Revista Exame

O dinheiro pode esperar, diz Zuckerberg

Para o criador do Facebook, o crescimento da base de usuários ainda é mais importante do que a busca de receitas

Zuckerberg: o Google é acadêmico, o Facebook é prático (Justin Sullivan/Getty Images)

Zuckerberg: o Google é acadêmico, o Facebook é prático (Justin Sullivan/Getty Images)

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Da Redação

Publicado em 8 de abril de 2011 às 18h02.

"Yeah.” Quando o jovem americano Mark Zuckerberg diz “yeah”, quem está conversando com ele sabe que o corpo pode estar ali, mas a cabeça está longe, muito longe. Primeiro risco de uma entrevista com Zuckerberg: ouvir um “yeah”. Segundo risco: não conseguir extrair nada além de platitudes. Para quem criou e é dono de uma empresa social, Zuckerberg tem uma notável ausência de carisma. Já virou clichê descrevê-lo como um robô, mas é difícil não cair nessa tentação.

Por tudo isso, foi uma agradável surpresa conversar com Zuckerberg. Ele recebeu EXAME em sua sala, um aquário no meio do prédio onde ficam os engenheiros do Facebook. Zuckerberg, dono de uma fortuna estimada pela revista Forbes em 6,9 bilhões de dólares, vestia calça jeans, camiseta verde e tênis de corrida e passou boa parte do tempo com um pé na mesa de centro. Zuckerberg parece estar cada vez mais à vontade no papel de presidente de empresa — mas um presidente que ainda não está tão preocupado com as receitas. Falou da ambição de conectar todas as pessoas do mundo e comparou a cultura hacker do Facebook com o “academicismo” do Google. Veja a seguir os principais trechos da entrevista.

EXAME - Você diz que essa onda social da internet vai mudar muitos negócios. O que isso significa?

Mark Zuckerberg - Você pode usar o iTunes para ouvir música, o Flick para fotos. Mas o que importa mesmo são as fotos de seus amigos. Você quer saber que músicas eles estão ouvindo. Existe um serviço chamado Spotify, muito popular na Europa, com cerca de 10 milhões de pessoas. Você consegue, pelo Facebook, saber o que seus amigos estão escutando. Às vezes isso é mais interessante que as próprias músicas. Tudo o que está relacionado com as pessoas à sua volta é muito mais interessante. Talvez duas, três, dez vezes mais interessante. Os produtos e serviços que forem recriados com isso em mente serão muito mais atraentes. Vai acontecer com a música. Vai acontecer com a TV. Vai acontecer com as notícias, com o comércio eletrônico. Vai levar algum tempo, mas vai acontecer. 

EXAME - Haverá rupturas? As empresas que hoje são dominantes serão ultrapassadas por negócios sociais?

Mark Zuckerberg - Será interessante observar. Líderes não gostam de mudanças no jogo que estão ganhando. As empresas dominantes não costumam ser as grandes inovadoras. Isso aconteceu no caso dos games, por exemplo. A Electroic Arts (uma das maiores produtoras de jogos do mundo) ficou para trás e agora comprou a Playfish (uma das empresas líderes em jogos sociais).

EXAME - Quanto mais gente se cadastra no Facebook, maior o incentivo para que quem não esteja lá dentro entre também. É o efeito de rede. O Facebook vai ser uma espécie de monopólio natural das conexões entre as pessoas na internet?

Mark Zuckerberg - A história mostra que você só ganha se tem o melhor produto. Se esse efeito de rede fosse tão poderoso assim, o MySpace teria vencido. Eles tinham 100 milhões de usuários, nós tínhamos apenas 10 milhões. Se houver um produto melhor, as pessoas vão migrar.

EXAME - O Facebook não vai ficar poderoso demais? Não vai despertar a atenção dos governos, por exemplo?

Mark Zuckerberg - Quem controla as informações é o usuário. Se você colocar uma foto no site, você decide quem vai ver, por exemplo.


EXAME - Quando vocês vão chegar a 1 bilhão de usuários?

Mark Zuckerberg - Está longe…

EXAME - Mas o Facebook praticamente dobra de tamanho a cada ano.

Mark Zuckerberg - Bem, digo que estamos crescendo bem rápido (risos).

EXAME - Você ainda está mais interessado em crescimento do que em receitas?

Mark Zuckerberg - Quero criar o melhor produto possível. Às vezes, as empresas se preocupam com o dinheiro cedo demais e isso significa sacrificar a visão de longo prazo. Quero garantir que não vamos cometer esse erro. A publicidade vai bem. Mas o que vai determinar se este foi um ano bom não é ganhar X milhões de dólares: é saber que nossos usuários estão felizes, que estamos fazendo um bom trabalho.

EXAME - E os planos de abrir o capital?

Mark Zuckerberg - Quando fizer sentido vamos fazê-lo. Muitas empresas encaram a abertura de capital como um fim em si mesmo. Foi assim nos anos 90. Aquelas companhias só tinham o objetivo de ir para a bolsa. Abrir o capital é um passo na evolução da empresa e tem de vir na hora certa.

EXAME - Quem são as pessoas que você contrata para o Facebook?

Mark Zuckerberg - Gente inteligente e diversa. Muita gente monta equipes para pensar de maneira uniforme. Eu não quero isso. Quero gente comprometida com um mundo mais aberto e conectado, que é nossa missão. Mas também quero opiniões e perspectivas diferentes.

EXAME - Você busca excelência acadêmica, diplomas das melhores universidades?

Mark Zuckerberg - Ninguém precisa ser formado nas melhores universidades. Eu não sou (risos). Nossa cultura tem muito pragmatismo. Gostamos de falar de uma cultura hacker, no bom sentido: ser agressivo, fazer as coisas acontecerem. É isso o que buscamos no Facebook: ser rápidos e práticos. É muito diferente do Google, por exemplo. Eles se preocupam com as notas que você teve, se estudou numa escola de prestígio. Quando pergunto para as pessoas daqui que vieram do Google qual é a diferença entre as duas empresas, eles dizem que as coisas são mais diretas no Facebook. Fazemos as coisas da maneira mais simples possível. A cultura deles (Google) celebra esse lado acadêmico, complicado. Muita gente gosta desse tipo de ambiente, que lembra a universidade. Aqui somos mais objetivos.


EXAME - Como você avalia o mercado brasileiro?

Mark Zuckerberg - No Brasil, o crescimento tem sido enorme. O número de usuários do Facebook quadruplicou no último ano. Sabemos que, em geral, os usuários começam se conectando com gente de fora do país. São pessoas que eles conheceram em uma viagem ou quando estavam estudando fora. A partir de certo momento, as conexões entre pessoas dentro do próprio país ultrapassam essas ligações com o exterior. É o sinal de que a nossa rede está “pegando” no país. Isso aconteceu no começo deste ano no Brasil. Podemos não ser a maior rede social do país, mas acho que estamos no caminho. As pessoas podem estar em outra rede porque os amigos estão lá, mas com o tempo isso vai mudar.

EXAME - Você disse que já cometeu muitos erros e que provavelmente vai continuar errando no futuro. E quais foram seus acertos?

Mark Zuckerberg - O principal é perceber que as pessoas querem se conectar e ter informações sobre quem é importante em sua vida. Eu poderia simplesmente encher o site de anúncios ou vender a empresa. Mas isso não valeria a pena. Acho que temos muito valor, provavelmente mais do que as pessoas se dão conta.

EXAME - Como assim?

Mark Zuckerberg - Muita gente ainda não entende o real valor das conexões e da troca de informações. Esse pessoal em geral diz: “É muito arriscado. Não vale a pena”. Pelo contrário. Daqui a cinco, dez anos, vamos olhar para trás e perceber que, na verdade, compartilhávamos pouca coisa. Esse foi meu maior acerto: entender o valor desse compartilhamento.
 

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