Revista Exame

"O Brasil bateu na parede", diz Larry Flink, da BlackRock

Para Larry Fink, presidente da americana BlackRock, maior gestora de recursos do mundo, a pergunta do momento é se o país aprendeu com os erros do passado

Larry Fink, presidente da Blackrock: “Os países são como crianças. Precisam cair para aprender a levantar” (Germano Lüders/Exame)

Larry Fink, presidente da Blackrock: “Os países são como crianças. Precisam cair para aprender a levantar” (Germano Lüders/Exame)

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Da Redação

Publicado em 20 de março de 2015 às 06h00.

São Paulo - O americano Larry Fink, de 62 anos, é um dos homens mais poderosos de Wall Street. A BlackRock, empresa que fundou em 1988 e que tem presidido desde então, é a gestora número 1 no ranking mundial. Com mais de 4,5 trilhões de dólares sob gestão, está presente em todos os cantos. Isso permite que Fink viaje por todos os continentes falando com dirigentes de bancos centrais, ministros e presidentes.

É com base nesses encontros que formula sua visão de mundo. “Não estou interessado no que vai acontecer em 12 meses. Temos pessoas na BlackRock para fazer esse serviço”, diz. Fink gosta de se concentrar nas tendências de longo prazo, como a alta do barril de petróleo e seus efeitos sobre a economia global. Para ele, a crise atual do Brasil é parte de seu processo de amadurecimento, mas ainda é cedo para dizer se o país aprendeu com os excessos do passado.

EXAME - Primeiro vimos o colapso do império de Eike Batista. Agora há o escândalo de corrupção na Petrobras, a falta de água e o risco de racionamento de eletricidade. O que os investidores estrangeiros veem quando olham para o Brasil?

Larry Fink - Os investidores veem todos esses problemas. Alguns deles, como os de Eike Batista e os da Petrobras, foram criados há cinco anos ou mais. Estão identificados e sendo discutidos agora, mas são fatos do passado. E os investidores não querem olhar para trás. Querem tentar antecipar os acontecimentos que estão por vir. Claro que para o país é positivo aceitar que fez algo errado. É importante corrigir os excessos do passado e tentar reconstruir a partir desse ponto.

EXAME - Mas hoje o Brasil não é mais alvo prioritário dos investidores?

Larry Fink - Os investidores não estão correndo para investir no Brasil. Mas acreditamos que o país tenha boas oportunidades. Talvez valha dizer que venho ao Brasil hoje com mais prazer do que vinha no passado. Há alguns anos, cheguei aqui e vi um país arrogante. Havia muita gente correndo riscos exagerados e percebi que o país estava prestes a bater na parede. E, de fato, foi isso que aconteceu. O Brasil bateu na parede.

Quando um pai vê que seu filho pequeno vai cair, o que deve fazer? Pegá-lo antes que chegue ao chão ou deixá-lo cair? Se quiser que ele aprenda com a experiência, precisa deixá-lo cair, chorar e se recuperar.

Países e governos não são diferentes. Precisam aprender com a experiência. Quando estive aqui em 2013, os líderes já estavam admitindo os excessos. De forma geral, estavam muito deprimidos. Neste ano, minha missão é tentar descobrir se o país aprendeu com o passado.

EXAME - Qual é sua impressão da nova equipe econômica?

Larry Fink - Conhecemos Joaquim Levy, o novo ministro da Fazenda. É um homem que sabe como o mundo funciona. O mesmo vale para Alexandre Tombini, presidente do Banco Central.

EXAME - Para o investidor, o Brasil ficou barato?

Larry Fink - Se o investidor achar que o problema da inflação será controlado, provavelmente chegará à conclusão de que está barato. Se o problema da inflação não puder ser controlado, o Brasil não está barato o suficiente. O país tem uma das maiores taxas de inflação do mundo. Quando a inflação aumenta mais do que o ritmo de crescimento da economia, o país não está bem.

Não podemos esquecer que os investidores estrangeiros têm escolhas. Parte deles está atenta às oportunidades no Brasil, como na área de infraestrutura. Se acreditarmos que o Brasil, descontados a inflação e os riscos associados ao país, conseguirá dar um ótimo retorno a nossos investidores, poderemos trazer grandes investimentos para cá.

EXAME - Quais países são melhores opções de investimento do que o Brasil?

Larry Fink - Há muitos países que, nos próximos 12 meses, terão um desempenho melhor. Mas o que estamos vendo são possibilidades para os próximos cinco, dez anos. No curto prazo, talvez a Europa, o Japão e os Estados Unidos sejam as melhores opções.

EXAME - Qual é o maior risco para a economia mundial atualmente?

Larry Fink - Não existe um único grande risco. Há sempre várias coisas acontecendo ao mesmo tempo. É algo muito dinâmico. Na minha visão, estamos num mar turbulento sempre tentando estabilizar o barco. Uma hora a onda vem de um lado.

No momento seguinte, ela vem de outro. Vivemos em um mundo em que as pessoas estão sempre conectadas, em que pessoas que têm muito pouco podem ver as que têm muito, onde há governos se comportando de forma ruim, como o da Grécia. Um mundo onde pouco tempo atrás ninguém fazia a menor ideia de que o preço do petróleo cairia para menos de 50 dólares o barril.

EXAME - O senhor acha que a queda do preço do petróleo é positiva?

Larry Fink - O que está acontecendo beneficia vários países. Raghuram Rajan, presidente do Banco Central da Índia, disse recentemente que a mudança no mercado de petróleo deve ter um impacto positivo de 1,5 ponto percen­tual no produto interno bruto indiano. Para os consumidores americanos, a queda também é positiva.

EXAME - Por que ninguém previu que o preço do barril estava prestes a despencar?

Larry Fink - Pela primeira vez em nossa vida, estamos vendo um choque de oferta do petróleo. E isso é consequência de novas tecnologias, como o fraturamento hidráulico (no qual grande quantidade de água misturada com areia e outras substâncias é injetada sob alta pressão em poços para a extração de petróleo e gás).

Com as novas tecnologias, acrescentamos mais de 1,8 milhão de barris ao dia. Isso tudo num momento em que o aumento da demanda era de apenas 800 000 barris e a economia mundial estava desacelerando. No ano passado, tivemos problemas na Ucrânia e na Líbia e os ataques do grupo extremista Isis.

Com acontecimentos desse tipo, o preço do petróleo costumava subir. No entanto, por causa da alta da oferta, isso acabou não acontecendo. No segundo semestre, quando o FMI reduziu a previsão de crescimento global, o petróleo entrou em colapso.

EXAME - Parte dos analistas prevê que muitos produtores vão parar de operar porque o valor do barril está muito baixo e que, com o tempo, a demanda voltará a puxar o preço para cima. O senhor concorda?

Larry Fink - Isso pode estar certo numa perspectiva de longo prazo. Mas acredito que o preço do barril irá se estabilizar em 70 dólares, talvez 75, por um bom tempo. É sempre bom lembrar que o México está começando a reformar seu setor de energia. Em dez anos, deve acrescentar ao mercado de 1 milhão a 2 milhões de barris por dia.

Antes disso, somente Estados Unidos e Canadá deverão aumentar a oferta em mais 1 milhão de barris. Tudo vai ocorrer num momento em que a nova geração, preocupada com o meio ambiente, comprará cada vez mais carros elétricos. Isso sem falar no impacto da economia colaborativa e de seus aplicativos, como o Uber, que permite chamar táxi e limusine pelo celular.

EXAME - Se a economia colaborativa de fato avançar rapidamente, há quem preveja um futuro com baixo crescimento econômico, uma vez que as pessoas terão menos incentivos para comprar carros e outros bens. O que o senhor acha?

Larry Fink - O americano médio usa seu carro 5% do tempo, precisa encarar a desvalorização do bem e os custos de manutenção. Portanto, a pergunta sobre se vale a pena comprar um automóvel é totalmente pertinente.

As pessoas estão mudando seus hábitos de consumo. Essa nova postura irá frear o crescimento econômico? Não necessariamente. Quem não gastar com um carro pode antecipar a compra de sua casa ou investir na educação dos filhos.

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