Revista Exame

O Reino Unido deve sair ou não da União Europeia?

O Reino Unido decide no dia 23 de junho se fica na União Europeia. As consequências econômicas da saída são muito ruins, mas o eleitorado segue dividido.


	Partidários pelo "não" à União Europeia: eles têm metade das intenções de voto
 (Georges Gobet/AFP)

Partidários pelo "não" à União Europeia: eles têm metade das intenções de voto (Georges Gobet/AFP)

DR

Da Redação

Publicado em 27 de abril de 2016 às 05h56.

São Paulo — A dois meses do referendo que decidirá a permanência ou não do Reino Unido na União Europeia no dia 23 de junho, os britânicos estão divididos. Quarenta por cento são a favor da retirada, o mesmo percentual do grupo contrário à ideia — os indecisos são cerca de 15% e 5% dizem que não vão votar.

De um lado estão eleitores preocupados com a onda migratória dos refugiados e com a perda de soberania. De outro, estão os que acham que o Reino Unido é mais poderoso junto com os vizinhos. Embora seja uma votação local, o que está em jogo é mais do que o destino dos 64 milhões de ingleses, escoceses, galeses e habitantes da Irlanda do Norte. 

O temor é que uma eventual saída de um país com a importância do Reino Unido, a segunda maior economia da Europa, seja o começo de um processo de enfraquecimento do bloco. Juntos, os 28 membros da União Europeia têm uma população superior a 500 milhões e uma economia de mais de 19 trilhões de dólares, a maior do mundo.

Com a vitória do “não” à permanência, a retirada de outros países poderá surgir no horizonte. Os europeus estão há anos preocupados com a Grexit (junção de Greece com exit), a possibilidade de a Grécia ser forçada a sair da zona do euro. Trata-se de um país periférico, uma economia minúscula que deixaria a união monetária, que une 19 países.

Agora os líderes europeus tremem diante da Brexit, uma ameaça muito maior. Num referendo imaginário que contasse apenas com a participação de economistas, o “sim” ganharia de lavada. Numa pesquisa recente feita pelo jornal The Financial Times com mais de 100 economistas, nenhum defendeu que a economia se beneficiaria neste ano com uma eventual saída.

No médio prazo, mais de 70% deles disseram que o país também sairia perdendo, e 18% disseram que não faria diferença. Apesar da opinião francamente favorável à permanência na classe dos economistas, não é fácil estimar as perdas com a saída. Tudo vai depender do tipo de relação que o país venha a ter com a União Europeia após sua retirada.

Para o Reino Unido, faria todo o sentido manter uma relação próxima à União Europeia após uma eventual saída. Afinal, o bloco é responsável por quase 50% de todo o seu comércio internacional. Economistas da London School of Economics aceitaram o desafio de tentar prever e traçaram dois cenários. Em ambos, há uma queda da renda per capita.

No cenário otimista, o Reino Unido consegue firmar um acordo de livre-comércio com a União Europeia. Nesse caso, as perdas são minimizadas e a renda das famílias sofre uma redução de 850 libras por ano. No pior cenário, o acordo de livre-comércio não sai e a renda cai 1 700 libras.

Sem um acordo depois da saída, os setores automotivo, aeroespacial e financeiro serão os mais afetados. O bancário, que emprega mais de 2 milhões de pessoas e é responsável por cerca de 12% do PIB, tende a ser o que mais perde.

“Os bancos devem mudar a sede para países onde possam operar em toda a Europa”, afirma Alfredo Pastor, ex-secretário para Assuntos Econômicos da Espanha e especialista em União Europeia da escola de negócios Iese. O banco HSBC já anunciou que deverá retirar mais de 1 000 funcionários de sua sede de Londres caso a saí­da aconteça.

De quem foi a ideia?

Mesmo antes da crise econômica iniciada na última década e da enxurrada de refugiados da Síria, o sentimento anti-União Europeia sempre foi visível no Reino Unido, ainda que restrito a alguns círculos. Mas o curioso é que, até há pouco tempo, a proposta de um referendo parecia totalmente fora de cogitação.

Os cálculos políticos do primeiro-ministro David Cameron, porém, mudaram tudo isso. Favorável à permanência na União Europeia, Cameron viu no referendo uma chance de derrotar seus adversários dentro do Partido Conservador e enfraquecer os nacionalistas do Partido da Independência do Reino Unido (Ukip, na sigla em inglês).

Num discurso na sede da empresa de comunicação Bloomberg, em 2013, que se tornou famoso, Cameron prometeu que convocaria um referendo se ganhasse as eleições que se aproximavam, o que acabou acontecendo. O resto já é história. A ideia da separação da União Europeia ganhou uma força que poucos previam e agora Cameron enfrenta a oposição de metade de seu partido.

“Os conservadores estão em guerra civil”, diz o sociólogo Anthony Giddens, membro da Câmara Alta do Parlamento britânico pelo Partido Trabalhista (veja entrevista ao lado). Caso o voto pela saída vença, é bem provável que Cameron perca a liderança do partido. Nesse cenário, o nome de Boris Johnson, o carismático prefeito de Londres partidário do voto pelo “não”, ganharia força.

Num prazo curtíssimo, o Reino Unido poderá ter de enfrentar uma crise econômica e política ao mesmo tempo. Na eventualidade da vitória do “sim”, o potencial de crescimento da economia se manterá o mesmo e Cameron salvará o próprio pescoço, mas o Reino Unido continuará dividido. Mesmo com todo o bom humor dos espirituosos britânicos, está difícil de esboçar algum sorriso.

Acompanhe tudo sobre:David CameronEconomistasEdição 1112EuropaPaíses ricosReino Unido

Mais de Revista Exame

Invasão chinesa: os carros asiáticos que chegarão ao Brasil nos próximos meses

Maiores bancos do Brasil apostam na expansão do crédito para crescer

MM 24: Operadoras de planos de saúde reduzem lucro líquido em 191%

MM 2024: As maiores empresas do Brasil