Revista Exame

A Claro precisa ser líder

João Cox recebeu de Carlos Slim a missão de levar a Claro à liderança -- e o mexicano separou 8 bilhões de dólares para ajudar na empreitada

O presidente João Cox: de olho na alta renda

O presidente João Cox: de olho na alta renda

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Da Redação

Publicado em 15 de março de 2011 às 10h44.

Em agosto, quando deu ao executivo João Cox a missão de levar a operadora Claro à liderança do mercado nacional de celulares, o magnata mexicano Carlos Slim Helu ofereceu a ele dois caminhos distintos.

O primeiro dispensaria qualquer esforço da parte do executivo recém-chegado. Slim, o terceiro homem mais rico do planeta, já preparava um cheque de 8 bilhões de dólares para abreviar a escalada de Cox rumo à liderança. No início de novembro, o mexicano fez uma oferta para a compra da rival TIM, segunda colocada no mercado brasileiro.

Se aceita pelos italianos, a manobra pode colocar a Claro -- hoje na terceira posição -- na liderança absoluta do mercado, com participação superior a 45%. A Vivo, atual líder, tem 30% do mercado nacional. O outro caminho (aquele que não conta com os generosos bilhões de Slim) é incrivelmente trabalhoso.

Para chegar ao primeiro lugar, o dono da Claro encomendou a Cox a repetição do trabalho que fez na Telemig, quando a operadora mineira realizou um feito raro no setor: crescer e ganhar dinheiro simultaneamente. "Minha missão é fazer da Claro a líder em rentabilidade e número de clientes", diz Cox. "E isso independe da aquisição de qualquer outra operadora."

Ao mesmo tempo, foi feita uma modernização nos sistemas de transmissão de dados que permitiu uma economia importante nos custos operacionais. Depois de acumular seguidos prejuízos operacionais, a Claro voltou ao azul -- um azul-clarinho, é verdade. Sua geração de caixa de janeiro a setembro somou 730 de milhões de dólares, a melhor desde sua criação, em 2003. Embora seja um avanço significativo, o resultado atual ainda está longe do desempenho dos concorrentes. A Claro hoje apresenta um dos piores índices de rentabilidade do setor: em torno de 12%, a metade da média do mercado.

"A operadora tem uma das maiores bases de usuários de celular pré -pago do país. Esses clientes geram uma receita baixíssima", afirma Luís Minoru, diretor da consultoria Yankee Group, especializada em telecomunicações.Embora complexa, a tarefa de Cox foi facilitada pela reestruturação pela qual a Claro passou nos últimos meses, processo que começou antes de sua chegada. Com base em promoções agressivas, a companhia aumentou sua base de clientes em 25% e atingiu 22 milhões de usuários. 


Assim que recebeu a missão de Slim, João Cox iniciou uma mudança na trajetória histórica da Claro. Até então, a empresa vinha apostando tudo na venda de celulares mais populares -- estratégia que lhe garantiu boa penetração no mercado, mas sacrificou sua rentabilidade.

A mudança não se dá apenas por uma iluminação estratégica dos executivos da empresa, que teriam descoberto a fórmula mágica para ganhar dinheiro: o mercado popular, que impulsionou a Claro, simplesmente parou de crescer. E é consenso entre os especialistas que a situação assim permanecerá. O mercado de celulares no Brasil, que vinha crescendo a taxas superiores a 30% ao ano, tem hoje 95 milhões de usuários, patamar que é considerado uma espécie de limite.

A expansão, a partir de agora, será menor -- algo em torno de 15% anuais. "O crescimento das operadoras terá de vir da expansão dos serviços", afirma Carlos Constantini, analista de telecomunicações do Deutsche Bank.

O novo cenário traz um imenso problema para Cox. Para lucrar e crescer, ele terá de incomodar num terreno dominado pelas concorrentes: o mercado de alta renda. E, segundo os analistas, isso só será possível reposicionando a marca -- livrando-a do estigma da simplicidade dos aparelhos e da baixa qualidade dos serviços.

"Agora, queremos investir com força em produtos e serviços mais sofisticados", afirma Roberto Guenzburger, diretor de marketing da companhia. Para penetrar no público classe A, a Claro contratou uma consultoria especializada na produção de festas e badalações de diversos tipos. Sua primeira ação foi reunir cerca de 500 pessoas -- entre celebridades e empresários -- na Casa Fasano, espaço para eventos de alto luxo no bairro do Itaim, na zona sul de São Paulo.

O objetivo da boca-livre da Claro era apresentar seu mais recente lançamento: um serviço que disponibiliza dez canais de TV a cabo pelo celular, como CNN e Discovery. As concorrentes também já oferecem a TV por celular, mas há apenas um canal disponível. "A Claro está de olho nos nichos das concorrentes. Celebridades e clientes corporativos sempre foram cativos de Vivo e TIM", afirma um fornecedor.

Para turbinar o crescimento das vendas do novo (e rentável) serviço, João Cox costurou um inédito acordo com a finlandesa Nokia, a maior fabricante de celulares do mundo: a empresa se compromete a trazer ao Brasil um aparelho capaz de oferecer a TV por celular a um preço acessível. O resultado foi o lançamento de um smartphone (aparelho celular com acesso à internet) por 299 reais -- valor cerca de três vezes menor que a média do mercado.

Especula-se entre os concorrentes que o subsídio dado na venda de cada aparelho supere em muito os 300 reais. "Não vamos ganhar dinheiro com o aparelho, mas com o serviço. Esse é o pulo-do-gato para atingir rentabilidade", afirma Cox. (O serviço prestado através do smartphone sai por cerca de 170 reais mensais para o usuário.


Um pré-pago gera míseros 20 reais.) Até agora, a estratégia fez um sucesso estrondoso. O primeiro lote de aproximadamente 100 000 aparelhos sumiu das lojas em poucos dias -- o que chamou a atenção dos concorrentes. A TIM já estuda o lançamento de serviço semelhante até o final do ano. A dúvida dos analistas é se o preço do aparelho da operadora italiana será tão competitivo quanto o da mexicana.

Mais do que simplesmente contar com receitas mais polpudas, a grande batalha das operadoras é pela manutenção da carteira de clientes -- a fidelização, no jargão do setor. Diante desse cenário, o histórico de Cox faz diferença. Quando dirigia a Telemig, ele foi o primeiro no Brasil a criar um plano de fidelidade para os clientes da operadora baseado nos programas de milhagem das companhias aéreas. A idéia, que parece banal hoje, transformou a operação da Telemig.

Quanto mais minutos o usuário falava ao celular, mais descontos ganhava na compra de novos aparelhos. O projeto foi replicado por todas as operadoras do país -- inclusive pela Claro. O sucesso da estratégia na Telemig se refletiu nos números. Entre 2002 e 2004, período em que Cox dirigiu a operadora, o lucro cresceu 135% e a base de clientes 42%.

Isso num período em que a concorrência se acirrava em Minas Gerais, com TIM e Oi apresentando formas cada vez mais agressivas de conquistar o mercado. "Cox é um dos executivos mais inovadores do setor. Não surpreende que ele tenha ido para uma empresa do porte da Claro", afirma Constantini.

Além das mudanças na estratégia, Cox vem tentando transformar também a cultura da empresa -- e implementar um sistema inspirado no mo delo de empreendedorismo da Odebrecht, onde começou a carreira. Além de uma política de corte de custos austera, o modelo prevê a reorganização da estrutura da empresa.

Cox deu mais poder de fogo a diretores regionais, diretamente ligados à venda de aparelhos. Cada departamento recebeu um plano de metas individual -- e elas são exaustivamente cobradas a cada reunião. A obsessão do executivo na obtenção de resultados já virou uma espécie de folclore entre seus novos funcionários. "A companhia é uma confederação de pequenas empresas. Todas têm de dar certo para que, no final, a Claro como um todo ganhe", afirma Cox.

Para motivar seus funcionários, ele vem tentando modificar a política de remuneração, de modo a atrelar os bônus ao resultado de cada departamento. "A parcela variável era pequena demais", diz ele. "E isso não motiva ninguém a buscar resultados, cumprir metas e crescer."

A tarefa de expandir a participação de mercado e, ao mesmo tempo, ganhar dinheiro vem se provando o maior desafio para Cox. Como o crescimento nas vendas decorre, em boa parte, do aumento dos subsídios dados aos consumidores, as operadoras que querem crescer encontram imensas dificuldades para lucrar.

E as empresas que querem lucrar encontram imensas dificuldades para crescer. A Claro sentiu a força desse cobertor curto nos últimos meses. No terceiro trimestre do ano, período em que a margem da operadora mexicana atingiu seus maiores níveis históricos, sua distância em relação à TIM aumentou de 1,4 milhão de celulares para 2 milhões.

Em setembro, a TIM ampliou sua base em quase 500 000 usuários, enquanto a Claro adicionou 300 000 novos clientes. Até mesmo a Vivo, que passou por problemas de reestruturação e se converteu numa exportadora de clientes, voltou a crescer no último trimestre deste ano. Cox terá uma vida dura pela frente -- isso, evidentemente, se o cheque de Slim não vier.

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