Campanha da grife Oriba: a marca não contrata modelos mais velhos só no Dia dos Pais (Oriba/Divulgação)
Repórter
Publicado em 12 de março de 2025 às 06h00.
Última atualização em 12 de março de 2025 às 11h17.
A boina. Os suspensórios. As cordinhas para óculos. Os blazers com revestimento de couro na região dos cotovelos. Se há peças de roupas e acessórios que remetem, inegavelmente, a épocas passadas — e a gerações que não se encontram mais na juventude —, são esses aí. Se bem que esses itens, hoje em dia, também fazem parte do guarda-roupa de muitos representantes das gerações Z e Y. As cordinhas para óculos, por exemplo, caíram nas graças de muita gente que ainda não passou dos 30 anos. Ganharam status de “cool”, assim como as pochetes, que agora são usadas sobre o torso, na transversal, por homens e mulheres.
Tudo isso para dizer que associar acessórios e peças de roupas a esta ou aquela idade é cada vez mais difícil. “Uma camiseta polo, hoje em dia, é sinônimo de pessoas mais velhas ou mais jovens?”, pergunta Paulinho Moreira. A resposta todo mundo sabe qual é: de ambas. Ele é um dos fundadores da grife Oriba, que se apresenta como uma marca “ageless”. “Não é raro atendermos, no mesmo dia, tanto um rapaz de 20 e poucos anos quanto um senhor com mais de 70 — e que compram exatamente a mesma peça”, informa Moreira.
Ele tirou a marca do papel em 2014, em conjunto com Rodrigo Ootani e Marcelo Collis, que saiu da sociedade. A grife foca camisas e calças, entre outros itens, que remetem ao básico — nada de tons chamativos ou de logotipos em destaque. “Em relação ao estilo, a Oriba tem o propósito de ser atemporal”, explica Moreira. Trata-se de uma característica que costuma ser muito valorizada, por exemplo, por quem gosta de se vestir com discrição ou é adepto do minimalismo. “Meu pai virou cliente porque dá preferência a peças sem bordados nem logotipos”, revela o mesmo sócio.
Para cair nas graças tanto dos mais jovens quanto dos representantes da chamada geração prateada, a Oriba aposta em campanhas de comunicação com representantes de gerações diversas. O ator Milhem Cortaz, de 52 anos, e o cantor Paulo Miklos, que está com 65, já estrelaram ações da grife. Convém lembrar que, na moda, as campanhas compostas somente por modelos na flor da idade, em geral sem nem um grama de gordura corporal, ainda são de praxe.
“A gente não contrata modelos mais velhos apenas no Dia dos Pais”, afirma Ootani. Não se trata de uma decisão, acrescenta, motivada pela onda do politicamente correto. “É uma decisão de negócio”, explica. “O poder aquisitivo dos clientes mais velhos costuma ser maior. Restringir o público da marca a esta ou aquela faixa etária, por outro lado, limitaria nosso alcance.” A maioria dos compradores, é verdade, está na faixa que vai dos 30 aos 40 anos. O público-alvo, no entanto, são os adultos em geral. “Hoje em dia, nem as pessoas mais velhas querem se vestir como os mais jovens, nem estes temem ser vistos como ‘caretas’ quando se vestem desta ou daquela forma”, observa Ootani.
Helena Schargel: hoje com 84 anos, montou coleção de lingeries para mulheres acima dos 50 (Helena Schargel/Divulgação)
Prestes a dar início a uma nova etapa de seu plano de expansão, a Oriba está com meia dúzia de lojas, todas elas em São Paulo. A primeira tendência à qual ela aderiu é a do affordable luxury (“luxo acessível”). Depois a grife se alinhou, quase naturalmente, ao chamado “quiet-luxury”. Este, para quem não sabe do que se trata, se opõe à ostentação e tem horror a logotipos, dos quais muitas grifes de luxo não abrem mão. Na Oriba, uma camisa confeccionada com o algodão Pina, tido como o melhor de todos, custa de 570 a 650 reais. As camisetas de algodão orgânico oscilam entre 105 e 210 reais.
A aposta na moda básica vem desde o início. Moreira e Ootani sustentam que, até o surgimento da Oriba, só dava para encontrar roupas básicas muito caras ou de baixíssima qualidade. E que não dá para comparar o básico com o básico de qualidade, no qual eles investem. A grife dá preferência a peças mais sóbrias em razão de sua preocupação ambiental. Explica-se: a marca foca as peças para o dia a dia, que são as mais utilizadas, e diz fazer o possível para aumentar a vida útil delas — daí a aposta em qualidade. No discurso, pelo menos, a Oriba estimula a clientela a comprar menos itens e utilizá-los durante mais tempo. Tudo para diminuir o impacto da marca no meio ambiente.
Pela mesma razão, a Oriba lançou uma linha de camisetas feitas de algodão orgânico plantado no interior da Paraíba. O cultivo dele demanda menos água e, por causa disso, a marca afirma ter economizado 4,5 milhões de litros até aqui — a matéria-prima convencional exigiria todo esse volume a mais. A grife também desenvolveu um tecido feito de garrafas de plástico. Ele é utilizado na confecção de jaquetas, calças e acessórios. Graças a essa iniciativa, mais de 92.600 garrafas deixaram de ir para o lixo.
Sem fazer alarde disso, a Riachuelo também aderiu ao conceito de moda “ageless”. A marca parou de dar bola para a idade das mulheres, seu público-alvo, faz muito tempo. “Acreditamos que a moda é muito mais sobre comportamento do que sobre faixa etária e estereótipos, e queremos que mulheres de diferentes idades possam se sentir representadas e livres para expressarem genuinamente seu estilo, conforme seu lifestyle e momento de vida”, diz Cathyelle Schroeder, Chief Marketing Officer (CMO) da Riachuelo. “Por isso, adotamos uma abordagem mais inclusiva e menos segmentada por faixas etárias. Nosso objetivo é criar uma conexão cada vez mais verdadeira e longeva com as consumidoras.”
Cathyelle Schroeder, CMO da Riachuelo: varejista parou de dar bola para a idade das mulheres (Leandro Fonseca/Exame)
Ela acrescenta que a Riachuelo — cuja origem remonta a 1947, quando Nevaldo Rocha fundou, ao lado de seu irmão, Newton Rocha, o Grupo Guararapes — sabe perfeitamente que a geração prateada tem cada vez mais representantes. “As marcas que não olham para isso podem ficar desatualizadas”, acredita a CMO. “A adesão ao conceito de moda ‘ageless’ trouxe maior fidelidade do nosso público adulto e aumentou o engajamento de mulheres que antes não se viam representadas no mercado em que atuamos.” E completa: “Esse público quer e merece ser visto em sua individualidade, sem ser limitado por normas da juventude ou qualquer predeterminação de estilo. A moda ‘ageless’ busca justamente a quebra de estereótipos e a celebração da beleza em todas as idades”.
Trata-se, a bem da verdade, de um combate ao etarismo nesse segmento. E de um movimento que favoreceu o sucesso de influenciadores digitais do mundo da moda que exibem os cabelos prateados, às vezes brancos, com orgulho. É o caso dos japoneses Tsuyoshi e Tomi Seki, que se converteram em ícones de estilo. Aposentados e casados há quase 40 anos, eles já têm 887.000 seguidores no Instagram, onde se apresentam como Bon e Pon. Postam o look do dia quase diariamente — trajes combinando viraram a marca registrada da dupla.
Aos 70 anos, Lyn Slater, cujo cabelo chanel nunca tem um fio fora do lugar, é tida como uma das maiores influenciadoras americanas da geração prateada. Chamada de Accidental Icon (“ícone acidental”), ela administra um blog com esse nome, onde escreve sobre estilo e envelhecimento. Ex-professora de serviço social na Universidade Fordham, em Nova York, ela tem 771.000 seguidores no Instagram. No ano passado, lançou um livro de memórias, Como Envelhecer: Lições Sobre Viver com Audácia a Partir do Ícone Acidental. Na obra, encoraja todo mundo a viver corajosamente em qualquer idade.
Sua trajetória remete à da brasileira Helena Schargel, que tem uma longa bagagem como criadora de marcas femininas e se aposentou em 2018, aos 78 anos. Quer dizer, mais ou menos. Naquele ano, ela participou de um evento chamado Café 50+, voltado para essa faixa etária. Quando lhe perguntaram se ela tinha algum projeto em mente, Schargel respondeu o seguinte: montar uma coleção de lingeries para mulheres acima dos 50 anos.
A ideia foi concretizada em parceria com a marca Recco. Ao posar para a campanha de divulgação vestindo os produtos da coleção, Schargel roubou a cena. “Queria que o nosso público-alvo se sentisse à vontade com os nossos produtos”, recorda ela. Daí para se converter em ícone de estilo, palestrante motivacional focada no público 60+ e em exemplo de empreendedorismo na terceira idade foi um pulo. No Instagram, onde tem quase 40.000 seguidores, Schargel se apresenta da seguinte maneira: “Sou uma menina de 8.4 que encoraja mulheres a saírem da invisibilidade”.