Revista Exame

Fernando Bertin, o ex-caubói

Ao longo de mais de três décadas, o empresário Fernando Bertin se dedicou a ganhar dinheiro com compra e venda de gado. Após a incorporação do frigorífico Bertin pelo JBS-Friboi, ele agora se prepara para investir em algo bem diferente - energia

Fernando Bertin: do interior de São Paulo para os Estados Unidos atrás de investidores (Alexandre Battibugli/Exame)

Fernando Bertin: do interior de São Paulo para os Estados Unidos atrás de investidores (Alexandre Battibugli/Exame)

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Da Redação

Publicado em 25 de junho de 2012 às 14h46.

São Paulo - O empresário Fernando Bertin ingressou cedo nos negócios do campo. Nono de uma família de dez irmãos, ele começou a trabalhar aos 17 anos no frigorífico que o irmão Henrique montara na cidade de Lins, no interior de São Paulo, em 1977. Do abate, passou para compra e venda de gado até se tornar presidente da companhia, em janeiro de 2009.

Tudo mudou nos últimos seis meses. Em setembro do ano passado, o negócio de carnes da família Bertin, então o segundo maior do país, com faturamento de 6,6 bilhões de reais, e suas áreas de couros e lácteos foram incorporados pelo JBS-Friboi. Na negociação, os Bertin ficaram com 40% da holding que controla a nova empresa e uma vaga no conselho, mas foram afastados da operação.

Aos 50 anos de idade, Fernando hoje passa pelo menos quatro dos cinco dias úteis da semana em reuniões em escritórios de São Paulo - um hábito novo para quem, até pouco tempo atrás, raramente se afastava de Lins. Viagens internacionais para Estados Unidos, Ásia e Europa agora são agendadas pelo menos duas vezes por mês.

No exterior, Fernando Bertin busca investidores e tenta aprender mais sobre o novo negócio ao qual sua família pretende se dedicar - o de energia. "Vamos investir para ser um dos maiores geradores privados de energia do país", diz ele.

Com cinco pequenas centrais hidrelétricas e participação em duas termelétricas, os negócios de energia do grupo faturam 375 milhões de reais por ano - cerca de 25% menos que as receitas de suas marcas de xampu e sabonete, como OX e Francis, que ficaram de fora do negócio com o JBS.

Mas na miríade de atividades do grupo - são sete ramos de atuação, que, juntos, faturam 2,6 bilhões de reais e vão de saneamento básico a concessão de rodovias - nenhuma merece tanta atenção quanto a de energia. Nos próximos quatro anos, o grupo deve investir 3,5 bilhões de reais em projetos já contratados de 11 termelétricas e na expansão de usinas de açúcar e álcool.

Em paralelo, já estão em análise cerca de outros 40 projetos de usinas eólicas e hidrelétricas de pequeno e médio porte. Com planos nada modestos, Fernando Bertin pretende montar uma estrutura capaz de gerar 6 500 MW até 2013 - equivalente ao potencial atual da Tractebel Energia, maior geradora privada do país.


Diferentemente de outros frigoríficos, como JBS ou Marfrig, que se mantiveram na área de alimentos, o Bertin sempre teve um portfólio de negócios diversificado. O de geração de energia surgiu de maneira despretensiosa alguns anos atrás.

Em 2003, ainda sob a ressaca do apagão que assustara o setor industrial dois anos antes, o Bertin iniciou a construção de sua primeira pequena central hidrelétrica, em Mato Grosso, com o objetivo de se tornar autossuficiente em energia.

Aos poucos, a atividade ganhou importância - e dois anos depois foi criada a holding Gaia, que hoje controla cinco pequenas centrais hidrelétricas nos estados de Mato Grosso, São Paulo e Pará. "Logo percebemos que esse era um setor com grande potencial de crescimento e começamos a investir mais e mais dinheiro e atenção", afirma Fernando.

O passo determinante para garantir escala ao negócio foi dado em setembro de 2008, com a formação de um consórcio entre o Bertin e o grupo paulista Equipav, controlado pelas famílias Toledo, Tarallo e Vetorazzo. Na época, o consórcio venceu dois leilões para erguer 21 termelétricas até 2013.

Com as dificuldades da Equipav, que culminaram com a venda de suas usinas de açúcar e álcool para o grupo indiano Shree Renuka, em fevereiro, o Bertin ficou com a missão de entregar seis termelétricas na Bahia até janeiro de 2011, que devem consumir 3 bilhões de reais em investimentos nesse período - e outras cinco que devem iniciar a operação até 2013. (Segundo Fernando, o destino das demais usinas ainda deverá ser negociado com a própria Equipav neste ano.)

"Colocar essas usinas em operação dentro do prazo será fundamental para o Bertin mostrar que a energia se tornou de fato um negócio prioritário para a empresa", afirma Silvio Areco, diretor executivo da Andrade e Canellas, consultoria especializada no setor energético.

Ao mesmo tempo que ergue termelétricas e administra pequenas hidrelétricas, o Bertin tenta avançar no mercado de etanol. Até pouco tempo atrás, o grupo possuía apenas uma participação em uma usina em Mato Grosso. Em março deste ano comprou 70% do controle da Infinity Bio-Energy, com aporte de 180 milhões de reais no caixa da empresa, que está em recuperação judicial desde maio de 2009.

Os planos do grupo são expandir a capacidade de moagem atual, de 11 milhões de toneladas de cana por ano, para 25 milhões de toneladas até 2014 - o que o colocaria na quarta posição do setor no ranking atual. "Vamos fazer novas aquisições nos próximos meses", afirma Fernando.


Após a compra da Infinity, o engenheiro José Malta, presidente de operações da empresa até a aquisição pelo Bertin e ex-presidente mundial da área de equipamentos para hidrelétricas da multinacional GE entre 2004 e 2008, foi contratado para comandar a Bertin Energia, criada formalmente em janeiro.

Ao assumir o cargo, Malta recebeu duas missões. A primeira é organizar os diversos investimentos que o grupo fez até agora sob uma única empresa - uma tarefa que deverá ser cumprida em etapas. A segunda, mais crítica, é captar dinheiro para dar fôlego à expansão.

"Estamos prestes a fechar com um parceiro estratégico, que já opera em energia, para ser nosso sócio minoritário em investimentos novos", diz Fernando. A medida mais relevante nesse sentido, porém, será a abertura de capital da Bertin Energia, programada para quando as primeiras termelétricas entrarem em operação, em janeiro de 2011.

Vencer esses desafios internos será fundamental para dar ao Bertin a musculatura necessária para disputar um mercado cada vez mais povoado. Pelo menos três empresas recém-criadas com projetos em energia limpa pretendem abrir o capital na bolsa neste ano. Juntos, seus investimentos somam 5 bilhões de reais.

Fernando Bertin rebate com o velho discurso de que há espaço para todos. Quando suas 11 termelétricas entrarem em operação, diz ele, as receitas alcançarão 1,5 bilhão de reais por ano. Nesse caminho rumo ao crescimento, Bertin também conta com o aumento da procura por energia.

Para os próximos quatro anos, a expectativa é que a demanda cresça 22% - o que deve exigir 16,1 bilhões de reais por ano em investimentos apenas em geração. "Apesar da retomada das grandes obras de energia, como as hidrelétricas na Região Norte, as empresas menores terão o papel fundamental de complementar a oferta de geração", diz Walter Vitto, analista de energia da consultoria Tendências. Os Bertin, em sua nova roupagem no mundo dos negócios, apostam nisso.

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