Revista Exame

Fora do circuito tradicional, Gabriel Wickbold inova para viver de arte

Gabriel Wickbold correu por fora do circuito tradicional das galerias, ganhou projeção internacional e se tornou queridinho de investidores da Faria Lima

Gabriel Wickbold: 
obras vendidas na própria galeria por até 145.000 reais (Leandro Fonseca/Exame)

Gabriel Wickbold: obras vendidas na própria galeria por até 145.000 reais (Leandro Fonseca/Exame)

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GabrielJusto

Publicado em 16 de setembro de 2021 às 05h39.

"Como em qualquer negócio, não existe um espaço para novos entrantes. Ele precisa ser criado.” A frase de efeito poderia ter saído da boca de qualquer coach palestrante, mas foi dita por um fotógrafo. Aos 36 anos, Gabriel Wickbold não poderia se encaixar melhor na definição de self-made man. Há quem pense, é claro, que o sobrenome o ajudou — o que não é exatamente uma mentira.

Mas, ao deixar a tradição familiar octogenária da panificação para se aventurar no universo artístico, Gabriel realmente precisou desbravar o próprio caminho. Pai aos 23 anos, “teve um choque de fazer as coisas acontecerem” e entendeu que os caminhos tradicionais da arte não eram para ele.

“Desde cedo entendi que, para viver de arte, eu precisava trabalhar com a arte, e não apenas criá-la. E, para isso, eu precisava criar um negócio: minha própria galeria”, lembra ­Wickbold. No controle de todas as etapas de seu trabalho, da concepção criativa à comercialização, Gabriel passou a correr por fora do mercado de arte tradicional, em que os artistas são sempre representados por galerias. Junto com outros artistas, que convidou para sua própria, passou a participar de feiras e chamar a atenção de um público que ansiava por uma arte mais eye candy, um “doce para os olhos”, como ele mesmo define. Algo que salte aos olhos e que, de alguma forma, se relacione com o interlocutor.

“Sempre busquei fazer um trabalho de fácil entendimento, porque, quanto mais desmitificado o processo da arte, mais pessoas são alcançadas. E acabei atraindo novos colecionadores”, explica Wickbold, que, pouco a pouco, foi caindo nas graças dos faria limers, como o empresário Tallis Gomes, fundador da Easy Taxi e colecionador de fotografias. Em sua casa, entre cliques de Marius Sperlich, David Yarrow e Christy Lee Rogers, estão cinco trabalhos de Wickbold. “Sou fã das obras dele pela originalidade e porque ele reflete o Brasil. É uma linha fotográfica muito colorida, muito expressiva”, conta Gomes, sem se esquecer do potencial de valorização dos trabalhos de Wickbold. “Tenho obras dele que já triplicaram de preço. Talvez sejam as que mais valorizaram na minha carteira.”

Sem intermediários, Wickbold criou seu próprio processo de certificação e venda. Suas séries fotográficas são divididas em cinco tiragens, de 45.000 a 150.000 reais. “Quando entendemos que o artista e o empreendedor caminham lado a lado, as duas partes saem ganhando. Sempre distingui muito bem meu trabalho de criação e de empreendedorismo”, explica Wickbold. “Uma galeria é como uma startup, que precisa de gestão, planejamento, estratégia.”

A abordagem de Wickbold lembra a do americano Jeff Koons, que, com suas esculturas em aço brilhante em formato de animais de bexiga, se tornou queridinho em Hollywood. E também o artista vivo mais caro do mundo — em 2019, uma de suas peças foi leiloada por 91 milhões de dólares. Antes da fama, Koons almejava ir além da bolha da arte e criticava o mercado tradicional. Para muitos, seu trabalho é brega, mercantilista e pobre de significados. Para outros, resultado de uma ousadia criativa que rejeita o estabelecido.

Para o curador e pesquisador Marcello Dantas, que organizou uma mostra individual de Wickbold no Museu de Arte Brasileira da Faap, em São Paulo, o que acontece entre o fotógrafo e a arte convencional é um caso de rejeição mútua. “Normalmente, o artista fica numa situação de passividade, esperando ser escolhido. Gabriel não teve essa paciência, foi abrindo as portas com as próprias mãos. Quem está dentro do mundo da arte vai rejeitar quem rejeita esse sistema”, diz Dantas, refutando que Wickbold seja um Romero Britto da fotografia ao lembrar, por exemplo, uma série em que ele colocou grilos para comer suas fotos, em uma crítica à paranoia da perfeição. “Isso está dentro da definição de arte contemporânea. É um trabalho redondo, com boa pesquisa, que seria válido em qualquer sistema de referência. Como ele tem o próprio sistema, às vezes não é lido assim. Mas ali há valor.”

Alheio a julgamentos, Wickbold comemora a valorização de seu trabalho. No ano passado ele se tornou embaixador da BMW, marca com a qual ele tem cocriado modelos customizados e certificados em NFT e cuja receita será revertida à formação de novos artistas. “Ele representa nossa marca com muita personalidade e sofisticação”, elogia Jorge Junior, head de marketing da BMW do Brasil. O Erarta Contemporary Art Museum, de São Petersburgo, na Rússia, adquiriu recentemente 15 obras da série I’m Light para sua coleção permanente e promoverá, em julho de 2022, uma exposição individual com quase 50 cliques do brasileiro. “Sempre sonhei em colocar o artista nesse lugar de autossuficiência. A gente vai sonhando mas também vai realizando”, finaliza Gabriel Wickbold.

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