Revista Exame

O hambúrguer é só um detalhe no McDonald's

O McDonald’s tem um desafio: convencer o consumidor brasileiro de que sua especialidade são alimentos, e não sanduíches. Conseguirá?

Loja do Mcdonald's em São Paulo: 1 milhão de cafezinhos de graça para conquistar novos consumidores (Germano Lüders/EXAME.com)

Loja do Mcdonald's em São Paulo: 1 milhão de cafezinhos de graça para conquistar novos consumidores (Germano Lüders/EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 18 de fevereiro de 2011 às 11h39.

No amplo universo dos negócios, poucas empresas podem se orgulhar de ter a marca tão intimamente ligada a seu produto como o McDonald's. Maior rede de fast food do mundo, com 30 000 unidades espalhadas por 112 países e um faturamento de 22 bilhões de dólares, a empresa fundada pelo fabricante de milk shakes Ray Kroc tornou- se, ao longo de meio século de existência, sinônimo de hambúrguer - e de tudo o que está relacionado a ele. Seu logotipo - uma imensa letra "M" amarela - foi, durante muito tempo, uma espécie de emblema do capitalismo americano e do fenômeno da globalização. A onda antiobesidade que varreu os mercados desenvolvidos na última década, no entanto, deu ao McDonald's um significado muito menos lisonjeiro. Com seus sanduíches calóricos e sobremesas açucaradas, a rede passou a ser associada a tudo o que havia de errado na alimentação dos consumidores. Foi então que o McDonald's começou a incluir em seu cardápio opções mais saudáveis, como saladas e frutas. Agora, a subsidiária brasileira da rede ensaia aquele que será seu maior passo nessa estratégia. Durante o mês de setembro, a empresa distribuiu gratuitamente 1 milhão de cafés nos balcões de suas lanchonetes para promover sua mais nova "iguaria": um cafezinho filtrado que será vendido por 1,75 real. Ao mesmo tempo, está em teste em dez lojas de Campinas, no interior de São Paulo, a venda de uma linha de smoothies, um tipo de bebida que inclui iogurte e frutas frescas. Se for aprovada, a novidade passará a fazer parte do cardápio brasileiro do McDonald's até o final do ano. "Queremos criar uma nova experiência gastronômica", diz o argentino Marcelo Rabach, presidente do McDonald's no Brasil, sem revelar a previsão de venda para os novos produtos. "Não vendemos apenas hambúrguer e batata frita. Nossa meta é sermos reconhecidos como uma empresa de alimentos."

Uma rápida análise do mercado de fast food no Brasil dá ideia do que está por trás dessa mudança de atitude. Segundo dados da consultoria paulista ECD, embora as vendas das empresas especializadas em sanduíches representem 70% do setor - que movimenta no total quase 10 bilhões de reais por ano -, essas redes estão entre as que apresentam a menor taxa de crescimento - em média, 5% ao ano. As cafeterias, por sua vez, avançaram em 2009 quase o dobro desse índice. E há espaço de sobra para crescer. Estima-se que apenas 20% dos brasileiros tenham o hábito de fazer mais de uma refeição por dia fora de casa - nos Estados Unidos, esse número chega a 50%. "O setor de cafeterias é dominado pelas padarias de bairro", diz Enzo Donna, diretor da ECD. "As redes especializadas nesse tipo de serviço, como a americana Starbucks, ainda têm presença tímida no Brasil." Pelos cálculos de Donna, o segmento de cafeterias deve crescer 12% ao ano até 2015, o dobro do esperado para o setor de sanduíches.

A concorrência avança

Como tem sido regra no setor de bens de consumo, o McDonald's cresce vigorosamente no Brasil. Mas a velocidade de sua expansão cai à medida que os concorrentes avançam. Em 2009, o faturamento da subsidiária avançou 5%, alcançando 3,5 bilhões de reais. No mesmo período, o Burger King cresceu aproximadamente 20%. É bem verdade que essa expansão se deu sobre uma base muito menor. O McDonald's conta com 580 lojas no Brasil, cinco vezes mais que o Burger King. Mas, mesmo no quesito vendas em lojas abertas há mais de um ano, o desempenho do McDonald's foi inferior ao da concorrente. Entre 2008 e 2009, a receita nas mesmas unidades cresceu 3% - um quinto do verificado pelo Burger King. A velocidade é menor também no ritmo de abertura de lanchonetes. De janeiro a setembro deste ano, o McDonald's inaugurou 12 novos pontos; o Burger King, 25 e a cadeia americana Subway, outros 130. "É aí que entra o atual reforço no cardápio", diz Marcus Rizzo, consultor especializado em franquias. "Com cafés e smoothies, o McDonald's espera atrair para as lanchonetes consumidores fora do tradicional horário de almoço, aumentando a receita sem precisar expandir substancialmente seus pontos de venda."

Embora em tese a estratégia faça sentido, é cedo para saber em que medida ela vai pegar por aqui. A rede de cafeterias McCafé, lançada em agosto de 2000 para vender produtos como cappuccinos e pães de queijo, até hoje não deslanchou. Com apenas 60 lojas, a divisão responde por menos de 2% do faturamento do McDonald's no país. "Trata-se de um investimento muito alto para vender itens de margens tão reduzidas", diz um executivo próximo ao McDonald's. O café da manhã oferecido nos balcões das lanchonetes desde fevereiro de 2008 também ainda não se provou um sucesso. Apesar de ser oferecidas em 400 das 580 lojas da rede, essas refeições respondem por 5% do faturamento - um quarto do registrado nas unidades americanas. Vale ressaltar que a introdução de novos produtos no cardápio não é uma dificuldade exclusivamente brasileira. Mesmo na matriz, o McDonald's já teve algumas experiências amargas ao enveredar por outros mercados - as principais foram a McPizza, a McPasta e o McHot Dog. "Nesse setor, assim como em vários outros, ganha quem conseguir imaginar o que as pessoas consumirão daqui a dez anos", diz Rivadávia Alvarenga, professor de estratégia empresarial da Fundação Dom Cabral. Para o McDonald's, as refeições do consumidor do futuro terão cada vez menos hambúrgueres.

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