Revista Exame

O capital é um cão medroso

O Brasil se tornou arriscado para os investidores. As empresas continuam ansiosas por crescer no país, mas é preciso devolver a elas a confiança no nosso futuro


	Obra da usina de Jirau, em Rondônia: há dinheiro para a infraestrutura — e o Brasil tem tudo para atraí-lo
 (Cristiano Mariz/EXAME.com)

Obra da usina de Jirau, em Rondônia: há dinheiro para a infraestrutura — e o Brasil tem tudo para atraí-lo (Cristiano Mariz/EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 11 de março de 2013 às 06h00.

São Paulo - Para o economista americano Arthur Laffer, o capital é como um cão. Se você bater nele, não o terá a seu lado. Um cão assustado, quando não ataca, foge. Mas, se você o alimentar, ele se manterá próximo. Laffer não está nas paradas de sucesso dos economistas da atualidade. É um autêntico liberal, foi um dos principais assessores de Ronald Reagan na Casa Branca e, há quase 40 anos, desenhou num guardanapo a hoje famosa Curva de Laffer, uma simples linha que explica o que a gula tributária dos governos pode fazer com a arrecadação.

Pode-se simpatizar ou não com a figura e as ideias de Arthur Laffer. Difícil é discordar da obviedade de sua metáfora cão-capital. O capitalista — um termo que, nos últimos anos, ganhou contornos quase demoníacos — é um animal assustadiço. A imprevisibilidade nas regras do jogo é seu maior fantasma. Ao menor sinal dela, paralisa. O capitalista não joga para perder nem para empatar. Só assume riscos quando enxerga chance de ganhar. Quem quiser conviver com o sistema (o melhor entre os piores), que entenda e aceite isso.

É chato admitir, mas, neste início de 2013, boa parte dos empresários e executivos brasileiros vem se comportando como o cão ressabiado da metáfora de Laffer. De 2010, o ano da euforia nos mercados, para cá, quase nada mudou no cenário de oportunidades futuras representado pelo Brasil. Ainda somos um mercado consumidor respeitável.

Há, pelo menos, 15 milhões de brasileiros que podem pular da base da pirâmide econômica para a classe média. Nosso potencial agrícola continua a ser o maior do mundo. As reservas minerais não desapareceram de nosso subsolo e o bônus demográfico vai se materializar a despeito de qualquer crise interna ou externa.

O que mudou — muito e com uma velocidade espantosa — foi a confiança dos investidores e empreendedores nas regras do jogo e na própria manutenção da estabilidade. O rosário de dúvidas parece crescer a cada dia. Para onde vai a inflação? E os juros? Dá para acreditar nas previsões de comportamento do PIB? As regras que valem para meu concorrente se aplicam a mim? A mão do governo pode determinar os rumos de meu negócio? 

É muita pergunta sem resposta. É muita ameaça para um bicho medroso como o capital. A atual hiperatividade da economia brasileira — com seu excesso de notícias, declarações e manchetes de jornal — vem provocando justamente aquilo que se propõe a evitar: uma indisposição quase crônica para investir em um mercado com quase tudo para ser feito.

É um tremendo desperdício. Uma pesquisa da Pricewater­houseCoopers, realizada com presidentes de empresas que participaram do último World Economic Forum, em Davos, na Suíça, mostra que o Brasil é um dos três países com maior perspectiva de crescimento para os negócios nos próximos anos — atrás apenas de China e Estados Unidos. O país é, hoje, um dos maiores canteiros de obras de infraestrutura por fazer do mundo. Há muito dinheiro disponível para ser colocado em grandes projetos de longo prazo. Mas os investidores andam mais desconfiados do que de costume.

Tal como acontece com um cão que foi duramente castigado por seu dono, empresários e investidores em geral precisarão ser reconquistados pela economia brasileira. Trata-se de um processo que leva algum tempo, exige disciplina e consistência e não permite recaídas. As empresas em geral, as brasileiras e as multinacionais, estão ansiosas por crescer.

Nenhum homem de negócios que se preze fica feliz em ver as oportunidades se dissolver. Tire-o da coleira da incerteza, alimente-o com algum otimismo em relação ao futuro, garanta que ele não será castigado pela mudança abrupta das regras, e seu instinto de transformar riqueza em mais riqueza aflorará. E os investimentos, tão necessários ao crescimento sustentável do Brasil, inexoravelmente aparecerão.

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