Revista Exame

Nasce um gigante: como a Inpasa cresceu 37 vezes e fatura R$ 15 bilhões ao ano com etanol

Fundada no Paraguai, empresa virou líder no mercado de etanol de grãos no Brasil. A velocidade impressiona: de 2019 a 2024, a receita foi de 376 milhões para 14,9 bilhões de reais — e a projeção é de 24 bilhões de reais neste ano. Como essa novata representa uma revolução no campo 

Publicado em 28 de agosto de 2025 às 06h00.

CP EDICAO 1278

Motoristas que passam de carro pela BR-230, em Balsas, cidade no interior do Maranhão, veem enormes tanques metálicos, azuis e prateados, refletirem o sol. Com 45 metros de altura cada um, eles fazem parte de uma biorrefinaria capaz de destilar 1,3 milhão de litros de etanol por dia, o suficiente para abastecer 32.500 carros, duas vezes a frota da cidade, de 15.400 veículos. O município, segundo maior produtor agrícola do estado, abriga desde o começo de agosto uma usina de etanol de grãos.

A chegada da biorrefinaria na cidade ilustra o bom momento do setor de biocombustíveis no país, mas, principalmente, o da Inpasa, dona daquela usina. A empresa, criada pelo paulista José Odvar Lopes, cresceu 37 vezes nos últimos cinco anos, ou 3.623%, saindo de um faturamento de 376 milhões em 2019 para 14,9 bilhões de reais em 2024. Para este ano, a expectativa é de outro avanço marcante: atingir 24 bilhões de reais de receita. Com capacidade para processar 2 milhões de toneladas de grãos e produzir 925 milhões de litros de etanol por ano, a unidade de Balsas demandou investimento de 2,5 bilhões de reais.

“O tamanho que o negócio tomou foi inesperado. Foi um pouco além do normal, mas gostamos de fazer as coisas andarem rápido”, diz Lopes à EXAME, em uma rara entrevista minutos antes da cerimônia de inauguração em Balsas. 

Com discrição, “Seu Zé Lopes”, como é conhecido no mercado, dominou o setor de etanol de milho do Brasil e virou estrela de um setor em franca expansão. Um estudo da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), ligada ao governo federal, estima que os biocombustíveis poderão movimentar mais de 1 trilhão de reais entre 2025 e 2034.

“O etanol desempenha um papel central na transição energética brasileira ao oferecer uma alternativa renovável e de baixa intensidade de carbono aos combustíveis fósseis para veículos leves, que ainda respondem por parcela significativa das emissões de gases de efeito estufa”, diz o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, à EXAME. “Nesse contexto, o etanol de milho tem ganhado protagonismo com o crescimento da sua oferta.”

O Brasil é um dos maiores produtores de etanol do mundo, com uma produção anual de 36 bilhões de litros — 72% provenientes da cana-de-açúcar, e 28%, do milho. Na safra 2024/2025, o país gerou 10,2 bilhões de litros de etanol de milho, com 50% desse total vindo das usinas da Inpasa. O crescimento do etanol de milho impressiona: eram 2,6 bilhões de litros na temporada 2020/2021, um salto de quase quatro vezes na produção em poucos anos. 

Tradicionalmente, a produção de etanol no Brasil era dominada pela cana-de-açúcar. Até então, o Brasil não direcionava seus investimentos para o etanol de milho, principalmente por questões logísticas e pelo elevado custo de produção, como explica Plínio Nastari, presidente da Datagro Consultoria. “O milho era considerado uma cultura de baixo custo marginal, ou seja, produzido de forma secundária, aproveitando o espaço disponível após a colheita da soja, sem foco na agregação de valor”, afirma Nastari.

Essa dinâmica começou a mudar com o aumento da demanda por etanol em meados da década passada e a constatação de que, em razão do baixo preço do milho, sua produção para a fabricação do biocombustível se tornava economicamente viável. “Esse movimento de industrialização do milho não apenas viabilizou a produção de etanol mas também posicionou o cereal como uma fonte estratégica de biocombustível no Brasil”, diz Nastari.

Biorrefinaria da Inpasa em Dourados (MS): a companhia destila 4,7 bilhões de litros de etanol de milho por ano (Leandro Fonseca /Exame)

Reservado, mas competitivo

A Inpasa domina hoje 10% do mercado total de etanol no Brasil e reflete o modelo de gestão — reservado e modesto, mas competitivo — de Zé Lopes. Nascido em Presidente Bernardes, no interior de São Paulo, o empreendedor acumulou experiência no mercado de commodities, especialmente milho e soja, desde 1990, além de atuar com pecuária extensiva. Com 70 anos, altura mediana, magro e de cabelos brancos, o fundador costuma falar pouco. “Ele precisa criar confiança. Uma vez que isso acontece, a relação com ele flui”, afirma Gustavo Mariano, vice-presidente comercial da Inpasa, que trabalha há sete anos com o fundador.

A história da companhia começa em 2006, na cidade de Nova Esperança, no Paraguai. Surgiu ali a Indústria Paraguaya de Alcoholes S.A., cujo nome seria abreviado para Inpasa. Na época, o Brasil não fabricava etanol de milho, ainda que o país produzisse 42,7 milhões de toneladas do cereal por ano — hoje, está perto das 130 milhões de toneladas. Lopes tinha fazendas de milho no Paraguai, além de uma exportadora de cereais, o que fez do país vizinho uma escolha óbvia.

A ideia de investir no setor veio após uma visita aos Estados Unidos — o principal produtor do biocombustível no mundo. Em 2025, o país deve renovar o recorde- de produção de etanol de milho e deve atingir 63 bilhões de litros, segundo projeções da Datagro. A aposta dos EUA no biocombustível ocorreu por uma combinação de fatores econômicos e estratégicos, especialmente relacionados à segurança e à independência energética do país.

A partir de 2007, com a Lei de Energia de 2007 (RFS2), os EUA definiram metas ambiciosas para a produção de etanol de milho, visando não só à redução da dependência de combustíveis fósseis mas também ao fortalecimento da indústria agrícola interna. Foi nesse contexto que Lopes desembarcou no país, e conheceu de perto algumas das principais fábricas de lá.

Nos Estados Unidos, o fundo Summit Agricultural Group controla a FS, que seria pioneira na produção do etanol de milho no Brasil. A FS viria ao Brasil em 2017 — e virou uma das principais concorrentes da Inpasa. Inicialmente, a fábrica paraguaia foi construída com partes de outras unidades, “graças à criatividade e à confiança de alguns engenheiros” que decidiram topar o desafio de construir uma indústria do zero, diz Lopes.

O “cientista”, como diz o fundador, por trás disso é Wagner Langner, vice-presidente industrial da Inpasa. “No início, estávamos bastante defasados e não havia mão de obra qualificada disponível no país. Hoje, conseguimos fazer isso de forma muito mais fácil, pois nossas próprias unidades já geram mão de obra para nós”, afirma Langner.

O projeto levou dois anos para começar a gerar lucro. Em 2018, tendo duas plantas no Paraguai, Lopes decidiu que era hora de olhar para o Brasil. A escolha para receber a primeira usina brasileira foi o município de Sinop, no norte de Mato Grosso, um dos principais polos produtores de grão do país. Trata-se da maior unidade de produção de etanol de milho do mundo: mais de 2,1 bilhões de litros por ano. Hoje, com 3.500 funcionários, a empresa destila 4,7 bilhões de litros de etanol de milho por ano e planeja chegar aos 5,6 bilhões de litros quando todas as unidades estiverem em operação, em 2026.

Neste ano, a companhia concluiu a construção de duas novas fábricas e já iniciou a construção de sua sexta unidade na cidade de Luís Eduardo Magalhães, na Bahia, com expectativa de começar a operação em 2026 e potencial de adicionar mais 500 milhões de litros de capacidade à produção de etanol. Além dela, mais uma biorrefinaria está prevista para ser construída em Goiás, que ainda depende de negociações com o governo local. 

Centro de Operações Integrado (COI) em Balsas (MA): sala conecta pessoas, processos e tecnologia para garantir segurança e controle de toda a usina em tempo real (Leandro Fonseca /Exame)


Os fatores do sucesso

As razões para o sucesso da Inpasa passam por quatro fatores: eficiência operacional, matéria-prima abundante, apetite pelo risco e regulações federais, que estimulam o consumo de etanol e criam um mercado com demanda estável para o produto.

O etanol de milho tem algumas vantagens em comparação ao de cana. Uma delas é que o cereal pode ser transportado por distâncias maiores, o que permite fábricas mais distantes das plantações. Mas o pulo do gato vem na rentabilidade: 1 tonelada de cana gera 89,5 litros de etanol, enquanto 1 tonelada de milho produz 407 litros do combustível.

Além disso, a empresa se beneficiou de 567 milhões de reais em incentivos fiscais, de acordo com dados da Controladoria-Geral da União (CGU), a maioria deles como parte de um programa da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), que dá 75% de desconto no Imposto de Renda para empresas que investem em setores considerados prioritários para o desenvolvimento regional. Desde sua instalação no Brasil, a companhia já investiu 13 bilhões de reais no país — cada biorrefinaria demanda um investimento médio de cerca de 2,5 bilhões de reais. 

Para Lucas Correia, analista sênior de crédito da agência de classificação de risco Moody’s, a experiência no segmento, a baixa alavancagem financeira, além da tecnologia de ponta aplicada nas usinas explicam o avanço rápido. “A empresa se destaca pela sua cultura voltada para a eficiência operacional e pela estrutura financeira conservadora, o que lhe permite navegar com sucesso por ciclos econômicos e de commodities voláteis, além de aproveitar as vantagens do mercado competitivo de milho no Brasil”, afirma Correia.

Em seu último relatório de crédito, em maio, a Moody’s afirmou que a Inpasa mantém “uma rentabilidade e geração de caixa sólidas, mesmo diante da volatilidade intrínseca de seu setor de atuação”. Na visão do analista, a posição de mercado da Inpasa traz um grande poder de negociação, o que facilita obter contratos competitivos.

Entre os indicadores, chama a atenção o endividamento controlado. Em 2024, a relação da dívida bruta sobre a margem de lucro Ebtida da companhia estava em 1,8, uma alavancagem relativamente controlada, mesmo em um contexto de forte expansão — naquele ano foram investidos 5 bilhões de reais para construir usinas. O valor mostra que, para cada 1 real de Ebtida, a Inpasa tem aproximadamente 1,80 real de dívida bruta, um patamar considerado saudável para companhias em crescimento no setor agroindustrial. 

Em contrapartida, a Inpasa tem uma geração de caixa menor do que a média do setor. Isso não gera problemas de liquidez, diz o analista da Moody’s, mas é um ponto de atenção, pois a companhia tem uma dívida de curto prazo superior ao seu caixa, o que a coloca em situação menos favorável do que a de empresas similares, diz Correia.

Fernando Alfini, CFO da Inpasa, conta que a empresa optou no começo por captar recursos de curto prazo para financiar o capital de giro. A decisão, embora eficaz no curto prazo, de fato expôs a empresa a possíveis flutuações no preço das commodities e no refinanciamento da dívida, o que chamou a atenção das agências de rating. A partir do final de 2025, a estratégia da Inpasa será alongar a dívida para melhorar a liquidez. “Veremos uma mudança completa. Estamos zerando a dívida de curto prazo e, no final do ano, vamos ver um balanço com quase nada de dívida desse tipo”, afirma.

As projeções da Moody’s mostram que a relação dívida/Ebitda da Inpasa deverá cair para a faixa entre 1,3x e 1,5x nos próximos 18 meses. Uma das razões é que não serão criadas mais unidades e o foco é potencializar as usinas já existentes. “Nosso projeto é finalizar o investimento em Luís Eduardo Magalhães, e não temos projetos novos agora”, afirma Alfini.

Eder Lopes, novo CEO da Inpasa: com perfil semelhante ao do fundador — discreto e reservado —, em janeiro o sucessor começou a se envolver gradualmente com os negócios no Brasil (Leandro Fonseca /Exame)

Na parte operacional, padronização e logística favorável estão no centro da estratégia. Ao instalar usinas em regiões que são grandes produtoras de grãos, como Sinop, Dourados e Balsas, a cidade maranhense que abre esta reportagem, a empresa reduz custos com logística, uma das principais dores do agronegócio. “Eles são extremamente eficientes, se posicionaram com economia de escala e grandes volumes. Isso reduz custo”, afirma Guilherme Nolasco, presidente da União Nacional do Etanol de Milho (Unem).

A empresa usa a mesma tecnologia e equipamentos em todas as suas usinas, o que garante uniformidade nos produtos, afirma Luciane Hermes de Alencar, diretora industrial da empresa. “O modelo facilita o treinamento das equipes, o que acelera o crescimento interno da companhia”, diz a diretora. O modelo da Inpasa ajuda a protegê-la de riscos comuns em negócios agrícolas, como clima e volatilidade de preços. Uma queda no valor do açúcar, por exemplo, levaria usineiros a aumentarem a produção do etanol de cana, que passaria a competir de forma mais intensa com o álcool de milho. A logística, embora bem azeitada, poderá ser um desafio futuro. “A Inpasa tem conseguido manter a agilidade e as entregas, mas se aumentar muito a produção pode ter alguma dificuldade de escoamento”, diz Correia, da Moody’s. 

A aposta da Inpasa no milho vem na esteira de um movimento muito maior que envolve o cereal. A produção de espigas ganhou grande destaque no Brasil nos últimos anos em razão de uma série de fatores, como a integração de cadeias produtivas, a industrialização do grão e o aumento da produtividade, diz Nastari, da Datagro. Uma dessas mudanças foi a consolidação da “safrinha” — termo hoje quase irônico —, o plantio de milho feito entre safras de soja, para aproveitar o adubo e os defensivos agrícolas que ficam no solo. No começo dos anos 2000, o valor do milho plantado assim, no entanto, era baixo, especialmente no Centro-Oeste, onde os custos de logística eram maiores.

A partir de meados da década passada, com o crescimento da produção de etanol de milho, essa realidade começou a mudar. “O aumento da produção de etanol e seus coprodutos trouxe estabilidade para o preço do milho e impulsionou a área plantada”, diz Nastari. “Ao mesmo tempo, os produtores aumentaram o investimento em tecnologia, maquinário e práticas agrícolas mais eficientes, o que resultou em maior produtividade, mesmo com uma área de cultivo reduzida.”

Além disso, uma lei de 2005 permitiu o uso de sementes transgênicas e deu impulso à redução de custos. “Ganhamos competitividade para exportar o grão, e isso gerou mais investimentos em inovação”, afirma Roberto Rodrigues, ex-ministro da Agricultura e Pecuária e atualmente coordenador do Centro de Agronegócios da Fundação Getulio Vargas. A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) estima que o milho de segunda safra no país deve chegar a 104,5 milhões de toneladas na safra 2024/2025. Se confirmado, será um aumento de 16% em relação ao ciclo anterior. “Hoje, a segunda safra passou a ser a grande colheita, responsável por mais de 75% da produção anual do país”, diz Rodrigues. 

Luciane Alencar, diretora industrial da empresa: a executiva é responsável pelo processo produtivo do grupo, incluindo as unidades no Paraguai (Leandro Fonseca /Exame)

Além disso, a Inpasa se beneficia de uma onda global que busca reduzir o consumo de combustíveis fósseis para conter o aquecimento do planeta e é estimulada — ou exigida — por vários governos. Os estímulos públicos ao uso do álcool como combustível no Brasil começaram em 1975, com o Proálcool, criado em meio à crise do petróleo. Na década de 2000, o álcool passou a ser chamado comercialmente de etanol e a ser aceito em todos os carros novos, equipados com motores flex. Ao mesmo tempo, o percentual de etanol obrigatório na gasolina foi sendo ampliado. Nos anos 1970, era de 10% no Brasil. Em 1o de agosto deste ano, o número foi aumentado para 30% de etanol na gasolina e 15% de biodiesel no diesel. Esses índices poderão subir para 35% e 25%, respectivamente, nos próximos anos.

O avanço foi determinado pela Lei Combustível do Futuro, sancionada em 2024, que traz vários estímulos para o avanço de produtos menos poluentes e busca ajudar o país a cumprir metas de descarbonização. “Ao aumentar de forma permanente e previsível a demanda por etanol anidro, a medida proporciona um sinal claro ao mercado, estimulando novos investimentos, expansão de capacidade e verticalização produtiva nas usinas”, diz o ministro Silveira. Para ele, o avanço dos combustíveis verdes é uma forma de estimular o desenvolvimento regional, por aumentar o acesso a combustíveis em áreas sem refinarias e criar novos negócios, como o acrônimo DDGS.

No processo produtivo, o amido presente no milho é transformado em combustível, e as partes restantes formam os distiller’s dried grains with solubles (DDGS), outra aposta da Inpasa. Com alto valor nutricional, o material é usado para produzir ração para bois, frangos e porcos, e pode elevar a produtividade dos animais, o que reduz o preço final da carne.

Segundo a companhia, vacas alimentadas com DDGS produzem, em média, 1,4 litro a mais de leite por dia. Na safra 2024/2025, o Brasil produziu 4 milhões de toneladas de DDGS, segundo a Unem. Desse total, a Inpasa produziu 47%. Para a temporada 2025/2026, a expectativa da Unem é de que o Brasil produza 4,8 milhões de toneladas de DDGS — a capacidade produtiva da Inpasa para este ano é de 3 milhões de toneladas que abastecerão o mercado doméstico e 12 países.  


Novos ares 

Enquanto atua em várias frentes, a Inpasa vive um processo de sucessão. No evento em Balsas, a companhia anunciou que seu fundador se prepara para deixar o cargo de CEO e assumir a presidência do conselho de administração. A função de CEO ficará para Eder Lopes, seu filho e, até então, presidente da companhia no Paraguai. Com perfil semelhante ao do fundador — discreto e reservado —, o sucessor começou a se envolver gradualmente com os negócios no Brasil em janeiro, para garantir uma “continuidade tranquila”, diz Renato Teixeira, diretor de marketing e comunicação da Inpasa.

“Ele [Eder] chega com muita energia, mantendo a cultura focada em simplicidade, inovação, pessoas, sustentabilidade e desenvolvimento do negócio. O objetivo é que ele dê continuidade à trajetória estabelecida.” Além disso, a chegada de Eder Lopes deve trazer uma abertura maior em relação à comunicação da própria companhia. A Inpasa reestruturou toda a área e a estratégia é se aproximar — ainda mais — da imprensa. Além da troca de comando, a  empresa passa por uma reestruturação de governança nos últimos meses. Nesse processo, Rafael Ranzolin, que ocupou o cargo de vice-presidente da empresa no Brasil por seis anos, e Daniel Sarmento, da área comercial, deixaram a companhia.

Usina da Inpasa em Balsas (MA): capacidade para processar 2 milhões de toneladas de grãos por ano, além de adotar o conceito de economia circular (Leandro Fonseca /Exame)

Para os próximos anos, a empresa planeja avançar em outros tipos de biocombustíveis e cereais, como o sorgo, e em mais negócios no exterior. “Embora o etanol de milho seja o foco, estamos de olho em outras possibilidades. A produção de biocombustíveis avançados, como o bioquerosene (SAF) para a aviação, está sendo analisada à medida que a tecnologia e a demanda global se expandem”, diz Mariano, VP de vendas da Inpasa.

Em março, a empresa obteve certificação internacional para produzir SAF, item muito buscado pelas empresas aéreas, mas ainda com produção baixíssima. O SAF deverá responder por grande parte do aumento da demanda global de biocombustíveis líquidos nos próximos anos (veja quadro), e o Brasil é apontado como um possível grande fornecedor.

Para Danilo Severian, especialista do Observatório Nacional da Indústria, ligado à Confederação Nacional da Indústria (CNI), o país tem vantagens para avançar na área. “Nem todos os países conseguirão produzir combustíveis limpos, e o Brasil pode se destacar por estar em uma posição muito vantajosa”, diz. O país tem grandes áreas disponíveis para plantações e ainda consegue produzir mais sem ampliar a área cultivada, como mostra o avanço da “safrinha”. 

Laboratório de pesquisa da Inpasa em Dourados (MS): a unidade mais tecnológica destila 1,3 milhão de litros de etanol por dia (Leandro Fonseca /Exame)

O avanço do etanol, em que a Inpasa é protagonista, é um exemplo ainda de outra transformação mais profunda e que traz ganhos ao Brasil: expandir a indústria agrícola, o que gera mais ganhos e empregos do que manter apenas a exportação de produtos in natura.

Um exemplo dessa disparidade vem do algodão. Em média, o quilo do algodão bruto é exportado a 83 centavos de dólar, de acordo com dados da CNI. Quando o produto é exportado em fios, o valor sobe para 3 dólares por quilo. No entanto, 98% do algodão exportado pelo Brasil é bruto, e menos rentável. Dados da CNI mostram que, em 2024, de cada 100 dólares exportados pelo agro do Brasil, 55 foram de produtos agroindustriais. O valor é maior do que o registrado em 2023, quando os itens industriais representaram 50,7 dólares desse total, mas bem menor do que em 1997, quando esse índice atingia 74 de cada 100 dólares importados pelo setor agro. Em 1997, segundo dados da Embrapa, o Brasil exportou 2,4 bilhões de dólares em grãos de soja, em valores da época. Em 2024, esse montante foi de 42,9 bilhões de dólares.

“A desindustrialização no Brasil foi severa. Estamos nos especializando cada vez mais em produtos brutos em vez de agregar valor”, diz Severian. Para reverter esse caminho, o especialista aponta a necessidade de coordenação assertiva e de crédito bem direcionado e com boas taxas. “Temos expertise, mas estamos em um ciclo de juros muito elevados, o que prejudica a produção”, afirma.

O avanço da Inpasa é, ao mesmo tempo, motor e exemplo do avanço da transição energética e de como ela pode trazer ganhos. Marcos Fava, diretor da Harven Business School, uma escola voltada para o agronegócio, avalia que a nova instalação em Luís Eduardo Magalhães, por exemplo, “vai revolucionar o oeste da Bahia”. “Quando uma indústria de etanol de milho se instala, ela empodera aquela região”, afirma.

Além do desenvolvimento regional, a expansão dos combustíveis verdes ajuda a reduzir a poluição do planeta, uma meta que ainda tem um caminho longuíssimo pela frente. Casos como o da usina de Balsas e a trajetória da Inpasa mostram que há muitas recompensas ao seguir por essa estrada.    


“Etanol tem papel central na transição energética brasileira”

Ministro Alexandre Silveira, de Minas e Energia, destrincha os planos do governo para os biocombustíveis 

Alexandre Silveira, ministro de Minas e Energia: o etanol de milho ganha protagonismo com crescimento da oferta (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Qual será o papel do etanol, e especialmente do etanol de milho, na transição energética e no avanço da agroindústria no Brasil?

O etanol desempenha um papel central na transição energética brasileira ao oferecer uma alternativa renovável e de baixa intensidade de carbono aos combustíveis fósseis para veículos leves, que respondem por parcela significativa das emissões de gases de efeito estufa. O etanol de milho ganha protagonismo com o crescimento da oferta (20% ao ano), ampliando a oferta ao longo de todo o ano e contribuindo para a estabilidade de preços. Recentemente, nosso etanol de milho foi reconhecido pela Organização da Aviação Civil Internacional [Oaci] como fonte para produção de combustível sustentável de aviação [SAF], o que pode inserir o país com mais força no mercado global de soluções de baixo carbono.

Como o aumento da mistura de etanol e biodiesel na gasolina e no diesel, respectivamente, poderão ajudar essas indústrias a avançarem?

A adoção do E30 proporciona um sinal claro ao mercado, estimulando novos investimentos, além de gerar emprego, renda e desenvolvimento regional. No biodiesel, com a elevação da mistura obrigatória de 14% para 15% [B15], estimamos mais 5.000 famílias da agricultura familiar integradas ao Programa Selo Biocombustível Social, com impacto previsto de 600 milhões de reais na renda. Sem contar os mais de 4.000 novos empregos diretos e indiretos gerados, principalmente em esmagamento e refino de óleo de soja.

O Brasil poderá ser um grande exportador de etanol e biodiesel no futuro? 

O Brasil sempre exportou volumes significativos de etanol e buscamos abrir novos mercados. Em biodiesel, temos capacidade de produção superior à demanda. Isso abre espaço para que uma parte da produção possa ser destinada ao mercado externo. No entanto, embora haja espaço para exportações pontuais, a prioridade da política energética nacional é garantir o abastecimento interno. A consolidação do mercado doméstico será fundamental para, no futuro, ampliar a presença do biodiesel brasileiro no mercado internacional.


Nova geração, mesma ambição

Depois de fundar e liderar a Inpasa, José Lopes prepara transição para deixar cargo de CEO e ocupar cadeira na presidência do Conselho da companhia 

“Seu Zé Lopes”: “Sucessão garante a continuidade do crescimento e reforça a nossa governança” (Leandro Fonseca /Exame)

Por que deixar a posição de CEO em um momento tão positivo para a Inpasa?

A sucessão garante a continuidade do crescimento e reforça a nossa governança. Vou focar a estratégia no conselho, enquanto Eder assume a operação. Isso mantém nossa cultura e abre espaço para novos ciclos de expansão.

Como o senhor vê o processo de transição para a sucessão do cargo de CEO?

A sucessão é fruto de um planejamento cuidadoso e foi anunciada oficialmente em 1o de agosto de 2025: Eder Lopes assume como CEO e eu passo à presidência do conselho. Ele já era o presidente da Inpasa no Paraguai, onde começamos. E há bastante tempo ele já se envolve nas operações brasileiras para garantir uma transição tranquila. Vejo esse movimento como uma evolução natural da governança, que fortalece a empresa sem perder nossos valores de simplicidade, sustentabilidade, ética, inovação e foco em pessoas.

O que pretende desenvolver em sua nova posição?

No conselho, vou me concentrar em consolidar operações e avaliar novos projetos de expansão, como em SAF e biocombustíveis marítimos. A solidez construída até aqui me dá confiança de que a Inpasa seguirá avançando com responsabilidade e sustentabilidade.

Mas o que falta avançar em relação ao SAF?

O grande problema é a falta de mandato [de uso obrigatório de SAF]. A tecnologia já está controlada, mas o custo ainda é um pouco mais alto. Para fabricar o SAF não há problema técnico, a questão é o mandato. Quando houver um mandato, o SAF se tornará mais viável, mas atualmente o custo é mais alto. 

Além do SAF, há planos de internacionalização? Quais movimentos a Inpasa tem feito a esse respeito?

Temos uma trajetória consolidada no mercado internacional, sendo exportadores desde o Paraguai. Recentemente, ampliamos nossa presença com a abertura de um escritório em Genebra, reforçando nossa atuação no mercado europeu. Nesse continente, já operamos com todo o nosso portfólio — etanol, DDGS e óleo vegetal — e seguimos com o objetivo de expandir nossas operações de trading, levando as vantagens competitivas dos nossos produtos a novos parceiros e mercados.

Quais são suas perspectivas para a empresa nos próximos cinco anos?

A bioenergia deve ganhar espaço com a transição energética e a necessidade de combustíveis de baixo carbono. Pretendemos ampliar nossa capacidade, explorar mercados emergentes e seguir inovando em economia circular, mantendo a Inpasa como referência em sustentabilidade e competitividade. Acabamos de inaugurar a unidade de Balsas, no Maranhão, já estamos com a unidade de Luís Eduardo Magalhães, na Bahia, em construção e oficializamos nosso interesse em Goiás, ainda em fase de negociação com o governo. Com a evolução da demanda do mercado, outras unidades poderão ser consideradas para o futuro.

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