Revista Exame

O reinado de 15 anos dos bancos

Pesquisa exclusiva mostra que as instituições financeiras cresceram bem mais que as empresas nos últimos 15 anos. Mas a situação começa a mudar

Trabuco, do Bradesco: para ele, o retorno dos bancos ficará mais parecido com o das empresas   (Germano Luders/Site Exame)

Trabuco, do Bradesco: para ele, o retorno dos bancos ficará mais parecido com o das empresas (Germano Luders/Site Exame)

DR

Da Redação

Publicado em 11 de julho de 2011 às 06h00.

São Paulo - O magnata americano John Rockefeller, fundador da Standard Oil, costumava dizer que o melhor negócio do mundo era ter uma petroleira bem administrada — e o segundo melhor, ser dono de uma petroleira mal administrada.

No Brasil dos últimos 15 anos, a lógica de Rockefeller também vale, mas para outro setor da economia. Por aqui, bom negócio mesmo tem sido ser dono de banco. Um levantamento feito a pedido de EXAME pela Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras (Fipecafi), ligada à Universidade de São Paulo, mostra que, de 1996 a 2010, as 50 principais instituições financeiras do país cresceram bem mais e tiveram, em média, uma rentabilidade bastante superior à das 500 maiores empresas brasileiras.

No perío­do, os ativos dos bancos triplicaram, enquanto os das empresas aumentaram 29%. Nesse intervalo, cada real aplicado pelos banqueiros em suas instituições rendeu 15% ao ano, o dobro do retorno recebido pelos empresários.

É comum que os bancos sejam mais rentáveis que as empresas — e isso vale para a maioria dos países com economia diversificada. Bancos, afinal, não precisam fazer tantos investimentos em máquinas ou instalações e podem, no jargão do mercado financeiro, "alavancar" seu patrimônio.

Ou seja, para cada real que seus sócios têm em capital, um banco pode emprestar um punhado de reais a empresas, governos e pessoas. Mas há algo que chama a atenção no caso brasileiro: o tamanho da diferença entre o desempenho dos bancos e os resultados das empresas.


No fim dos anos 90 e início da década passada, os bancos renderam o triplo que as empresas em várias ocasiões, algo que não ocorre no exterior, onde a diferença média é de cerca de 10% segundo um estudo do economista Aswath Damodaran, da Universidade de Nova York. "Quando a disparidade de retornos é muito grande, é sinal de que há problemas", diz Damodaran.

O problema do Brasil é conhecido: a combinação entre juros altíssimos e escassez de financiamento. "Como o custo do crédito é elevado, as companhias brasileiras costumam ser mais conservadoras que as americanas e as europeias ao tomar empréstimos e, por isso, crescem e rendem menos", diz Carlos Antonio Rocca, diretor do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais.

Isso continua sendo verdade, mas o levantamento da Fipecafi mostra que a situação das companhias começou a melhorar. A rentabilidade média passou de 2,5%, em 1996, para 10,7%, em 2010 — e, assim, aproximou-se do patamar mundial de 13%. Como o retorno dos bancos caiu um pouco nos últimos anos, embora permaneça superior à média internacional, a distância entre o retorno de empresas e o das instituições financeiras diminuiu.

O desafio dos bancos é compensar a queda da rentabilidade com o aumento de receitas, buscando clientes em novas regiões do país e em classes sociais ainda pouco atendidas, estratégia que está na agenda da maioria das instituições.

É pouco provável, porém, que a mudança ocorra no curto prazo. Como a expectativa de inflação continua elevada, a previsão de boa parte dos analistas é que a taxa Selic fique acima dos 2 dígitos ao menos até o fim de 2012. Para aproximar-se, de fato, das instituições financeiras, as empresas têm um longo caminho a percorrer.

Seu retorno ainda é 40% inferior ao dos bancos e, nos últimos 15 anos, elas só foram capazes de render mais que os juros de mercado em 2010 — o que significa, no limite, que um empresário ganharia mais dinheiro se tivesse vendido sua companhia e aplicado os recursos num singelo fundo DI entre 1996 e 2009.


(Os bancos renderam menos que os juros entre 1996 e 2004 porque a taxa Selic foi altíssima no período: chegou a bater 40% ao ano para atrair investidores internacionais na fase de ajustes do Plano Real. Depois disso, o rendimento foi superior ao dos juros.)

Num ambiente tão hostil, surpreende que o parque industrial do país tenha crescido. Isso ocorreu, segundo especialistas, por duas razões. Uma delas é que o retorno das empresas varia bastante de acordo com o setor em que atuam — e há segmentos que, em alguns anos, chegam a ser mais rentáveis que os bancos.

As mineradoras, as farmacêuticas e as empresas de bens de capital, por exemplo, tiveram uma rentabilidade superior à média das instituições financeiras em 2010, de acordo com a Fipecafi. No caso das mineradoras, o bom desempenho se explica pelo aumento do preço do minério de ferro. As farmacêuticas foram beneficiadas pelo crescimento de renda da população, que passou a consumir mais medicamentos.

E as companhias de bens de capital, que produzem máquinas e equipamentos, ganham com o aumento dos pedidos das empresas. Outra razão foi o fato de os empresários terem se planejado para o longo prazo, talvez a única forma de esquecer o poder inibidor da combinação dos juros elevados com as bizarras barreiras à atuação das companhias brasileiras.

"Perdemos a primeira fase da expansão internacional, dos anos 90, porque tínhamos ajustes internos para fazer. Atualmente, o país tem a chance de evoluir em bases mais sólidas", afirma Luiz Carlos Trabuco, presidente do Bradesco. "A tendência, agora, é que o rendimento de bancos e empresas fique mais parecido. Quando isso acontecer, será um atestado que o país­ deu certo".

Acompanhe tudo sobre:BancosBancos médiosCrescimento econômicoDesenvolvimento econômicoEdição 099502FinançasJurosMercado financeiro

Mais de Revista Exame

Borgonha 2024: a safra mais desafiadora e inesquecível da década

Maior mercado do Brasil, São Paulo mostra resiliência com alta renda e vislumbra retomada do centro

Entre luxo e baixa renda, classe média perde espaço no mercado imobiliário

A super onda do imóvel popular: como o MCMV vem impulsionando as construtoras de baixa renda