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Acessíveis e fortalecidos, criptoativos conquistam carteira de investidores

A entrada de grandes empresas e investidores institucionais fortalece o bitcoin e outros criptoativos como alternativa de investimento para a pessoa física. Mas é preciso sangue frio para enfrentar a volatilidade e os riscos

 (Bruno Faiotto/Exame)

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Gabriel Rubinsteinn

Publicado em 11 de março de 2021 às 05h14.

Não é só a possibilidade de ganhar dinheiro que transforma algo em um ativo de investimento. Se fosse, jogos de azar e loterias poderiam ser considerados assim, e obviamente não o são. Um investimento precisa, necessariamente, de uma perspectiva de valorização, apoiada em argumentos e dados reais. É por isso que, quando a moeda virtual bitcoin foi lançada, em 2009, com baixíssima liquidez e enormes dificuldades operacionais, ela não era considerada um investimento. Mas o tempo passou e, nesses 12 anos, as coisas mudaram.

Líder de um mercado hoje avaliado em mais de 1,5 trilhão de dólares, o bitcoin se tornou uma poderosa ferramenta. E tem se tornado uma classe de ativos de investimento procurada por um número crescente de investidores — ou pelo menos por aqueles com sangue frio para suportar a alta volatilidade das criptomoedas (como são chamadas as moedas digitais que usam criptografia, como o bitcoin).

Atualmente, esse mercado oferece liquidez e facilidade de acesso. Apenas no Brasil, existem mais de 35 corretoras de criptoativos, que movimentam cerca de 300 milhões de reais por dia, segundo o site Cointrader Monitor, que faz esse acompanhamento. E, além do próprio bitcoin, existem outras criptomoedas e outros ativos com potencial de crescimento.

Isso não livra o investimento de riscos, é claro. Trata-se, ainda, de uma classe de ativos nova, relativamente restrita, volátil e cheia de incertezas. Mas o fato é que, apesar dos altos e baixos, tem ficado claro que o bitcoin e a tecnologia blockchain não vão desaparecer de uma hora para a outra.

“Hoje, quando falamos de cripto, temos uma enorme gama de ativos que podem ser enquadrados na categoria, de moedas digitais a artigos colecionáveis e valores mobiliários”, diz Nicholas Sacchi, head de criptoativos da EXAME.

De um valor de alguns poucos centavos em 2011 para quase 60.000 dólares em fevereiro de 2021, o bitcoin mudou muito desde o seu surgimento, e isso vai além do preço. Sua tecnologia se provou segura e eficiente. E sua escassez e descentralização mostraram que a criptomoeda pode ser uma fonte de proteção contra ativos cujo preço varia de acordo com o humor, ou a caneta, de empresas e legisladores.

Se os criptoativos eram, no início da década passada, uma curiosidade, isso mudou completamente no ano passado, com a entrada de grandes empresas e mais investidores do varejo. Uma pesquisa recente, da plataforma Crypto.com, mostra que há mais de 106 milhões de pessoas operando criptoativos no mundo. O número é significativo quando comparado ao tamanho do mercado alguns anos atrás, mas ainda incipiente diante das centenas de milhões de pessoas que investem em títulos, ações, ouro, dólar e afins.

Em 2017, quando o bitcoin chamou a atenção do grande público pela primeira vez e seu preço chegou a 20.000 dólares, a alta foi impulsionada por pequenos compradores. No ano passado, o movimento foi impulsionado principalmente por empresas e grandes investidores. Não por acaso, o número de carteiras com mais de 1.000 bitcoins (equivalente a cerca de 50 milhões de dólares) atingiu recorde em dezembro.

Gestoras focadas em investidores institucionais, como Grayscale e BitGo, tiveram recorde de aportes. A Grayscale chegou a deter mais de 3% de todos os 18,6 milhões de bitcoins em circulação. “Já existem grandes empresas listadas nas bolsas reportando a posse de bitcoin em seus balanços”, diz Ricardo Dantas, copresidente da ­Foxbit, uma das maiores exchanges (corretoras) de criptoativos do país.

A alta recente teve início com o anúncio do serviço de pagamentos PayPal, em outubro de 2020, de que passaria a oferecer serviços com criptoativos para seus 350 milhões de usuários. Mais tarde vieram empresas como Visa, Mastercard, MicroStrategy, Square e J.P. Morgan, e investidores como Stan Druckenmiller, Paul Tudor Jones, Ray Dalio, entre outros. Em fevereiro, foi a vez de a Tesla anunciar a compra de 1,5 bilhão de dólares em bitcoins, o que levou o preço, mais uma vez, às alturas.

(Arte/Exame)

Os recordes levantaram dúvidas em quem ainda não participa do mercado: será que já é tarde para entrar? A realidade diz que a jornada do bitcoin e dos criptoativos está só começando. “Não é possível prever o que vai acontecer com os preços, mas é notável quanto o mercado está mais maduro, com melhor liquidez, maiores certezas regulatórias. É mais uma motivação para aqueles que acreditam no poder dos criptoativos no longo prazo”, diz Changpeng Zhao, presidente da Binance, a maior exchange de criptoativos do mundo.

No início de março, o Citi GPS, braço de inovações tecnológicas do Citigroup, divulgou um relatório em que afirma que o bitcoin deixou para trás o passado de “aspirante a ativo de investimento”, e que a criptomoeda está perto de um “movimento de adoção massiva”.

Há outra tendência. O perfil dos investidores está mudando. O controle de riquezas está saindo dos baby boomers (nascidos de 1946 a 1964) e da geração X (nascidos de 1965 a meados dos anos 1980), e chegando aos millennials, que vieram ao mundo depois da metade da década de 1980. A mudança geracional favorece o bitcoin. Os millennials são nativos digitais. Logo, é compreensível, e até esperado, que enxerguem o dinheiro digital com naturalidade. Uma pesquisa do deVere Group diz que 70% dos jovens nascidos a partir de 1985 preferem o bitcoin ao ouro, o que dá uma ideia do que vem por aí.

Para os mais otimistas, a tendência é que os criptoativos se consolidem e, em um futuro próximo, sejam parte da rotina. Mas ninguém discorda de que o futuro do dinheiro não está no papel-moeda, mas em transferências instantâneas feitas pelo celular e registradas em redes globais de computadores.


O CRIPTO ENTRA NA CARTEIRA

O investimento em criptoativos está mais acessível e ganha espaço na estratégia de alocação até do investidor do varejo | Guilherme Guilherme

O bitcoin e outros criptoativos estão cada vez menos restritos aos entusiastas do tema. É crescente o número de investidores que decidem alocar parte do patrimônio nesses ativos como estratégia de diversificação e de busca por maiores ganhos. No mundo, essa base alcançou a marca de 100 milhões de usuários em janeiro, o que representou um crescimento de 43% em apenas seis meses.

O Brasil também faz parte do fenômeno. A Foxbit, uma das maiores corretoras de criptomoedas do país, relata a abertura, em média, de 3.500 contas por dia. Há dois anos, o número atingia 150 contas em um dia acima da média, conta João Canhada, presidente da Foxbit. São ativos, no entanto, que não são recomendados para todo mundo. Depende do perfil do investidor e do horizonte do investimento, devido a características como a elevada volatilidade e a baixa correlação com outros mercados.

“Os criptoativos devem ser contabilizados como um misto das caixas de proteção, internacionalização e alto risco do portfólio”, disse Juliana Machado, especialista em fundos da EXAME Invest Pro, em relatório recente sobre ativos cripto. Para quem pretende iniciar o investimento na categoria, ela recomenda alocar 5% do patrimônio para ganhar familiaridade com o comportamento do ativo. E não é necessário comprar diretamente o criptoativo.

Já existem fundos dedicados a alocar parte dos recursos em tais ativos, como o da gestora Hashdex, uma das mais conhecidas do mundo, que tem um produto dedicado ao investidor de varejo. Seguindo as regras regulatórias, o fundo investe até o limite de 20% em tais ativos, limitando os ganhos, mas também os riscos. Mas não são apenas as pessoas físicas que estão aderindo aos criptoativos no país.

Canhada, da Foxbit, diz que empresas passaram a buscar bitcoins para alocar parte do caixa. É o caso da fintech Yubb, que começou a adquirir bitcoins em 2020. O criptoativo corresponde a cerca de 15% do caixa. “Há um potencial muito grande de desvalorização de moedas tradicionais, como dólar e euro, seja por questões econômicas, seja por impressão desenfreada”, diz Bernardo Pascowitch, presidente da Yubb, sobre o racional da escolha. São decisões que se multiplicam motivadas não só pela forte valorização mas também pela adesão crescente, em um círculo que se retroalimenta.

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