Revista Exame

O pior ano da história da Redecard

Em 2010, pela primeira vez em sua trajetória, a Redecard cresceu abaixo do esperado e seu lucro estagnou. Seu novo presidente tem uma missão e tanto pela frente

Roberto Medeiros, ex-presidente da Redecard: depois de três anos, ele deixou a companhia (Alexandre Battibugli/EXAME.com)

Roberto Medeiros, ex-presidente da Redecard: depois de três anos, ele deixou a companhia (Alexandre Battibugli/EXAME.com)

Tatiana Vaz

Tatiana Vaz

Publicado em 4 de junho de 2011 às 08h03.

As duas maiores credenciadoras de cartões do país, Redecard e Cielo, prosperaram durante mais de uma década numa espécie de mundo encantado dos negócios — um ambiente com pouca concorrência, crescimento rápido e muito lucro. De um lado, a Redecard tinha exclusividade para trabalhar no Brasil com as bandeiras Mastercard, Diners e Redeshop.

Do outro, a Cielo (antiga VisaNet) era a única a trabalhar com a marca Visa. Com o fim dos contratos de exclusividade, em julho de 2010, o encantamento dos dias de monopólio acabou — pelo menos para os acionistas da Redecard, controlada pelo Itaú Unibanco.

Acostumada a uma expansão anual média de 20,2% entre 2006 e 2009, a companhia viu seu faturamento crescer apenas 9% no ano passado, alcançando 3,6 bilhões de reais. O lucro andou de lado: aumentou imperceptível 0,3%, atingindo 1,4 bilhão de reais. Feitas as contas, tanto em termos de aumento de receita quanto de lucro, a Redecard teve em 2010 o pior período de seus 15 anos de história.

Os dados chamam a atenção sobretudo quando comparados aos de sua principal concorrente. No mesmo período, a Cielo, controlada por Banco do Brasil e Bradesco, faturou 4,5 bilhões de reais, 15,4% mais que no ano anterior, e lucrou 1,8 bilhão de reais, 20% mais em relação a 2009.

“Privilegiamos o crescimento, mesmo sabendo que a rentabilidade cairia, numa estratégia definida junto com o conselho de administração”, afirma o executivo Roberto Medeiros, que, no dia 15 de abril, se desligou definitivamente da presidência da Redecard — durante 60 dias, Medeiros trabalhou num sistema de cogestão com seu sucessor, o contador Claudio Yamaguti, cuja carreira foi construída no Unibanco.

O comando da Redecard troca de mãos às vésperas da divulgação de resultados ainda piores. De acordo com seis analistas consultados por EXAME, a receita da companhia no primeiro trimestre deste ano (cuja divulgação estava prevista para o dia 28 de abril) será cerca de 3% menor e o lucro poderá cair até 12% em relação ao mesmo período do ano anterior.

Caberá a Yamaguti, um executivo de 60 anos de idade — 36 deles atuando no segmento de cartões de crédito —, conter as perdas. Até ser destacado para a presidência da Redecard, Yamaguti ocupava a presidência do Itaú no Paraguai e a vice-presidência da processadora de cartões paraguaia Bancard, que tem o Itaú entre seus principais acionistas.

“Ao longo deste ano, a Redecard fo­­cará em revisão de processos, eficiência operacional e redução de custos a fim de, em 2012, recuperar as margens”, afirmou Yamaguti a EXAME, em entrevista por e-mail.


Corte de custos

Yamaguti encontrará uma empresa que passou por alterações drásticas nos últimos dois anos. Ex-presidente da Telefonica Empresas, seu antecessor, Medeiros, promoveu uma mudança completa na diretoria da Redecard logo depois de assumir o comando, em 2008 — trocou cinco de seis diretores.

Num esforço para cortar custos e se preparar para o novo ambiente de concorrência que se aproximava, Medeiros fechou os 24 escritórios regionais da companhia. No processo, 75 profissionais foram demitidos e os demais passaram a trabalhar no sistema de home office, que permanece até hoje.

Segundo Medeiros, a medida foi importante para permitir a contratação de 662 funcionários ao longo de 2010, elevando o quadro para os atuais 1 455. A mudança, porém, teve um efeito colateral. “A nova estrutura fragilizou a presença regional”, diz um executivo próximo à companhia.

A concorrente Cielo, por exemplo, manteve seus 30 escritórios regionais. Nenhuma medida, porém, teve tanto efeito sobre o resultado da Redecard quanto a guerra de preços iniciada por ela própria logo após o fim da exclusividade. “Para manter seus grandes clientes, responsáveis por 60% da carteira, a empresa reduziu as taxas cobradas”, diz Daniel Malheiros, analista da corretora Spinelli.

Em 2009, a taxa média tanto da Cielo quanto da Redecard era de 1,24% do valor total das transações. No último trimestre de 2010, o índice cobrado pela Cielo havia caído para 1,10%, e o da Redecard, para 1,02% — uma diferença que pode parecer pequena, mas que se torna relevante quando multiplicada por milhões de transações.

À medida que os resultados pioravam, o relacionamento entre os acionistas e Medeiros também deteriorava. Um dos primeiros pontos de atrito aconteceu na véspera do Natal de 2009, após uma falha no sistema de processamento da Redecard — entre 12 e 16 horas o sistema parou de funcionar.

Na ocasião, o executivo estava de férias em Nova York. “Ele não voltou para o Brasil de imediato, o que não foi bem visto pelos acionistas”, diz um executivo do setor. Ironicamente, na época a Redecard fazia uma campanha no programa do Faustão, exibido pela TV Globo, em que ele dizia que a companhia tinha “a maquininha que nunca para”.

Daqui para a frente a concorrência que a Redecard vai enfrentar só deve aumentar. A americana Elavon, uma das maiores credenciadoras do mundo, e o Citibank anunciaram uma parceria para atuar no país a partir do segundo semestre.

O Santander e a gaúcha GetNet, associados desde janeiro de 2010, têm a meta de dobrar o número de estabelecimentos atendidos até 2012. Os resultados mais fracos fizeram com que o valor das ações da Redecard caísse 24,5% nos últimos 12 meses. “Esperamos que a partir do segundo semestre os descontos diminuam e as margens sejam recuperadas”, diz Marianna Waltz, gerente de análise do Banco do Brasil. Os investidores da Redecard certamente esperam o mesmo.

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