Revista Exame

A GE fez sua parte para empurrar o Brasil. Mas o país...

Poucas empresas apostaram tanto no crescimento do Brasil quanto a americana General Electric. O problema é que o país não colaborou — e a empresa teve problemas em suas principais áreas de negócio

Fábrica de turbinas da GE: a empresa perdeu um contrato com a Embraer (Germano Lüders/EXAME)

Fábrica de turbinas da GE: a empresa perdeu um contrato com a Embraer (Germano Lüders/EXAME)

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Da Redação

Publicado em 9 de abril de 2014 às 20h46.

São Paulo - Jeff Immelt, presidente mundial do conglomerado americano General Electric­ (GE), sempre foi um otimista convicto com o Brasil. Sua primeira visita, em 2005, encerrou um período de 25 anos sem que um presidente da empresa viesse ao país — seu antecessor, o mítico ­Jack Welch, basicamente ignorava o Brasil.

Desde então, Immelt sempre disse que o país era um de seus mercados mais promissores. Em 2011, o otimismo chegou ao ápice. Immelt foi o primeiro empresário a ser recebido por Dilma Rousseff após sua eleição. Anunciou que investiria 500 milhões de reais em um centro tecnológico a ser construído no Rio de Janeiro — um dos seis em todo o mundo.

O Brasil tinha se tornado o terceiro maior mercado para a GE — atrás de Estados Unidos e China. A economia do país havia crescido 7,5% em 2010, e o governo prometia investir 1,6 trilhão de dólares em infraestrutura até o fim de 2014.

Um dos maiores conglomerados do mundo, com receita de 140 bilhões de dólares em áreas que vão de petróleo a transportes, a GE parecia ser a empresa certa, no lugar certo. Mas, três anos depois, quase nada saiu como o previsto. A GE até fez sua parte para empurrar o Brasil. Já o Brasil...

A última visita de Immelt ao país, no fim de março, é simbólica. O plano inicial era que ele viesse cortar a fita do centro de pesquisas, cuja inauguração já havia sido adiada duas vezes. O convite chegou a ser enviado à presidente Dilma.

O centro teria até 250 pessoas, grande parte delas cientistas pesquisando novas tecnologias, principalmente para a exploração de petróleo. Mas a abertura foi adiada novamente. Em vez de fazer bonito com a presidente, Immelt foi a Brasília dizer que o Brasil ainda é prioridade.

Além do centro de inovação, a empresa enfrenta dificuldades em áreas como petróleo, transporte e aviação, que respondem por metade da receita no país. A GE não concedeu entrevista.

Em grande medida, a empresa foi vítima de um Brasil que não aconteceu. Como se sabe, de 2011 a 2013, o crescimento do país foi pífio. E alguns dos setores prioritários para a GE sofreram ainda mais. No setor de petróleo, todas as fornecedoras da Petrobras penam para atender às exigências de conteúdo nacional que o governo impôs. E a estatal é a maior cliente da GE no Brasil.

“Havia uma euforia generalizada com o pré-sal. Agora muita gente diminuiu o ritmo”, diz Maurício Guedes, gestor do parque tecnológico do Rio de Janeiro, onde fica o centro de inovação da GE. Diante do baixo-astral generalizado no setor de óleo e gás, a GE parece não ter pressa para inaugurar o centro de inovação.

Durante os tempos do Brasil maravilha, a GE também apostou alto nas empresas de Eike Batista. Em maio de 2012, anunciou um investimento de 300 milhões de dólares na compra de participação de 0,8% do capital do grupo EBX. Um bom relacionamento com o grupo poderia beneficiar a GE em projetos de petróleo e gás e geração de energia.


Isso, claro, se tudo desse certo com Eike, e não foi esse o caso. No segundo trimestre de 2013, a GE reconheceu em seu balanço que perdeu 108 milhões de dólares com a queda no valor das empresas de Eike.

Além da perda contábil, a GE se tornou um dos principais credores da OGX por causa de equipamentos não pagos. Conseguiu receber uma parte em março, quando a petroleira OGX pagou cerca de 75 milhões de reais a um grupo de fornecedores encabeçado pela GE.

Em outros mercados, houve uma combinação de crescimento abaixo do esperado e concorrência maior — afinal, a GE não foi a única multinacional a mergulhar em países emergentes na última década. Na divisão de transportes, a produção anual de locomotivas na fábrica de Contagem, no interior de Minas Gerais, caiu de 116 em 2011 para 50 unidades em 2013.

Em 2008, com a produção no limite, a empresa investiu 35 milhões de dólares para ampliar a capacidade da unidade. Desde então, sofre com a concorrência da americana Caterpillar, que há dois anos produz locomotivas na cidade vizinha de Sete Lagoas — perto o suficiente para se beneficiar da cadeia de fornecedores que a GE construiu ao longo de 50 anos na região.

“O mercado não cresceu e as encomendas foram divididas”, diz Vicente Abate, presidente da Associação Brasileira da Indústria Ferroviária. Mas talvez o pior baque tenha acontecido no mercado de aviação. Em 2013, a empresa perdeu para a americana Pratt Whitney a concorrência para ser a fornecedora de turbinas da nova família de jatos da Embraer, num contrato de 600 milhões de dólares anuais.

Desde 1999, a GE forneceu turbinas para mais de 1 000 aeronaves da Embraer. Somando todas as dificuldades, a GE não cresceu no país em 2013 — o faturamento repetiu 2012, na casa dos 3,3 bilhões de dólares. A meta era crescer mais de 10%. 

Não é, claro, um pesadelo. Muitos dos principais negócios da GE têm maturação longa. Mas a pressão por redução de custos é imediata. Segundo executivos da empresa, em algumas áreas a meta é cortar mais de 25% os custos administrativos em 2014.

Em julho de 2013, a GE transferiu a maior parte de seus funcionários administrativos para um novo edifício, em São Paulo, com o objetivo de economizar 30 milhões de reais em dez anos. A oferta de carros para os executivos foi reduzida e até o plano de saúde piorou.

É bem verdade que, em momentos de aperto em alguns negócios, a diversificação da GE vira um trunfo. A Celma, especializada na manutenção de turbinas de avião, já fatura mais de 1 bilhão de dólares. A divisão de equipamentos médicos fez duas aquisições desde 2012.

A empresa também ampliou sua fábrica de equipamentos para energia eólica em Campinas e anunciou a construção de outra para o Nordeste. Mas, passada a euforia com o Brasil, a GE já tem um novo mercado favorito: a África. Aos acionistas, Immelt disse que a meta é crescer 30% ao ano no continente. O Brasil não ajudou a GE — é natural que, daqui para a frente, a GE nos ajude um pouco menos também.

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