Executivos da consultoriaEY, em São Paulo: a avaliação dos subordinados era anual,<br />agora vai acontecer uma<br />vez a cada três meses | Germano Lüders /
Da Redação
Publicado em 30 de novembro de 2017 às 05h46.
Última atualização em 30 de novembro de 2017 às 18h57.
Em maio, o escritório brasileiro da consultoria americana EY (antiga Ernst & Young) deu início a um treinamento inédito para seus 1.000 funcionários que têm pelo menos um subordinado. Eles estão aprendendo técnicas de coaching, como uma maneira de aprender a conhecer de perto o perfil e os anseios dos integrantes da equipe para ajudá-los a dar os próximos passos na carreira.
A mudança vem acompanhada de outra — e não é por acaso. Desde junho, no lugar do feedback anual, os times foram estimulados a manter mais diálogo sobre a carreira uma vez a cada três meses. Aprender a manter um diálogo contínuo de maneira eficiente é justamente o objetivo principal do novo treinamento, que já foi realizado com metade da equipe. “A conversa não é mais só sobre o desempenho passado: ela se tornou um acompanhamento mais próximo para garantir que os profissionais saibam o que fazem bem e consigam evoluir no que é preciso melhorar”, afirma Elisa Carra, diretora de recursos humanos da EY.
As mudanças vão ao encontro do que as pesquisas apontam há algum tempo. O acompanhamento anual passou a ser considerado burocrático e demorado demais por uma parcela crescente de funcionários, sobretudo entre os millennials, nascidos depois de 1980. Sedentos por feedbacks mais recorrentes, eles já representam 85% dos funcionários da EY no Brasil. Estima-se que um terço das grandes empresas americanas esteja agora revisando o modelo de avaliação, no sentido de torná-lo mais ágil e contínuo. É uma transição necessária não apenas porque atende a um desejo dos mais jovens mas também porque significa acelerar a formação das pessoas num mundo com mudanças cada vez mais velozes.
“Há uma transformação na própria velocidade das carreiras, nas quais as pessoas se envolvem cada vez mais em projetos mais curtos, muitas vezes em áreas diferentes. Fazer um acompanhamento mais próximo e frequente significa se adaptar a essa nova realidade”, diz Marisabel Ribeiro, gerente da consultoria de recursos humanos da Korn Ferry. “Existe hoje uma necessidade de personalizar o treinamento para torná-lo mais cirúrgico e eficiente”, afirma Iaci Rios, diretora do Erickson College Brasil e da IMR-Coaching & Development.
Mais do que a adoção de novos processos, no entanto, o novo modelo exige uma mudança de comportamento. Na teoria, o chefe que também atua como coach é uma figura desejável desde sempre. Mas toda a estrutura de avaliação de pessoas até agora — boa parte da qual consolidada nos anos 70 — não criava incentivos para que isso acontecesse na prática. O conglomerado industrial americano General Electric, que celebrizou o modelo prevalecente até agora, tornou-se justamente um dos exemplos dessa nova fase.
Em 2015, a empresa anunciou que abandonaria as avaliações anuais para adotar um modelo baseado num aplicativo em que qualquer funcionário pode avaliar outro a qualquer momento. Depois de testar o modelo durante um ano num universo restrito, desde o final de 2016 todos os mais de 100.000 funcionários da empresa no mundo já trabalham dessa maneira. Neste ano, a companhia começou a capacitar os chefes para ouvir as ambições dos funcionários e ajudá-los a desenvolver a própria carreira.
O objetivo é treinar todos os 1.200 líderes de equipe no país. O profissional recebe uma avaliação feita por seu time no momento do treinamento e outra 90 dias depois para checar a evolução. “Para virar a chave, não basta colocá-lo numa sala e treiná-lo por algumas horas”, diz Ana Claudia Manhaes, diretora de desenvolvimento organizacional e talentos da GE. “É preciso convencê-lo de que assim ele será valorizado internamente e ajudará sua equipe a ser valorizada.”
Dar atenção especial a cada funcionário é algo que, no longo prazo, e ao contrário do que pode parecer, toma menos tempo do líder do que a postura inversa. Foi o que observaram os executivos da fabricante de papel e celulose Klabin, que começou a treinar os líderes em técnicas de coaching em 2012, mesmo período em que anunciou um bilionário plano de expansão que dobrou sua capacidade produtiva de lá para cá.
Desde então, o feedback deu lugar às conversas de desenvolvimento — algo que vem sendo batizado com um trocadilho: “feed-forward”, em alusão à projeção de resultados futuros. “Mais preparados, os funcionários se tornam mais independentes e tomam menos tempo do líder na execução das tarefas”, diz Sergio Piza, diretor de gente, gestão, sustentabilidade e comunicação da Klabin.
É um processo que pode levar muito tempo até funcionar na prática entre todos os envolvidos — e também pode custar caro, já que numa grande empresa exige o treinamento de centenas de profissionais. Algumas empresas partiram para um modelo alternativo: formar coaches internos para atender diversos funcionários, mesmo fora de sua equipe. Há quatro anos, 7% dos coaches certificados em associações desses profissionais nos Estados Unidos eram internos, ou seja, contratados por uma empresa para executar o trabalho apenas para seus funcionários. Neste ano, o índice chegou a 10%.
A empresa de tecnologia SAP seguiu o mesmo caminho. A companhia já patrocinou a formação em coaching de dez profissionais brasileiros — e 120 no mundo. Os profissionais formados são aqueles que manifestam interesse no curso e passam por uma seleção realizada pelo time de RH. Eles acumulam a função com a que tinham anteriormente e são listados numa plataforma interna da SAP. O funcionário interessado em sessões de coaching acessa a rede e inicia o contato com o profissional escolhido. “A maior parte dos casos é de funcionários interessados em explorar novas áreas ou que se sentem estagnados”, diz Eliane de Mitry, gerente de recursos humanos da SAP no Brasil.
Em 2015, a farmacêutica brasileira Libbs fez algo semelhante. Hoje quatro funcionários certificados, com dedicação exclusiva à tarefa, acompanham reuniões de diretores e gerentes para avaliar os mais aptos para cada tarefa e ajudam na preparação dos que ainda não estão. A medida ajudou, segundo Madalena Ribeiro, diretora de recursos humanos da Libbs, a diminuir a rotatividade de 17% para 13,5% entre 2015 e 2016. O percentual de funcionários que se dizem engajados também aumentou de 81%, em 2014, para 92%, em 2016. É a demonstração matemática de que esse tipo de investimento pode valer a pena.