Trem da Ferrovia Transnordestina carregado de brita Local: Salgueiro PE Brasil Data: 201502 Código: 69DM881 Autor: Delfim Martins (Delfim Martins/Exame)
Fabiane Stefano
Publicado em 30 de julho de 2020 às 06h00.
Última atualização em 6 de agosto de 2020 às 14h33.
O panorama do setor ferroviário no Brasil, com obras inacabadas e investimentos em queda, é desolador. Não passa sequer um trem por dia em cerca de 30% da malha de 30.000 quilômetros. Outros 10% estão se deteriorando rapidamente, segundo um levantamento da Confederação Nacional da Indústria.
Em 2019, os investimentos no setor chegaram ao menor patamar dos últimos dez anos, alcançando apenas 3,5 bilhões de reais. Hoje, apenas um terço da malha consegue de fato atender às necessidades de embarque dos principais produtos da pauta de exportações brasileiras, como soja, milho e minérios.
“As amarras da legislação vigente são um dos principais motivos para esse atraso”, diz Diogo Mac Cord, secretário de Desenvolvimento de Infraestrutura do Ministério da Economia.
A pasta considera a questão prioritária. Depois da aprovação do novo marco regulatório do saneamento básico, em 24 de junho, que obriga estados e municípios a abrir concorrência para a participação de empresas privadas nos serviços de água e esgoto, os técnicos do ministério aguardam a votação do projeto de lei que também deve atrair novos investimentos privados para o setor de ferrovias.
Em tramitação no Congresso desde 2018, a expectativa é que a nova legislação que rege o mercado ferroviário seja votada até setembro. O novo marco legal das ferrovias acaba com a obrigatoriedade de licitações.
Seguindo o modelo adotado nos Estados Unidos, em que boa parte das commodities é transportada por 200.000 quilômetros de ferrovias, os operadores do setor precisariam apenas apresentar análises bem-feitas de viabilidade econômica — com base nesses estudos, caberá ao governo autorizar a construção de novos trechos e a remodelação dos antigos.
No modelo atual, o Estado é responsável por todas as análises prévias, que costumam consumir um bom tempo. E os estudos precisam ser aprovados pelo Tribunal de Contas da União, o que pode tornar o processo ainda mais moroso.
“A burocracia e a interferência do Estado afastam o setor privado, da mesma forma como acontecia no mercado de saneamento básico”, diz Mac Cord.
Outra diferença é que, sem a necessidade de licitações, não haveria mais a modalidade da renovação antecipada dos contratos entre as concessionárias e o governo. Hoje, os contratos podem ser renovados por 30 anos, o que proporciona uma boa fonte de arrecadação aos cofres públicos.
No final de maio, o governo federal assinou a primeira renovação antecipada do setor com a Rumo Malha Paulista, postergando até 2058 o contrato que venceria em 2028. Na transação, a União receberá quase 3 bilhões de reais em outorgas.
“A intenção é permitir um desenvolvimento maior do mercado. O governo ganhará com o aumento da arrecadação de impostos e com o crescimento econômico, não com o processo licitatório”, diz Mac Cord.
Segundo estimativas de mercado, investidores brasileiros e internacionais pretendem aplicar recursos da ordem de 50 bilhões a 100 bilhões de reais.
“O setor já está realizando diversos investimentos importantes nas concessões que estão sendo realizadas”, diz Fernando Simões Paes, diretor executivo da Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários (ANTF). Quem sabe livre das amarras da legislação o setor consiga finalmente dar um salto em direção ao futuro?