Revista Exame

O triunfo da paralisia no governo Dilma

Não há um plano B para o caso de derrota no Congresso da proposta de ressuscitar a CPMF. Na verdade, não há nem o plano A


	 Realidade ou fantasia?: fala-se até em legalizar o jogo do bingo para arrecadar o dinheiro que viria com a CPMF
 (lewishamdreamer/Flickr/Creative Commons)

Realidade ou fantasia?: fala-se até em legalizar o jogo do bingo para arrecadar o dinheiro que viria com a CPMF (lewishamdreamer/Flickr/Creative Commons)

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Da Redação

Publicado em 23 de setembro de 2015 às 18h00.

São Paulo — Pouca gente com algum bom senso perdeu seu tempo levando a sério a última lista de propostas da presidente Dilma Rousseff para lidar com a situa­ção de pré-falência em que enterrou o próprio governo — mas menos gente ainda, talvez, contava que a fumaça de gelo-seco apresentada como conjunto de medidas para o “ajuste fiscal” fosse se desfazer tão depressa.

Não chegou a durar três dias. Antes disso, a presidente e os mortos-vivos que hoje formam sua equipe íntima já estavam fugindo das ações que tinham acabado de anunciar. Não, não vamos mais economizar com o pagamento do funcionalismo federal. Não, não vamos cortar despesas com os “programas sociais”.

Não, não vamos diminuir o exército de 25.000 parasitas que colocamos nos degraus mais altos da máquina pública. Querem mesmo saber? Não vamos cortar gasto nenhum. Era esperado que as coisas ficassem exatamente assim, claro, diante da vida pregressa do governo Dilma. Mas não se esperava que tudo fosse tão rápido.

Resultado: o pacote de medidas não demorou quase nada para mostrar o que sempre foi — uma tentativa de ressuscitar o “imposto do cheque”, apenas e exclusivamente isso. Eis aí a “reforma do modelo de financiamento do Estado” que o governo tem para nos apresentar.

Trata-se de mais um passeio ao acaso. Nem mesmo a tentativa de recriar a CPMF tem um mínimo de integridade. Até ser reeleita — e até ser colocada diante do abismo que cavou nas contas públicas —, Dilma não tinha falado uma sílaba sobre essa “contribuição” que hoje passou a considerar essencial para a salvação da pátria.

Num truque miúdo, arrumado às pressas, mudaram o nome do imposto para CPPrev, tentando vender a fantasia de que o dinheiro a ser arrecadado servirá para pagar os desembolsos da “previdência social”. No desespero, prometem dar parte da pilhagem para “os governadores” — quem sabe, assim, eles ajudam o governo a socar essa conta em cima da população.

Horas depois de propor a volta da CPMF, a presidente já se dispunha a dobrar a alíquota de 0,2% que ela mesma acabara de anunciar. Como assim? Ou a taxa original estava certa, e não poderia ser simplesmente multiplicada por 2, ou estava grotescamente errada e nunca deveria ter sido proposta.

Eis aí, entre tantas outras, mais uma demonstração prática da falta de respeito com o público, com os fatos e com a lógica que ilustra tão bem a conduta diária do governo Dilma-Lula-PT. Mais que tudo, nem mesmo a ressurreição do imposto do cheque parece guardar contato com as realidades do planeta Terra.

É o único objetivo do pacote — e foi lançado ao ar sem a mínima garantia de que venha a ser aprovado no Congresso. Não houve nenhuma consulta prévia, a ninguém, para calcular as chances reais de aprovação. Não houve reflexão. Não houve trabalho. Não há um “plano B” para o caso de derrota da proposta.

Na verdade, não há nem mesmo “plano A”, pois o que se apresentou não foi um projeto real de ação; foi apenas mais um momento clássico do estilo Dilma de governar. O resumo da ópera é ruim. Com nove meses em seu segundo mandato, o ajuste fiscal está no estágio zero, como comprovam os fatos acima.

É algo que parece essencial para enfrentar o caos cada vez mais presente na economia — e até, possivelmente, para a sobrevivência política do governo. No mundo das realidades, porém, o que existe é o triunfo da paralisia. Imagina-se que demitindo o ministro Aloizio Mercadante as coisas se arrumem — como se o problema fosse ele.

Lula fala que tudo se resolve se o governo não falar mais em “ajuste”; deve dar “boas notícias”, que ninguém sabe quais seriam. Fala-se em legalizar o jogo do bingo para arrecadar o dinheiro que se esperava do “imposto do cheque”. Seria uma piada de repercussão internacional, se fosse uma piada — mas é uma esperança.

Veio dar nisso, o governo: é o time que está perdendo de 1 a 0 e manda o goleiro para a área do adversário, no último minuto dos descontos, para tentar um gol de cabeça no escanteio. Santo Deus.

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