Revista Exame

Navegando na incerteza: gestores apontam as melhores opções de investimento em 2025

Em meio aos juros altos, renda fixa e bolsa americana se tornam as melhores opções

Publicado em 14 de fevereiro de 2025 às 06h00.

Última atualização em 14 de fevereiro de 2025 às 14h47.

De um título da Colômbia a uma ação brasileira, os juros dos Estados Unidos, em especial os Treasuries de dez anos, balizam os preços dos ativos ao redor do mundo e influenciam a tomada de decisões de investidores globais. No começo de janeiro, os investidores falavam de um primeiro corte na taxa de juro pelo Federal Reserve (o banco central americano) em julho. Dias depois, as apostas migraram para junho e chegaram, durante um breve momento, a ficar em maio — mas voltaram para junho. Diante desse cenário, o mercado americano está muito incerto, e as decisões de investimentos passam a ficar sensíveis a qualquer movimento.

Na primeira reunião de 2025, assim como precificado pelo mercado, o Federal Reserve interrompeu o ciclo de afrouxamento monetário — e, em seu comunicado, afirmou que a atividade econômica continuou a se expandir em um ritmo sólido e o mercado de trabalho segue forte. Mas, para além dos números que mostram uma economia americana mais resiliente, é sabido que os passos de Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, são acompanhados de perto. Nas entrelinhas, o documento cita que o Comitê “estaria preparado para ajustar a postura da política monetária conforme apropriado se surgirem riscos que possam impedir a obtenção das metas.”

Esses riscos, por sua vez, são relacionados às tarifas alfandegárias. Em seu primeiro movimento mais agressivo, Trump assinou no início de fevereiro três ordens executivas para impor tarifas a três países de grande comercialização com os EUA: México, Canadá e China. Para os dois primeiros, uma alíquota de 25%. Para a China, de 10% — ainda longe dos 60% citados durante a campanha. Dias depois, suspendeu a decisão de impor tarifas pesadas sobre México e Canadá, concordando com uma pausa de 30 dias em troca de concessões na fronteira e no combate ao crime dos dois países vizinhos.

Donald Trump: empresas de tecnologia devem permanecer em alta em seu governo (Tom Brenner/Washington Post/Getty Images)

O receio dos investidores globais é que, com as tarifas, os EUA ganhem uma pressão inflacionária adicional a uma economia que já está robusta, diz William Castro Alves, estrategista-chefe da -Avenue, plataforma de investimentos internacionais. Tarifas a produtos importados forçam uma internalização da produção, o que sobe os custos — afinal, às vezes é mais vantajoso comprar o produto mais barato de outro país.

A política imigratória também é uma questão acompanhada de perto quando diz respeito à inflação. “Trump vem falando muito mais em deportação do que em anti-imigração, mas o fato é que a força de trabalho americana é cada vez mais dependente dos imigrantes, que ganham, para desempenhar a mesma função, o equivalente a 85% do que recebem os americanos”, diz Paula Zogbi, gerente de research na Nomad. Sendo assim, menos imigrantes podem gerar uma pressão nos salários.

Entretanto, segundo Castro, a questão da imigração tem preocupado menos, já que Trump deu logo nos primeiros dias direcionamentos claros do que queria. “E, apesar do alarde, não tem nada muito excepcional. Não é que o Trump assumiu e foram deportadas 2.000 pessoas. Então essa política imigratória, que poderia gerar pressão de salários, aparentemente não ocorreu”, diz Castro.

O que deixa ainda mais nebulosa a questão das tarifas é a magnitude a que chegarão os tributos contra a China. Isso porque, como bem pontuou Luis Stuhlberger, gestor da Verde Asset e um dos maiores nomes do mercado financeiro brasileiro, durante um evento para investidores no final de janeiro, o gigante asiático tem uma grande vantagem que Trump deseja: o poder de ajudar na negociação com Moscou para o fim da guerra entre Rússia e Ucrânia. De toda forma, a possível guerra comercial com Canadá e México e a ainda controversa relação com a China colaboram para uma incerteza em relação aos próximos passos do Fed.

Marília Fontes, sócia da Nord Investimentos: “Os preços atuais, tanto da bolsa quanto da renda fixa, estão extremamente atrativos” (Nord Investimentos/Divulgação)

Com a atividade forte e o temor de que a inflação volte a ser pressionada para cima com as tarifas, as apostas do mercado sugerem que o ano termine com, no máximo, dois cortes de 0,25 ponto percentual (p.p.). Juros fortes nos Estados Unidos atraem o capital global para o país, o que fortalece o dólar, ao mesmo tempo que beneficia as bolsas americanas. “Vamos ter de nos acostumar com os juros americanos mais altos do que vimos nas décadas passadas. Os juros reais estão em torno de 2%, o que é bastante alto para os EUA”, diz Marília Fontes, sócia da Nord Investimentos.

Apesar de taxas de juro altas encarecerem o custo do dinheiro e prejudicarem empresas alavancadas ou setores que dependem mais de crédito, elas não têm afetado fortemente as bolsas, que registraram recorde atrás de recorde em 2024 — isso porque o crescimento pujante dos EUA beneficia as empresas.

Para 2025, é esperado que as bolsas americanas continuem subindo, puxadas ainda pelas empresas de tecnologia, do setor produtivo, como energia e utilities, e pelo setor financeiro. Este último deve se beneficiar da desregulamentação do mercado de capitais, prometida pelo presidente americano. “Além do otimismo que já vinha impulsionando a bolsa americana, a vitória de Trump trouxe um novo fator para o mercado. Sua postura de governar com foco no crescimento doméstico gera confiança no mundo corporativo”, diz João Piccioni, CIO da Empiricus Gestão. Segundo a gestora, em um cenário otimista, o S&P 500 pode alcançar 7.100 pontos, com espaço para crescimento dos lucros. Atualmente, o índice americano está em 6.061 pontos. A expectativa é que o lucro das empresas que compõem o S&P 500 deve crescer de 10% a 15%.

Entre os setores, as big techs devem seguir em alta. As chamadas “sete magníficas” passaram por um boom em seus valores de mercado e preços dos papéis em 2024. A exemplo, a Nvidia (NVDA) ganhou 356,77 milhões de dólares (2,129 bilhões de reais) em valor de mercado do dia 22 de janeiro de 2024 a 2025. Entretanto, um acontecimento estremeceu os mercados na última semana de janeiro. A startup chinesa DeepSeek desenvolveu um modelo de inteligência artificial (IA) de mesmo nome que se assemelha aos parâmetros do ChatGPT, da OpenAI, mas com um detalhe: custou uma fração do valor que outras IAs demandaram para ser desenvolvidas, em torno de 5%, num valor próximo a 5,6 milhões de dólares.

China: investidores acompanham possível guerra comercial com os Estados Unidos (Mateus Bonomi/Anadolu/Getty Images)

Após o anúncio da atualização da IA, houve uma liquidação global das big techs, principalmente da Nvidia, o gigante de semicondutores que desenvolve chips de ponta para IA. “O que a DeepSeek trouxe é que você consegue entregar resultado com menos investimento, não é necessário tanta geração de energia para resfriar data center, não precisa de tanto chip da Nvidia, então talvez você não tenha de investir 500 bilhões de dólares para desenvolver IA, como prometido no projeto Stargate de Trump”, afirma Castro. Naquele dia fatídico, só a Nvidia perdeu cerca de 600 bilhões de dólares em valor de mercado — apesar de ter recuperado parte no dia seguinte. O susto foi grande, e as especulações sobre a DeepSeek ter colocado em xeque a hegemonia americana no setor de tecnologia continuam, mas os especialistas dizem que as big techs ainda são uma boa tese de investimento, principalmente no longo prazo.

Apesar da nova tecnologia ter usado chips de gerações anteriores para desenvolver algo similar ao que já existe, os especialistas explicam que as grandes empresas, que “não levam desaforo para casa com tamanhos valuations”, querem ir além da produtividade com a IA e, para isso, precisam de chips e tecnologias mais sofisticados. “Não deixamos de ver sinais de que cada vez mais indústrias vão precisar desses chips poderosos do ponto de vista da tecnologia”, afirma Zogbi. E, para além da IA, Castro cita os setores de saúde e imobiliário como destaques para investir fora do Brasil. “Farmacêuticas, empresas de diagnósticos e de planos de saúde tinham sofrido -bastante. O S&P estava na máxima, e várias delas, não. Agora podem ser uma alternativa interessante dentro do grande espectro de saúde. E existe um espaço de expansão de lucro dessas empresas. Muitas já estão investindo em novas drogas, novas terapias”, pontua Castro.

Somada à renda variável, a renda fixa nos Estados Unidos é outra opção de investimento — afinal, há bonds pagando até 7% ao ano em dólar, com um risco de EUA extremamente baixo.

No Brasil, a renda fixa é o melhor caminho para investir. Marília Fontes, da Nord Investimentos, não recomenda investir via fundos de investimento. Justamente por causa da marcação ao mercado. Investir em renda fixa de forma direta é o melhor caminho, além de mais barato, por não pagar taxa de administração e outros custos. “Quem investe em títulos do Tesouro Direto e os mantém até o vencimento garante um retorno. No cenário atual, eu não optaria por renda fixa via fundos.”

O Brasil entra no contexto mundial de saída de investimentos. No ano passado, o investidor estrangeiro retirou da bolsa brasileira cerca de 24 bilhões de reais, segundo dados da consultoria Elos Ayta. Foi a maior fuga de capital internacional da bolsa desde 2016.

O que tem assustado o investidor é o risco fiscal. Desde novembro do ano passado, com a apresentação do pacote fiscal pela equipe econômica do governo Lula, as expectativas continuam desancoradas. Os investidores aguardavam medidas de cortes fiscais e, ao contrário disso, veio a proposta de isentar quem ganha até 5.000 reais do imposto de renda — o que causaria uma renúncia fiscal. De lá para cá, o real desvalorizou em níveis históricos, com o dólar chegando à cotação recorde dos 6,27 reais no fechamento do dia 18 de dezembro, além dos juros futuros terem disparado e alcançarem os maiores níveis já registrados, acima dos 16% no dia 19 de dezembro. “Os investidores internos estão com muito medo da dívida, por isso as taxas de juro foram para patamares tão altos e a bolsa também está tão descontada”, diz Marília Fontes. Piora mais a questão da proximidade com ano eleitoral, porque os governos tendem a gastar mais — e, em meio a uma situação de déficit já bastante elevado, aumentar os gastos seria acelerar a dívida pública ainda mais.

Recentemente, porém, o mercado tem lidado com sinais contraditórios. De um lado, as contas do governo ficaram dentro da meta do arcabouço. Do outro lado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou durante coletiva no dia 30 de janeiro que, se depender dele, novas medidas fiscais não serão adotadas pelo governo para cortar gastos. O resultado de tudo isso é que o cenário não está dos melhores para investir no Brasil, mas isso não significa que o investidor deva tirá-lo integralmente da carteira, pensando principalmente no longo prazo. Isto é: os preços atuais, tanto da bolsa quanto da renda fixa, estão extremamente atrativos, explica Fontes. “Se o investidor tiver a paciência de esperar o próximo ciclo, esperar passar o caos das eleições em 2026, do aumento de gastos no curto prazo, ele vai ter uma carteira que vai se valorizar bastante”, afirma.

Como boas apostas, a executiva da Nord Investimentos cita títulos com componentes prefixados, como IPCA+, justamente por esses ativos protegerem o investidor contra a inflação. Isso para o longo prazo. Para o curto prazo, pensando em um cenário de risco fiscal, o refúgio nos pós-fixados é o ideal, como o Tesouro Selic. “Neles você não vai ter marcação a mercado, vai estar protegido contra toda e qualquer oscilação, e, para investimentos de curto prazo, onde as coisas ainda podem não estar resolvidas, o pós-fixado é superindicado.”

WEG: companhia é uma das recomendações para manter na carteira defensiva (Leandro Fonseca/Exame)

E na bolsa há também oportunidades, principalmente em -empresas muito descontadas, que têm possibilidade de dobrar de valor ou mais. Entre os setores, assim como nos EUA, estão os bancos e as incorporadoras. Neste último segmento, há um movimento interessante: geralmente, quando a Selic sobe, as vendas de imóveis diminuem, mas isso não está acontecendo neste ciclo. “Estamos vendo um resultado muito bom de incorporadoras, inclusive aumentando o guidance. Só que as ações estão muito descontadas por causa desse racional de aumento de Selic”, diz Marília Fontes, da Nord Investimentos. Ou seja, o cenário para incorporadoras é que elas têm entregado lucro e receita, ao mesmo tempo que os preços estão muito baixos.

Para a Empiricus, o Ibovespa deveria estar sendo negociado próximo dos 143.000 pontos, valor que a gestora considera justo para o índice. Atualmente, o principal índice da bolsa está em 125.534 pontos.

No entanto, a taxa de juro elevada tem sido um fator de pressão sobre a bolsa. Ou seja, a bolsa está descontada diante do seu valor real. Para investir na bolsa neste momento, a orientação é ter uma abordagem seletiva, visando empresas que entregaram bons resultados em 2024, tiveram bom desempenho na bolsa e têm vantagens competitivas em relação aos pares internacionais.

“Dois exemplos são Embraer e WEG”, diz Piccioni, da Empiricus. A primeira está bem posicionada na competição global com Boeing e Airbus. Além disso, tem uma forte presença nos mercados americano e europeu. Já a WEG possui forte presença local e internacional e se beneficia do impulso da inteligência artificial e da transição energética. O especialista destaca que o setor de tecnologia passou por um ajuste recente, mas algumas empresas sofreram uma correção excessiva. Um exemplo é o Mercado Livre, que, embora não seja uma empresa brasileira, tem grande exposição ao mercado nacional e segue com um modelo de negócios muito forte.

“Enquanto houver incerteza sobre o controle das contas públicas, o investidor pode continuar reticente em relação à bolsa. Ainda assim, acreditamos que existe uma oportunidade de compra, mas o prazo para que esse investimento gere retorno pode ser mais longo do que o esperado. O índice pode subir de 15% a 20% neste ano, mas também pode demorar mais um ciclo para se recuperar plenamente.” Há boas oportunidades em meio à incerteza.

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