. Para impulsionar os investimentos e o desempenho da indústria, que continuam em queda, o governo poderia atacar problemas crônicos, como a burocracia tributária e a infraestrutura precária. Mas adota saídas que são velhas conhecidas dos brasileiros, ao menos daqueles que eram adultos nos anos 70 e 80: a intervenção e o protecionismo.
Os exemplos da mão pesada estatal são vários — e os danos dessas medidas, óbvios. A forma pela qual foi obtida a queda do preço da energia elétrica é exemplo de como uma medida bem-intencionada num setor pode atrapalhar a economia como um todo. Ao forçar empresas a renegociar concessões em condições que causam perdas aos acionistas, o governo passou o sinal de que muda as regras quando quer — e gerou incerteza entre investidores.
Isso não ajuda uma economia em que a taxa de investimento vem caindo há um ano e meio. Outra antiga mania nacional que voltou com tudo é a proteção da indústria contra importações. O governo Dilma criou mais de 40 medidas com esse objetivo. Até a importação de aparelhos hospitalares ficou mais difícil — o Ministério da Saúde aceita pagar 25% mais por um produto brasileiro ameaçado por similar importado.
Como ocorre com o controle de preços, é uma medida que, a história ensina, termina mal."O protecionismo nos deu produtos mais caros e de pior qualidade", diz Simão Silber, professor de economia da Universidade de São Paulo. "Porque somos mais ineficientes, o governo impede a concorrência externa. É um círculo vicioso." De novo, é a adoção da solução simples, e errada, para um problema complexo.
Igualmente preocupantes são os sinais de que a política fiscal está voltando a ser, digamos, uma caixinha de surpresas. O governo tem usado com despudor surpreendente o Tesouro Nacional para financiar a expansão do BNDES, o banco nacional de desenvolvimento. O estoque de créditos do Tesouro com o banco saiu de 7 bilhões de reais, em 2007, para 358 bilhões, no fim do ano passado.
A injeção de recursos na Caixa Econômica Federal e no Banco do Brasil segue o mesmo padrão. Essas transferências são vistas como reedição de uma anomalia que vigorou de 1964 a 1986: a conta movimento do Banco do Brasil. Por ela, o BB recebia do Banco Central recursos não previstos no orçamento e os repassava a agricultores e exportadores.
A operação causava inflação e aumento da dívida pública porque os recursos eram obtidos da impressão de moeda. Como se isso não bastasse, causou espanto o truque para cumprir a meta de superávit fiscal de 2012 — houve até antecipação de 7 bilhões de reais em dividendos de estatais.
Tudo isso abala a estabilidade e a credibilidade do país. Em janeiro, o jornal inglês Financial Times disse que o ministro Mantega e o presidente do BC, Alexandre Tombini, se tornaram "profissionais do jeitinho". Num momento de crise como o atual, é normal que medidas heterodoxas sejam tomadas pelos governos.
É o que fazem os Estados Unidos e países da Europa. No afã de provocar o crescimento, cometem erros, claro. O Brasil vai por via oposta. "Não erramos por tentar inovar. Erramos porque repetimos políticas que, sabe-se, fracassarão", diz Monica de Bolle, diretora do instituto de estudos Casa das Garças, do Rio de Janeiro. Está na hora de o Brasil aprender com sua própria experiência.