Revista Exame

Juntos na LBR para sair do vermelho

Como as ex-concorrentes Bom Gosto e Leitbom pretendem deixar para trás uma era de prejuízos para, finalmente, ganhar dinheiro no mercado de leite com a recém-formada LBR

Fernando Falco (em pé) e Wilson Zanatta, da LBR: quase seis meses de negociação para acertar o papel dos sócios na formação da maior empresa de leite do país (Germano Lüders/EXAME.com)

Fernando Falco (em pé) e Wilson Zanatta, da LBR: quase seis meses de negociação para acertar o papel dos sócios na formação da maior empresa de leite do país (Germano Lüders/EXAME.com)

DR

Da Redação

Publicado em 17 de março de 2011 às 00h00.

Nos últimos anos, duas companhias brasileiras envolveram-se numa disputa feroz para ganhar espaço no mercado de produção e venda de leite — um setor ainda marcado pela fragmentação e que movimenta cerca de 18 bilhões de reais ao ano, segundo dados da Nielsen.

De um lado, estava a Bom Gosto, fundada por Wilson Zanatta, empresário gaúcho que, em apenas três anos, incorporou seis companhias e assumiu a vice-liderança do mercado. De outro, colocavam-se os financistas da GP Investments, que haviam feito sua estreia no setor em 2008 ao comprar a goiana Leitbom.

Depois disso, a GP partiu para a aquisição das marcas Poços de Caldas e requeijão Paulista e se associou com a Laep, dona da marca Parmalat. Em dezembro do ano passado, o caminho das duas companhias se cruzou. Numa fusão em que apenas um dos sócios colocou dinheiro, foi criada a Lácteos Brasil, ou apenas LBR.

O dono do único cheque assinado no negócio foi o BNDES, que já tinha participação na Bom Gosto e aceitou colocar 700 milhões de reais para não diluir sua fatia na nova empresa. Com vendas de 2,8 bilhões de reais em 2010, a LBR já nasce como a maior fabricante de leite do país.

Além de uma chance concreta de ganhar mercado, a fusão é vista tanto pela Bom Gosto como pela Leitbom como uma chance de superar uma fase renitente de maus resultados.Embora os balanços ainda não tenham sido publicados, executivos próximos às duas empresas afirmam que ambas devem registrar prejuízo em 2010.

Ganhar dinheiro nesse setor nunca foi fácil — nem mesmo para companhias grandes e agressivas como Bom Gosto e Leitbom. Com dívidas de 350 milhões de reais em 2009, equivalentes a três vezes sua geração de caixa, a Bom Gosto só manteve o ritmo de aquisições graças à ajuda do BNDES, que investiu 250 milhões de reais na companhia desde 2007.


A Leitbom, sob o controle da GP, somou prejuízos de 370 milhões de reais em 2008 e em 2009. Segundo seus acionistas, a nova companhia formada pela união das duas concilia características que podem mudar essa história. A Bom Gosto é hoje a segunda maior compradora de leite do país, atrás apenas da Nestlé.

Já a Leitbom possui marcas conhecidas nacionalmente, como Parmalat e Poços de Caldas. “Já começamos a integração e, em breve, veremos o efeito disso nos resultados”, diz Zanatta, que divide a copresidência do conselho da LBR com Fersen Lambranho, um dos principais sócios da GP. Além disso, nenhuma delas possui hoje distribuição nacional — mas suas regiões de atuação se complementam. “Nosso maior ganho será levar marcas conhecidas para o país inteiro, com uma rede de abastecimento mais fiel”, diz Fernando Falco, presidente da LBR.

Com cinco sócios envolvidos — somando a família Stuani, ex-dona da Líder (incorporada com a Bom Gosto em 2008), a Laep e o BNDES —, a definição da estrutura acionária da LBR consumiu quase seis meses de negociação. No resultado final, a Monticiano — holding composta pela GP (que detém 40% do capital total) e pela Laep (com os outros 60%) — tornou-se a maior acionista, com 40% das ações da companhia.

Mesmo com um negócio que faturava quase o dobro da Leitbom, Zanatta e a família Stuani ficaram com uma participação menor, de 25%. A explicação está nas dívidas da Bom Gosto, que reduziram seu valor na negociação. No dia a dia, a predominância da GP é clara.

Não apenas Falco, que estava à frente da Leitbom desde 2009, passou a ocupar a presidência da LBR como também quatro diretores, dos cinco da nova companhia, vieram da empresa antes controlada pela GP.

Integração

Numa companhia que nasce tão grande quanto complexa, a nova diretoria começou a trabalhar na integração assim que foi formada, no dia 4 de janeiro. Desde então, um grupo de 40 profissionais de ambas as empresas passou a avaliar suas 30 fábricas, 15 marcas,
6 400 funcionários e 56 000 fornecedores.


Um plano de integração, que poderá envolver demissões e o fechamento de fábricas, deverá estar concluído em abril. Segundo Falco, os ganhos estimados em sinergias podem chegar a 150 milhões de reais por ano. Num sinal inequívoco da influência da GP, a LBR acaba de contratar a consultoria Gradus, tradicional parceira do fundo em processos de integração, para coordenar o andamento do trabalho.

Enquanto estuda a integração, a nova diretoria começa a dar fôlego à expansão da LBR. O centro das atenções é a marca Parmalat, para a qual será destinado um orçamento de marketing de 20 milhões de reais neste ano — o dobro do valor em relação a 2010.

O segundo passo, previsto para maio, é ir além da venda do leite longa vida e lançar produtos mais caros, como iogurtes e achocolatados. Segundo especialistas, essas categorias rendem margens até dez vezes maiores que o tradicional leite de caixinha — e aumentam o poder de barganha dos fabricantes no varejo.

O projeto ganhará força quando a distribuição da marca Parmalat, hoje concentrada no Sudeste, se tornar nacional em abril. Simultaneamente, a LBR pretende estreitar o relacionamento com fornecedores ao levar financiamento e apoio técnico para expandir a produção em até 30% ao ano.

“Nesse setor, poucos conseguem manter uma base fixa de fornecedores”, diz Fabio Chaddad, professor de estratégia do Insper. “Quem mudar esse padrão pode ganhar muito dinheiro.”

Os investimentos planejados para essa nova fase se apoiam basicamente no aporte de 700 milhões de reais feito pelo BNDES. A exemplo do que fez nos últimos anos no mercado de carnes, em que está presente na JBS e na Marfrig, o banco público optou por participar ativamente da consolidação do setor de leite.

Além da Bom Gosto, o BNDES investiu 110 milhões de reais na paulista Nilza, que desde 2009 está em processo de recuperação judicial. “A nova companhia terá um papel importante no desenvolvimento da cadeia do leite, uma boa rentabilidade e a possibilidade de realizar uma abertura de capital até 2014”, afirmou o BNDES, por e-mail, a EXAME.

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