Revista Exame

O cartaz e o espaço dos estagiários crescem nas empresas

Grandes empresas criam programas para estagiários tão sofisticados quanto os de trainees. Uma razão: eles são mais fiéis

Estagiários da Avon: a meta é que parte desses jovens ajude a abastecer os 140 principais cargos executivos da empresa nos próximos 15 anos (Alexandre Battibugli/EXAME)

Estagiários da Avon: a meta é que parte desses jovens ajude a abastecer os 140 principais cargos executivos da empresa nos próximos 15 anos (Alexandre Battibugli/EXAME)

DR

Da Redação

Publicado em 10 de julho de 2014 às 09h06.

São Paulo - Desde janeiro, um grupo de 90 universitários tomou conta de diversos departamentos da fabricante de cosméticos Avon, na zona sul de São Paulo. Eles devem ficar ali por dois anos — período em que passarão por até 120 horas de treinamento. No restante do tempo, os jovens vão se dividir entre um projeto individual e o dia a dia em alguma das atividades da companhia.

Tanto para eles como para a Avon, trata-se de algo absolutamente novo. De maneira pouco organizada, a contratação de estagiários sempre foi a única porta de entrada de jovens profissionais na companhia. Mas, até o ano passado, cada área contratava como e quando queria e também decidia livremente a que eles dedicariam tempo­.

Agora todos passam por uma seleção rigorosa, com provas online e presenciais, e enfrentam um cronograma de atividades tão intenso quanto o exigido num programa de trainee. A meta é que parte desses jovens ajude a abastecer os 140 principais cargos executivos da empresa — entre gerentes, diretores e vice-presidentes — nos próximos 15 anos.

“Decidimos investir nos estagiá­rios porque acreditamos que eles conseguirão absorver nossa cultura mais facilmente”, diz Alessandra Ginante, vice-presidente de recursos humanos da Avon no Brasil. “Se conseguirmos reter seis deles por ano na próxima década, o programa já terá sido pago.”

Assim como a Avon, outras grandes empresas passaram a dar a seus programas de estágio o mesmo status que os de trainee. Segundo dados de quatro consultorias especializadas, o número de programas e de vagas para estagiários cresceu quase 200% desde 2009.

“Antes os programas de estágio eram uma espécie de primo pobre dos de trainee”, diz Maíra Habimorad, presidente da Cia de Talentos, consultoria especializada na seleção e no treinamento de jovens profissionais. “Hoje são considerados tão ou mais estratégicos para as grandes empresas.”

Algumas razões explicam a mudança. Uma delas é a percepção de que recrutados com menos experiência tendem a se adaptar mais facilmente à empresa.

“Ao contrário do que acontece com os trainees, os estagiários chegam com menos expectativas dentro da empresa e também são menos disputados no mercado”, diz Iracema Andrade, diretora da consultoria Viva Talentos. “Por isso eles tendem a ser mais fiéis.”

A segunda razão — e não menos importante, sobretudo num momento em que a criação de novas vagas nas empresas tende a diminuir — é que os estagiários custam menos. “Os programas em si exigem um investimento parecido. Mas as bolsas pagas aos estagiários equivalem a um quinto do salário dos trainees”, afirma Manoela Costa, gerente executiva da consultoria Page Talent.

Além disso, no caso dos universitários, há menos encargos trabalhistas — o que encarece bastante a contratação de trainees. No cômputo geral, o custo de um trainee pode chegar a ser até dez vezes maior do que o de um estagiário. Enquanto as vagas para estagiário se multiplicaram, as de trainee encolheram 4,5% em 2013. 

Há casos extremos, como o da siderúrgica ArcelorMittal, que trocou um modelo pelo outro. Em 2010, a companhia encerrou o programa de trainee. Desde então, centrou esforços no programa de estágio — nos últimos dois anos, já recrutou 89 jovens na sede, em Belo Horizonte.

“Concluímos que o custo-benefício de manter estagiários é melhor”, diz Ricardo Garcia, vice-presidente de recursos humanos da ArcelorMittal Brasil. Desde 2012, 41% dos estagiários foram contratados — 64% dos quais continuam na empresa. Segundo Garcia, é uma taxa superior à dos tempos de trainee. Todo o ritual usado para recrutar e capacitar os trainees foi adaptado para os estagiários. 

Além de uma seleção e de um treinamento caprichados, parte fundamental para que um programa dê bons resultados é garantir que o trabalho do estagiário se torne relevante. Só assim é possível acelerar a formação de cada um deles e, ao mesmo tempo, mantê-los estimulados.

A empresa de engenharia Promon, que recruta universitários desde os anos 60, incorporou essa medida em 2010. Desde então, eles participam de dois projetos — um em grupo e outro individual — com o objetivo de resolver problemas específicos. A melhor solução é eleita por uma banca de diretores a cada ano.

Recentemente, um estagiário conseguiu reduzir metade dos custos com a compra de licença de um soft­ware usado para projetos de obras. Nos últimos cinco anos, 90% dos estagiários da Promon foram efetivados.

A fabricante de peças industriais Eaton, que criou um programa com duração de dois anos em 2013, faz o mesmo. “Quase todos os projetos saem do papel”, diz Rodrigo Ronzella, diretor de RH da Eaton para a América do Sul.

Algumas empresas decidiram usar o programa de estágio como uma espécie de preparação para o programa de trainee. A integração entre os dois faz parte dos planos da Avon, por exemplo. Com a conclusão da primeira turma de estagiários, os 20% melhores vão compor a primeira equipe de trainees da companhia.

“Até lá, tanto eles como nós saberemos se existe uma compatibilidade de expectativas das duas partes, o que aumenta as chances de retenção”, afirma Alessandra, vice-presidente de RH da Avon.

Para suprir a demanda por gente mais experiente em sua linha sucessória, a rede de locadoras de automóveis Localiza, com sede em Belo Horizonte, formulou o projeto Jovens Líderes em 2013, um ano depois de montar a primeira turma de seu programa de estágio, que recrutou 44 universitários.

Para participar, os candidatos precisam ter concluído a faculdade dois anos antes e já ter experiência em gestão de equipe em outras empresas. “Precisávamos de resultados rápidos para acompanhar o crescimento da companhia”, diz Daltro Leite, diretor de RH da Localiza.

De 2011 para cá, a empresa abriu 495 novas vagas em meio a uma fase de expansão. Nesse período, as vendas cresceram, em média, 11% ao ano e chegaram a 3,5 bilhões de reais em 2013. No futuro, a ideia é que ex-estagiários possam se candidatar ao programa para veteranos. E, quando isso acontecer, será a melhor evidência de que os planos da Localiza deram certo.

Acompanhe tudo sobre:ArcelorMittalAvonCarreira jovemEdição 106702EmpresasEmpresas abertasEmpresas americanasEstágiosFranquiasGestão de pessoasgestao-de-negociosindustria-de-cosmeticosLocalizaPromonRecursos humanos (RH)Serviços diversosSiderurgiaSiderurgia e metalurgiaTrainees

Mais de Revista Exame

Borgonha 2024: a safra mais desafiadora e inesquecível da década

Maior mercado do Brasil, São Paulo mostra resiliência com alta renda e vislumbra retomada do centro

Entre luxo e baixa renda, classe média perde espaço no mercado imobiliário

A super onda do imóvel popular: como o MCMV vem impulsionando as construtoras de baixa renda