Maurice Obstfeld, do FMI: “A regulação do comércio mundial é um bem precioso, que promoveu o crescimento e a abertura” (Guillermo Gutierrez/Getty Images)
Flávia Furlan
Publicado em 1 de fevereiro de 2018 às 05h43.
Última atualização em 3 de agosto de 2018 às 09h06.
O atual ciclo de crescimento global abre uma oportunidade para os governos das maiores economias elaborarem novas políticas que reduzam a desigualdade de renda. A opinião é de Maurice Obstfeld, economista-chefe do Fundo Monetário Internacional, uma das vozes mais influentes na economia global. “É importante que os governos invistam em capital humano, criando oportunidades para os trabalhadores desenvolverem as habilidades adequadas aos empregos de maior remuneração”, diz.
O que explica a aceleração da economia global depois de anos de crescimento baixo?
O crescimento global realmente pegou ritmo e começou a ganhar força no ano passado. É uma recuperação que parece, agora, ser a maior expansão global desde a crise financeira que teve início em 2008. Só que o avanço não acontece por acidente. Houve uma melhora gradual desde a crise. O processo foi reforçado pela manutenção, durante um longo período, de políticas monetárias e fiscais de estímulo, especialmente nos países desenvolvidos. Já na China o crédito foi ampliado, o que ajudou a impulsionar um crescimento no leste da Ásia e também a levantar o preço das matérias-primas. Com isso, os demais países emergentes também estão se dando bem.
Este ritmo de crescimento é sustentável?
Está claro que o mundo está crescendo acima do potencial de longo prazo. A divergência é mais óbvia nas economias desenvolvidas. Para esses países, estimamos que o potencial de crescimento sem gerar inflação seja de 1,5%, mas eles devem crescer 2,3% em 2018.
Houve redução do potencial de crescimento com equilíbrio?
No caso das economias avançadas e dos países de baixa renda exportadores de petróleo, sim. Nas economias ricas, o envelhecimento da população e o baixo crescimento da mão de obra e da produtividade trazem dúvidas sobre o potencial futuro. É importante ressaltar, no entanto, que, para a maioria dos emergentes que não são exportadores de petróleo, projetamos que o futuro será um pouco melhor em termos de crescimento da renda per capita. Isso é fruto das reformas econômicas realizadas para dar mais abertura ao comércio mundial.
O aumento do protecionismo atrapalha esse processo?
Há muito debate sobre uma eventual guerra comercial entre as grandes economias. Mas até agora vimos mais retórica do que ação, sem grandes efeitos negativos sobre as trocas de produtos e serviços. Não queremos, contudo, ser complacentes. A regulação do intercâmbio, centrada na Organização Mundial do Comércio, é um bem precioso, que promoveu o crescimento e a abertura durante todo o período do pós-guerra. As tentativas de sabotar seu funcionamento serão prejudiciais para todos os lados.
A nova fase de expansão pode barrar o aumento da desigualdade no mundo rico?
A expansão do crescimento contribuirá para maiores aumentos salariais, beneficiando os que têm menores rendimentos. Dito isso, a evolução da desigualdade de renda nos próximos anos vai depender das políticas governamentais. É importante que os governos de todo o mundo invistam em capital humano, criando oportunidades para os trabalhadores desenvolverem as habilidades adequadas aos empregos de maior remuneração. O atual ciclo de crescimento é o momento ideal para os governos fazerem esse investimento de longo prazo.
Quais reformas estruturais estão faltando?
Políticas que promovam competição, que dissipem os monopólios e beneficiem o consumidor com preços menores. Políticas para reduzir a disparidade entre trabalhadores formais e informais — o que é uma grande barreira para o crescimento e para a redução da desigualdade na América Latina — poderiam ajudar bastante. Além disso, é preciso ampliar a participação feminina no mercado de trabalho e reduzir as diferenças de salário entre homens e mulheres.