Revista Exame

Como a Agrotools captou R$ 100 milhões mantendo sempre o olho do dono no dia a dia da operação

Contra a maré de cortes e demissões no mercado tech, um grupo de startups segue crescendo e atraindo investidores. Qual é a fórmula?

Sérgio Rocha, da Agrotools: “Somos e sempre fomos caretas na gestão e ousados em tecnologia” (Leandro Fonseca/Exame)

Sérgio Rocha, da Agrotools: “Somos e sempre fomos caretas na gestão e ousados em tecnologia” (Leandro Fonseca/Exame)

Maria Clara Dias
Maria Clara Dias

Repórter de Negócios e PME

Publicado em 20 de abril de 2023 às 06h00.

Em abril de 2020, a pandemia virou o planeta de ponta-cabeça, como bem sabemos. Na ocasião, o investidor de venture capital americano Alex Lazarow foi um dos pioneiros a defender a importância de startups perderem mais tempo gerindo o caixa de maneira cuidadosa e com uma governança falando a mesma língua — e menos tentando crescer a qualquer custo a partir da entrada de uma porção de investidores. Ele foi o primeiro a cunhar o termo “startup camelo” para esse grupo, acostumado a ter dinheiro em caixa assim como o animal típico dos desertos guarda água na corcova para aguentar semanas sem acesso à hidratação.

O recado de Lazarow era para startups às voltas com as incertezas geradas por uma quarentena inédita. Passada a pandemia, as startups camelo estão mais em alta do que nunca num mundo às voltas com juros elevados para combater uma inflação global no maior patamar em 40 anos. Em tempos de investidores exasperados com o retorno baixo de negócios de risco, como as startups, quem conseguiu crescer com caixa próprio pôde minimizar a diluição da governança comum a cada aporte. E, agora, pode ter o privilégio de enfrentar o cenário atual sem ficar tão refém do humor dos investidores.

O que faz a Agrotools

Foi o caso da Agrotools, uma empresa fundada há 16 anos em São Paulo para levar tecnologia a várias pontas do agronegócio, fornecendo dados para a tomada de decisão. A Agrotools criou uma plataforma para empresas como Nestlé, Carrefour, Itaú e Kraft Heinz checarem se produtores rurais em suas bases de clientes ou fornecedores seguem boas práticas ambientais e de manejo da lavoura. Hoje, a Agrotools analisa algo como 4,5 milhões de hectares de territórios rurais e monitora 15 bilhões de reais em commodities. Somadas as frentes de atuação da startup, hoje ela intermedeia cerca de 100 bilhões de reais em operações do setor.

O primeiro aporte recebido pela empresa veio no ano passado, num cheque de 100 milhões de reais assinado por Horácio Lafer Piva, conselheiro da Klabin, junto com JPMorgan, Pátria, KPTL e outros fundos. Eles levaram uma fatia de 20% do negócio. O restante segue na mão dos sócios originais. “Somos e sempre fomos caretas na gestão e ousados em tecnologia”, diz Sergio Rocha, CEO e um dos fundadores. “Crescemos à base de nota fiscal, vendendo para empresas que confiaram na nossa tese e na nossa tecnologia, mesmo quando o agro ainda era uma grande terra de ninguém e nada digitalizado.”

Por que a empresa cresceu tanto

A pujança do agronegócio brasileiro nas últimas duas décadas garantiu uma procura constante pelos serviços da Agrotools. Mesmo com o mercado jogando a favor, um negócio promissor pode sofrer as consequências de uma gestão errática com muita gente dando pitaco sobre o rumo a ser seguido. Não foi, definitivamente, o caso da companhia liderada por Rocha. Em 2022, a empresa cresceu 84% nos dois principais indicadores financeiros: receita anual recorrente e lucro gerado pelos clientes no longo prazo (a empresa não abre os valores).

O aporte em meio à colheita de ótimos resultados financeiros permitiu uma seleção criteriosa de quem entraria no negócio, sem a pressão típica de uma captação às pressas. “Escolhemos a dedo todos os nossos investidores, de olho nas expertises de cada um”, diz ele. A “caretice” na gestão está, inclusive, colaborando para a Agrotools ir às compras no meio da entressafra no venture capital. Em abril, a empresa de Sergio Rocha anunciou a compra da startup argentina S4Go, uma plataforma para gestão de dados úteis a pequenos e médios produtores rurais, como padrões climáticos e a produtividade do campo.

Os resultados obtidos pela prudência deram margem, agora, para a Agrotools sonhar alto. Hoje presente nos principais países da América Latina, a startup quer colocar os dois pés nos Estados Unidos em 2023. “Queremos nos tornar a maior big tech global do agronegócio”, diz o sócio Lucas Tuffi. 


AGROTOOLS

O que faz: plataforma de dados e monitoramento para o agronegócio

Como driblou a crise: gestão “das antigas”, com crescimento baseado em capital próprio e controle societário nas mãos dos fundadores

O resultado: crescimento de 84% na receita anual recorrente e no lucro

100 milhões de reais captou a Agrotools de investidores como Horácio Lafer Piva (Klabin), Pedro Paulo Campos (JPMorgan), Fátima Marques (Korn Ferry) e KPTL desde 2022

Acompanhe tudo sobre:Revista EXAME

Mais de Revista Exame

Borgonha 2024: a safra mais desafiadora e inesquecível da década

Maior mercado do Brasil, São Paulo mostra resiliência com alta renda e vislumbra retomada do centro

Entre luxo e baixa renda, classe média perde espaço no mercado imobiliário

A super onda do imóvel popular: como o MCMV vem impulsionando as construtoras de baixa renda