(Divulgação/Divulgação)
Guilherme Dearo
Publicado em 13 de agosto de 2020 às 05h00.
No final de 1968, 14 dias após o decreto do AI-5, Caetano Veloso e Gilberto Gil foram levados da casa deles por agentes federais à paisana e ficaram presos sem nunca ouvir uma acusação formal para a detenção. Quando saíram, tiveram de se exilar na Inglaterra. Ao todo, Caetano ficou 54 dias preso. Mais de meio século depois, o cantor relembra o doloroso episódio no documentário Narciso em Férias, selecionado para estrear no Festival de Veneza, em setembro, primeira mostra de cinema a acontecer de modo presencial desde o início da pandemia. A ideia do projeto partiu do próprio cantor. “A gente sentiu que era uma necessidade dele de falar desse período. O cenário político atual agravou essa urgência”, diz Ricardo Calil, um dos diretores do documentário. O filme foi gravado poucos dias antes das eleições de 2018, em um único dia, na Cidade das Artes, no Rio de Janeiro. A locação, com uma grande parede de concreto exposto, remete à dureza do cárcere. As cerca de 5 horas de conversa foram reduzidas a 1h20 no filme. CASUAL conversou com os diretores do filme, Renato Terra e Ricardo Calil.
Por que o filme traz apenas Caetano em frente à câmera?
Ricardo Calil — Percebemos que a gente perderia muito inserindo imagens de arquivo do período da ditadura e entrevistas com outros artistas. O episódio da prisão é um tema tão árido por si só que não caberia mais nenhum ornamento. O foco do filme é a prisão e a experiência de ouvir Caetano contando. Mas ele também canta algumas músicas, dele e de outros, que remetem àqueles tempos.
Como foi a experiência de filmar com ele?
RENATO TERRA — Caetano é um gênio. Conta as coisas de um jeito só dele. Em um momento, ele se emocionou muito e tivemos de parar por 10 minutos. É importante registrar isso. Em um documentário, quando acontece algo naquela entrevista e a câmera capta, é cinema. E ele sentado e falando já basta. Todo ele fala. Os gestos, as expressões, os silêncios. Alternamos entre planos abertos e planos fechados para criar uma experiência no espectador: ele vai sentir angústia, tédio, medo e até humor, conforme a história se desenvolver.
Como esperam que o filme seja recebido?
RENATO TERRA — Os espectadores verão um Caetano falando de um jeito que ele nunca falou. Em nenhum momento ele se coloca como herói. Ele apenas conta sua história. Não é um filme panfletário, mas certamente é um filme político. Esperamos que ele traga um debate elevado, que é o que está faltando hoje. As pessoas estão se deixando levar por medos e instintos. Queremos que haja uma discussão madura sobre autoritarismo e que se reflita sobre o Brasil atual.
SÉRIE
Em busca da verdade
Série documental da HBO conta a história da jornalista investigativa Michelle McNamara, obcecada por crimes violentos não solucionados | Guilherme Dearo
Em 2018, um homem de 72 anos foi preso nos Estados Unidos por crimes cometidos nos anos 1970 e 1980. Joseph DeAngelo era um serial killer. O “Assassino de Golden State”, contudo, teria morrido sem prestar contas à Justiça não fosse pelos esforços da jornalista Michelle McNamara, que ajudou a polícia na investigação com pistas inéditas. Fascinada por histórias de crimes não solucionados (quando criança, sua vizinha foi morta em circunstâncias misteriosas), a jornalista dedicou a carreira ao blog True Crime Diary e a contar a história de DeAngelo. Morta de forma repentina em 2016, aos 46 anos, seu livro póstumo Eu Terei Sumido na Escuridão virou best-seller do The New York Times e, agora, ganha série documental na HBO. Em seis episódios, o seriado traz imagens de arquivo para narrar as investigações que levaram à prisão de DeAngelo e conta com gravações antigas de McNamara e depoimentos emocionados de sua família, como o do ator e comediante Patton Oswalt, seu marido. Liz Garbus, indicada ao Oscar pelo documentário sobre Nina Simone, assina a direção.
Eu Terei Sumido na Escuridão | De Liz Garbus |Todos os episódios disponíveis na HBO Go