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Como uma empresa suíça, uma cooperativa, um banco e 60 prefeituras querem mudar o clima no agro

Projeto piloto será desenvolvido no Paraná com 1,65 milhão de hectares; meta é alcançar 6 milhões de hectares em um ano

Lavoura no Paraná: o projeto rede colaborativa pretende monitorar em tempo real 6 milhões de hectares em um ano (Flavio Benedito Conceição/Getty Images)

Lavoura no Paraná: o projeto rede colaborativa pretende monitorar em tempo real 6 milhões de hectares em um ano (Flavio Benedito Conceição/Getty Images)

César H. S. Rezende
César H. S. Rezende

Repórter de agro e macroeconomia

Publicado em 22 de maio de 2025 às 06h00.

Última atualização em 22 de maio de 2025 às 06h35.

Da seca extrema que afetou o plantio da soja em Mato Grosso no início da safra 2024/25 ao excesso de chuvas que atrapalhou a colheita do grão no Rio Grande do Sul, está cada vez mais complexo prever se fará sol ou chuva — e em qual intensidade — em tempos de mudanças climáticas.

Em busca de dados mais precisos, a Cocamar ­Cooperativa Agroindustrial, com sede em Maringá, no Paraná — começou a implementar uma rede colaborativa de previsão climática.

O projeto é coordenado pela Meteoblue, empresa suíça de previsão do tempo, e conta com a parceria do governo do Paraná, da cooperativa financeira Sicredi e de 60 municípios paranaenses. Estão sendo instaladas 206 estações meteorológicas em uma área de 1,65 milhão de hectares, com a meta de alcançar 6 milhões de hectares em um ano.

“A estrutura do projeto é fazer uma rede de alta densidade. Uma empresa, uma prefeitura ou um fazendeiro não teria condição de montar uma rede dessa sozinho”, afirma Waldomiro Freire de Lima Junior, diretor-executivo da Meteoblue Brasil.   

O Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), ligado ao Ministério da Agricultura e Pecuá­ria (Mapa), fornece informações climáticas. “Mas os equipamentos são mais antigos, não garantem a precisão necessária para o setor e ainda são insuficientes”, diz Luiz Lourenço, presidente do conselho de administração da Cocamar.

A Meteoblue estima que o Brasil tenha apenas 10.000 estações para medir clima. Nos Estados Unidos, país comparável em tamanho e em produção agrícola, o número ultrapassa 100.000.

Segundo o executivo, a instalação da rede pode orientar produtores no planejamento das lavouras, auxiliar gestores públicos na programação de obras, subsidiar cooperativas de crédito e apoiar a defesa civil no monitoramento de eventos extremos.

“Não se trata de um serviço meteorológico comum, e sim da implantação de uma sofisticada estrutura que ainda não existe nem no Brasil nem na América Latina, capaz de elevar o nível de informações nessa área a um novo patamar”, afirma Divanir Higino, presidente executivo da Cocamar.   

Cada ponto de monitoramento tem um medidor de volume de chuva de alta precisão, termômetro eletrônico e sensores de umidade e de vento. A vantagem da rede colaborativa está no nowcasting, técnica que permite prever não apenas se vai chover, mas exatamente quando e com que intensidade. No projeto, as informações sobre o tempo serão atualizadas a cada 15 minutos.

“Esse processamento, que recalcula as previsões, é fundamental em um país tropical como o nosso, onde o clima muda rapidamente”, diz Lima Júnior.

Com a proposta, a rede gerará dados que serão enviados para a sede da Meteoblue na Suíça, onde serão cruzados com imagens de satélite e modelos meteorológicos, permitindo recalibrar as previsões em tempo real com o uso de inteligência artificial.

Os dados ficarão disponíveis nas plataformas da cooperativa, das prefeituras e em aplicativos. As operações devem começar em agosto, com custo anual de até 5 milhões de reais, rateados entre todos os integrantes do projeto. 

A iniciativa chamou a atenção de Gabriel Fachiano, prefeito de Santo Antônio do Caiuá, cidade de 2.500 habitantes no Paraná, onde a economia é dominada pelo agro, com a produção de cana-de-açúcar, mandioca e a criação de gado de corte e de leite.

Entre 2021 e 2022, o município sofreu com eventos climáticos extremos, o que afetou quase todos os produtores. “Vejo na rede colaborativa uma ferramenta importante para nossa gestão, uma forma de mitigar prejuízos e alertar a população com antecedência”, diz o prefeito.

Segundo a Meteoblue, o Paraná é apenas o começo. Há conversas avançadas com alguns estados para replicarem o projeto, como Santa Catarina. A meta é levar a proposta para todo o Brasil — e há clima para isso.

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