M.S. Krishnan, da Universidade de Michigan: toda indústria está se tornando um negócio de tecnologia (CK Prahalad Initiative/Divulgação)
Editora-assistente de Marketing e Projetos Especiais
Publicado em 12 de dezembro de 2023 às 06h00.
Última atualização em 18 de dezembro de 2023 às 11h00.
Em 2008, M.S. Krishnan e C.K. Prahalad, professores da Escola de Negócios Ross, da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, publicaram o livro A Nova Era da Inovação. Nele, previram que tecnologias avançadas transformariam todos os negócios em todas as indústrias. Em 2017, o livro foi atualizado e listado como um clássico de negócios pela editora McGraw-Hill. M.S. Krishnan, que também é consultor de tecnologia e estratégia para grandes empresas, como Ford, IBM, Unilever, Siemens e Nestlé, conta como a tecnologia está no cerne da inovação, elenca desafios e mostra de que forma o mundo interconectado pode ajudar empresas a se relacionarem com clientes e impulsionar os negócios.
→ As empresas realmente levam a tecnologia em consideração em suas estratégias?
Há 20 anos, estratégia era vista apenas como estratégia. Você tentava implementar e olhava para a tecnologia como uma ferramenta que se alinharia a ela. As coisas mudaram. Agora, a tecnologia impulsiona a estratégia. Isso significa que as decisões são diretamente alimentadas pela tecnologia. Por isso, é importante entender bem as capacidades tecnológicas, como elas estão impactando os negócios e seus ecossistemas.
→ Mas todas as empresas estão preparadas?
Sim e não. Acontece que isso não é uma opção, é obrigatório. Se a empresa não levar a tecnologia a sério como parte de sua estratégia, talvez ela não sobreviva; afinal, toda indústria está se tornando um negócio de tecnologia.
→ Como empresas inovadoras usam a tecnologia para se destacar dos concorrentes?
A estrutura dos modelos de negócios está mudando em todas as indústrias. Antes, entendíamos modelos de negócios como manufatura ou serviço. Devido às mudanças tecnológicas fundamentais, a estrutura dos modelos de negócios passará da oferta de produtos ou serviços para o que chamamos de “N=1”, onde “N” é o tamanho da amostra de “1”, que significa custo. Ou seja, as empresas criarão uma experiência personalizada para um cliente de cada vez, e outras experiências serão moldadas pelo produto e pelo software utilizado. Assim, cada produto se torna inteligente porque há tecnologia embutida.
→ Você tem algum exemplo de empresa que use TI em seu potencial máximo para uma transformação digital efetiva?
As pessoas ficariam surpresas ao entender quanto a Domino’s Pizza pensa e usa tecnologia. Eles utilizam um rastreador de pizza que coleta informações em tempo real sobre os pedidos dos clientes e até mesmo detalhes sobre suas preferências. Ele atua como uma plataforma que fornece informações valiosas sobre o cliente, operações internas, logística e entrega. Agora estão até experimentando algoritmos de visão computacional para verificar automaticamente a qualidade da pizza — eles têm câmeras que “olham” para a pizza e verificam a correção e a qualidade das coberturas que foram pedidas. E é uma pizzaria! Um exemplo clássico de como você pode transformar uma organização com tecnologia. Conforme avançamos, os investimentos em IA e learning machine se tornam essenciais para trazer mais inteligência às diversas maneiras de entregar pizza, conectar-se com os clientes e expandir-se globalmente, ao mesmo tempo proporcionando a melhor qualidade dos produtos.
→ O que as empresas que ainda não chegaram lá estão fazendo de errado?
Todo mundo entende que tecnologia é importante e faz parte da estratégia. Mas há uma grande lacuna na execução: algumas empresas se saem bem, enquanto outras lutam. Uma das razões é a desconexão entre negócio e tecnologia. Por um lado, a tecnologia está fora da zona de conforto de executivos líderes de várias áreas, como estratégia, marketing, operações etc. Por outro, os líderes de tecnologia [CIOs e CTOs], muitas vezes, são formados no escopo da tecnologia, mas não são expostos às questões e aos desafios dos negócios. Há uma lacuna em entender como ela é usada para ajudar a inovar os modelos de negócios e criar valor para clientes. Os CIOs não estão totalmente cientes de como competir, conhecer e entender os desafios de negócios.
→ Há algum outro fator que contribua para isso?
Sim. As organizações e os CIOs subestimam a complexidade da mudança que está ocorrendo nos negócios. E nenhuma mudança pode ser implementada sem uma transformação tecnológica. Há muita intenção, as pessoas querem mudar e são energéticas, estão correndo atrás, mas se cansam por causa da complexidade da mudança que envolve a tecnologia. Essa é uma das razões pelas quais a sigla CIO é vista, de uma maneira muito humorística, como fim de carreira. O ciclo de vida de um CIO não é muito longo, porque há muita pressão nesse cargo, especialmente quando o negócio quer mudar e a tecnologia não pode mudar tão rapidamente, levando a organização a muitos desafios.
→ Como os CIOs podem contornar esses problemas?
Em primeiro lugar, eles devem entender profundamente o negócio em que atuam, o valor que estão criando e por que os clientes estão abrindo suas carteiras e pagando, seja B2B, seja B2C. Eles precisam entender como a tecnologia permite a criação de valor e quais são as oportunidades futuras que a tecnologia pode contribuir. E, ao mesmo tempo, entender como a empresa está competindo — com base em eficiência ou em diferenciação para espelhar isso nas capacidades tecnológicas que estão sendo introduzidas de forma conectada. E, então, arquitetar o tipo de tecnologia para servir efetivamente ao negócio de forma eficaz.
→ Que outras dicas o senhor daria para os novos CIOs?
Eles precisam pensar em como podem trabalhar com os Chief Marketing Officers [CMOs]. Entender as necessidades do cliente, de que tipo de tecnologia eles precisam, como fazer a entrega de uma experiência individual de forma eficiente e com menor custo. Também precisam trabalhar com o Chief Operating Officer [COO] para entender como arquitetar fornecedores. Que parceiros trazer para ter operações eficientes na entrega da personalização dos clientes, como organizar a arquitetura tecnológica para entregar essa demanda. A tecnologia não está apenas no escritório do CIO, e sim em operações, marketing e em todas as funções, por isso os CIOs precisam entender como trabalhar em conjunto com esses Chief Experience Officers [CXOs].
→ Uma pesquisa da McKinsey previu a perda de até 50% dos empregos no Brasil devido à rápida adoção de tecnologias como IA e automação. Como engajar funcionários quando a tecnologia causa medo?
É um ponto muito relevante e desafiador, mas também uma oportunidade para bons líderes surgirem. Por um lado, eles precisam cuidar da equipe. Com a IA generativa e todas essas tecnologias, há muito receio de que empregos sejam perdidos. Certamente haverá perdas, mas, ao mesmo tempo, novos empregos serão criados. Portanto, como líder, é responsabilidade do CIO garantir que toda a organização seja de aprendizado, motivando as pessoas a investirem em si mesmas, a aprender sobre novas tendências e tecnologias. A tecnologia não substituirá pessoas, mas poderá substituir funções específicas. A mensagem para os funcionários deve ser como construir as habilidades para se destacar nos novos papéis que estão surgindo.
→ Há algum risco em dar protagonismo à tecnologia na estratégia das empresas?
À medida que a tecnologia permeia todos os aspectos do negócio e se torna estratégica para as empresas competirem, há tanto questões positivas quanto negativas. Por um lado, a tecnologia impulsiona a inovação, transformando a indústria. Mas a tecnologia também traz muitos riscos, como o de ataques cibernéticos. Além disso, ao nos movermos em direção a decisões baseadas em dados e personalização, a privacidade da informação e dos dados do cliente torna-se muito importante. Assim, é crucial pensar no papel do CIO, do CTO e, em muitos casos, em novas funções, como o Chief Information Security Officer, que lida com segurança da informação. As empresas precisam pensar estrategicamente onde essas responsabilidades residem e como coordená-las.