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O plano é encolher a Eletrobras para torná-la mais forte

O presidente da Eletrobras, Wilson Ferreira Júnior, promete que a empresa terá as finanças sanadas. Mas só a privatização garantirá que ela seja competitiva

Ferreira Júnior:  cortes de 3 bilhões de reais ao ano nos custos operacionais 
da Eletrobras  (Germano Luders/Exame)

Ferreira Júnior: cortes de 3 bilhões de reais ao ano nos custos operacionais da Eletrobras (Germano Luders/Exame)

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Flávia Furlan

Publicado em 21 de setembro de 2017 às 05h35.

Última atualização em 21 de setembro de 2017 às 05h35.

São Paulo — Daqui a um ano a Eletrobras não terá mais prejuízos nem uma dívida fora do padrão do setor. A projeção é do engenheiro Wilson Ferreira Júnior, de 58 anos, que assumiu em junho de 2016 a presidência da estatal. Ela então acumulava 34 bilhões de reais em perdas e tinha um endividamento líquido que representava 8,8 vezes o lucro. Para superar essa fase, a Eletrobras implementou um programa que prevê uma redução de 3 bilhões de reais nos custos por ano — em um dos planos, 15 funcionários deverão se aposentar a cada dia até dezembro. “Seremos uma empresa menor, porém estável”, diz Ferreira Júnior. Se tudo estará bem, por que privatizá-la? Porque, segundo ele, para ser competitiva, a Eletrobras terá de reduzir as amarras da máquina pública. Acompanhe, a seguir, a entrevista que Wilson Ferreira Júnior concedeu a EXAME.

Exame - A Eletrobras passa por uma forte reestruturação. Que empresa restará?

Ferreira Júnior - Com esse processo, em meados de 2018 a Eletrobras não será mais uma empresa que gera prejuízos. Do ponto de vista financeiro, estará dentro do limite razoável de endividamento, com uma dívida líquida correspondente a três vezes o lucro operacional. A empresa vai focar duas atividades nas quais é relevante: a geração e transmissão de energia. Temos um terço da geração e 47% do sistema de transmissão do país. Não éramos relevantes na distribuição e, por essa razão, decidimos sair dessa atividade. Enfim, daqui a um ano a Eletrobras será uma empresa menor, porém estável.

Exame - Quais as medidas que estão sendo adotadas para chegar a esse resultado?

Ferreira Júnior - Quando houve a redução de tarifas de energia em 2012, a Eletrobras passou a ter custos 50% maiores do que as receitas. Para enfrentar isso, ao assumir a empresa,  reduzimos a estrutura organizacional — o que uma empresa privada normalmente faz — e cortamos 700 cargos de gestores. Havia 11 softwares de gestão nas companhias do grupo, mas até o fim do ano teremos apenas um, que será a base para um centro de serviços compartilhados. Abrimos um plano de aposentadoria para 5 000 funcionários — 2.100 já saíram e, a cada dia, 15 sairão até dezembro. Até o início de 2018 vamos iniciar um plano de demissão voluntária para 3.000 pessoas. Há ainda a venda das distribuidoras, que geram prejuízos e empregam 6.000 pessoas. Com tudo isso, a Eletrobras terá uma economia de até 3 bilhões de -reais por ano nos custos.

Exame - Uma das estratégias para reduzir o endividamento é a venda de ativos. Qual será o ritmo dessas vendas?

Ferreira Júnior - A Eletrobras teve de investir de 2010 a 2015 uma soma de 60 bilhões de reais. Sua dívida subiu para 8,8 vezes o lucro operacional. A decisão estratégica de privatizar as distribuidoras já foi tomada. Vendemos a Celg com 28% de ágio e as outras seis empresas de distribuição serão vendidas até o fim do ano. Quem está fazendo os estudos é o BNDES, e eles serão concluídos neste mês. O programa está com apenas duas ou três semanas de atraso. E temos 74 sociedades de propósito específico à venda, sendo que 58 delas são de energia eólica, e o restante, de transmissão. Já há um banco de investimento trabalhando para nós, o BTG. As vendas vão fazer com que a dívida da Eletrobras caia 6 bilhões de reais, para 17 bilhões.

Exame - Se a empresa estará equilibrada, por que a decisão de privatizá-la?

Ferreira Júnior - Vamos passar aqui anos insanos buscando resultados para conseguir de fato ter uma empresa operacionalmente estável. Dá para garantir que ela continuará arrumada? Não dá. A empresa tem hoje essa perspectiva de arrumação pela agenda que o governo atual estabeleceu. E dá para ambicionar que a Eletrobras seja competitiva ante os concorrentes? Não dá. Para a contratação de um sistema operacional único, nós levamos oito meses, enquanto uma empresa privada faz isso em dois. Por mais esforço que as pessoas façam, a estatal é sempre menos eficiente. As condições para concorrer são piores. Nesse caso, só resta à empresa ser minoritária. No nível de dívida que temos, não conseguiríamos acessar o mercado financeiro para crescer. O mercado de capitais funciona com recursos competitivos.

Exame - Em quais condições se dará a privatização da Eletrobras?

Ferreira Júnior - A Eletrobras é uma holding que tem quatro ativos principais: Furnas, Chesf, Eletronorte e Eletrosul. A oferta de ações depende de ter essas empresas dentro da holding. Não dá para fazer sem uma ou outra. Mas entendo que é uma discussão que a sociedade vai estabelecer nos próximos meses no Congresso. Acredito na transformação da Eletrobras numa empresa brasileira como é a Embraer. O governo não seria mais o controlador, mas teria poder de -decisão. Imagino que o mercado ficará confortável caso não haja mais a possibilidade de o governo, juntamente com o BNDES, deter uma participação maior do que 50% na Eletrobras — hoje, tem 63% —, embora isso ainda não tenha sido decidido.

Exame - Quais são as maiores resistências à realização desses planos?

Ferreira Júnior - Enfrentamos resistência na medida em que estamos reestruturando a companhia. Para ter uma ideia, tenho de lidar com mais de 60 instituições que representam os empregados. É uma empresa de 55 anos, e o cachimbo entorta a boca.

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