Revista Exame

Gigantes do varejo também na internet

Depois de quase uma década sem contar com uma presença relevante na web, as maiores varejistas do país finalmente decidem investir no comércio eletrônico — e descobrem que, na rede, a lógica de consumo é bem diferente daquela do mundo “real”

Centro de distribuição da Total Express, em São Paulo: 7 milhões de reais em investimentos para suprir a demanda (Germano Lüders/EXAME.com)

Centro de distribuição da Total Express, em São Paulo: 7 milhões de reais em investimentos para suprir a demanda (Germano Lüders/EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 23 de maio de 2011 às 08h21.

Uma enorme contradição regia até há pouco tempo o varejo brasileiro. Os três primeiros colocados — Grupo Pão de Açúcar, um colosso com 36 bilhões de reais em faturamento, seguido por Carrefour e Walmart, com receitas de 29 bilhões e 22 bilhões de reais, respectivamente — tinham uma presença tímida no comércio eletrônico.

A inércia permitiu que companhias como a B2W, dona dos sites Submarino e Americanas.com, nadassem de braçada no varejo virtual. A situação começou a mudar do ano passado para cá. Segundo dados da consultoria e-bit, o comércio eletrônico cresceu 40% no Brasil em 2010, chegando a quase 15 bilhões de reais em faturamento.

Nesse período, o tíquete médio aumentou 11% — ou seja, os brasileiros não somente estão comprando mais pela rede como também passaram a comprar produtos mais caros. A maior novidade nesse movimento, porém, é que são justamente as grandes redes offline que melhor estão aproveitando o crescimento.

Estima-se que as dez maiores redes de varejo do país tenham encerrado 2010 com um faturamento “virtual” de 4,6 bilhões de reais, ou 31% de todo o e-commerce brasileiro — há três anos, esse número não passava de 2,5 bilhões de reais. “As operações online vão se tornar cada vez mais importantes para o resultado das grandes varejistas”, diz Alessandro Gil, sócio da consultoria Ikeda, especializada em comércio eletrônico.

Poucas empresas investiram tanto para aumentar sua presença na web quanto o Pão de Açúcar. Para dar mais musculatura ao site Nova Pontocom, que reúne as operações online das redes Extra, Ponto Frio e Casas Bahia, o grupo investiu 28 milhões de reais desde 2008.

A maior parte desse dinheiro serviu para unificar seus sete centros de distribuição — a medida permitiu que as três bandeiras tivessem acesso a uma quantidade maior de mercadorias e reduziu o tempo de entrega aos consumidores.

Para atrair os internautas, os três sites passaram a contar com chats ao vivo para fazer esclarecimentos sobre produtos e formas de pagamento, numa clara tentativa de simular o atendimento das lojas offline.


“Precisamos trazer para a internet a mesma confiança que nossas marcas têm no mundo ‘real’ ”, diz German Queiroga, presidente da Nova Pontocom.

Ao longo do ano passado, as visitas aos sites aumentaram 51%, alcançando mais de 14 milhões de visitantes por mês, e o faturamento cresceu 70%, somando 2,7 bilhões de reais — o equivalente a 7,5% das receitas de todo o grupo. Com esse desempenho, a Nova Pontocom chegou à vice-liderança do varejo online no país, atrás apenas da B2W.

Ter uma marca estabelecida no varejo tradicional ajuda na hora de montar uma operação online, mas não é tudo. Um dos maiores desafios enfrentados pelas grandes varejistas é entender como se comporta um cliente virtual. Antes de inaugurar uma loja física, uma rede consegue fazer estimativas de quantas pessoas circularão por ali e quanto desse movimento será convertido em vendas.

Na internet, o tiro é dado no escuro. Segundo dados de uma recente pesquisa realizada pela consultoria Forrester Research em parceria com a IBM, 22% dos internautas trocam de loja antes mesmo de finalizar uma compra pela web.

“Explorar na internet o poder de marcas já consagradas no meio offline nunca foi tão importante”, diz Pedro Guasti, diretor-geral do e-bit. “O que torna esse momento crucial para as líderes do setor.”

Alguns varejistas tradicionais foram recentemente tomados por esse “senso de urgência”. Foi o que aconteceu, por exemplo, com a gaúcha Renner. Até novembro de 2009 a empresa não vendia sequer um par de meias pela internet.

Foi só no final daquele ano que a Renner fez sua estreia no e-commerce, numa iniciativa ainda limitada à venda de três categorias de produto: moda íntima, relógios e perfumaria.

Quase um ano depois, a Renner decidiu surfar para valer a onda do varejo online. Em outubro de 2010, investiu 5 milhões de reais na reformulação do site e lançou a campanha “Uma Renner que nunca fecha”.

Desde então, praticamente todos os 20 000 itens disponíveis nas lojas físicas passaram a ser oferecidos na web. Um estúdio fotográfico foi montado para cuidar da troca diária das vitrines virtuais, simulando o que ocorre nas lojas.


Além disso, cada uma das 136 unidades da rede no país foram preparadas para funcionar como ponto de troca de mercadorias. Com as mudanças, o novo site passou a contar com cerca de 50 000 visitantes diários, um volume 70% maior que o antigo.

O aumento no tráfego teve reflexo direto nas vendas. O percentual de visitantes que realizam ao menos uma compra no site mais que dobrou, alcançando 1,7%.

Para dar conta dessa nova demanda, a Renner alugou, em outubro, um centro de distribuição com capacidade para armazenar 250 000 itens na cidade de Embu, na Grande São Paulo.

A ideia é que, até o final deste ano, a operação de e-commerce corresponda a 3% do faturamento total da companhia, quantia equivalente à de uma loja de altíssimo desempenho.

O avanço das redes tradicionais no universo digital não é exclusividade do mercado brasileiro. O Walmart, maior varejista do mundo, vem testando em 2 500 de suas unidades nos Estados Unidos um novo conceito, batizado de Pick up Today, que permite ao consumidor retirar nas lojas físicas as mercadorias compradas pela internet.

Se for bem-sucedida, a experiência deve chegar ao Brasil em breve. “O futuro do comércio eletrônico está na integração dos canais”, diz Flávio Dias, diretor de e-commerce do Walmart no Brasil. A solução encontrada pelo Walmart pode ajudar a resolver um dos maiores obstáculos das empresas que atuam no varejo virtual: o gargalo logístico.

No Brasil, segundo o Instituto de Logística e Supply Chain, 91% das varejistas terceirizam serviços de transporte — nos Estados Unidos, a taxa é de 77%. Com o avanço recente do e-commerce, faltam hoje no país operadores logísticos qualificados.

A Total Express, por exemplo, responsável por cerca de 20% das entregas de comércio eletrônico no país, teve de investir mais de 7 milhões de reais em 2010 para comprar caminhões, equipamentos e modernizar seus sistemas de TI.

Como a expansão das vendas online deve continuar acelerada, as concorrentes da Total Express precisam fazer movimentos semelhantes se não quiserem perder terreno.

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