Revista Exame

Brasil fez papel de bobo na Copa do Mundo

Com a Copa e a Olimpíada, o governo pretendia exibir ao mundo a fabulosa obra construída pelo ex-presidente Lula e sua sucessora, Dilma Rousseff. O que conseguiu foi o espetáculo que está aí

Tapumes escondem viaduto inacabado em Natal: o legado dos grandes eventos não foi prioridade (Nuno Guimarães/REUTERS)

Tapumes escondem viaduto inacabado em Natal: o legado dos grandes eventos não foi prioridade (Nuno Guimarães/REUTERS)

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Da Redação

Publicado em 8 de julho de 2014 às 17h52.

São Paulo - Se arrependimento matasse, e é sabido que nunca matou ninguém, é certo que o Brasil estaria com as vagas dos cemitérios esgotadas, já há muito tempo, por gerações e mais gerações de nossos mais notáveis administradores públicos.

Mas o arrependimento só deixa para trás o desastre que os arrependidos criaram — ainda assim, quando há alguém que se arrependa da barbaridade que fez, algo praticamente desconhecido na vida política brasileira. Ficamos, enfim, só no prejuízo — e sem o menor benefício de outra velha máxima, segundo a qual é errando que se aprende.

No Brasil, é errando que se erra, e perde seu latim quem imagina que a experiência adquirida com os erros pode trazer o conhecimento para chegar aos acertos.

Nada melhor para ilustrar essas melancólicas constatações do que o “desastre perfeito” que o Brasil, com seu governo, suas empreiteiras de obras públicas e seus grupos de interesse privado, conseguiu armar para a Copa do Mundo de 2014 e para a Olimpíada de 2016, no Rio de Janeiro.

Também faremos bonito, por causa dos dois eventos, nos próximos rankings mundiais de roubalheira, estupidez, incapacidade absoluta de planejar coisas elementares, impotência para executar trabalhos previstos com anos de antecedência, desperdício e, sobretudo, uma desvairada resistência diante da mais delicada crítica em relação a qualquer aspecto dessa calamidade toda.

Pois aí está. Chegou a Copa, a Olimpíada está chegando e o governo consegue exatamente o oposto do que pretendia com essas duas aventuras.

Queria exibir ao mundo inteiro, para bilhões de olhos, a fabulosa obra técnica, social e criativa construída pelo “Brasil Potência” do ex-presidente ­Lula e sua sucessora, Dilma Rousseff — responsáveis diretos pela prosperidade, pelo progresso e pela subida do Brasil rumo ao futuro. O que conseguiu na vida real foi o espetáculo que está aí.

Segundo a presidente Dilma, essa enciclopédia de inépcia escrita ao longo dos dois governos do PT seria consequência, apenas, do “complexo de vira-lata” vivido pelos maus brasileiros — um sentimento de inferioridade, descrença e desânimo que ignora nossas grandes conquistas e riquezas, as quais são a inveja do mundo, a pujança das matas etc.

O Brasil, para acalmar a presidente, pode até perder o tal complexo. Ficará apenas com sua vida de vira-lata.

É incômodo, para a corte de Lula, Dilma e PT, aparecer como realmente é na frente do mundo. Sempre sustentaram que tudo o que havia de errado no Brasil era apenas uma fabricação da “grande mídia” de direita, que a presidente acaba de incluir como um de seus alvos de ataque durante a campanha eleitoral.

Mas agora quem está falando tudo o que os meios de comunicação brasileiros têm falado durante os 12 últimos anos é a mais prestigiada mídia internacional. Ela insistiu em ignorar, até há pouco tempo, qualquer observação negativa em relação ao governo de Lula e do PT; sua atitude editorial sempre foi um dos grandes orgulhos do Brasil oficial.

De uns tempos para cá, porém, o coro mudou de tom — e passou a registrar cada vez mais os desatinos do Palácio do Planalto e do universo que gira a seu redor. Agora, com Copa e Olimpíada, é pau todo dia.

Numa entrevista à Folha de S.Paulo, o perito em urbanismo e arquitetura Michael Kimmelman, que há 20 anos escreve no New York Times, traçou um admirável resumo do que acaba de ver por aqui.

Um país que não dá prioridade ao legado de uma Copa ou de uma Olimpíada, disse ele, faz papel de bobo — e foi isso, precisamente, o que o Brasil fez. Para encarar um desafio desse porte, concluiu Kimmelman, as cidades têm a obrigação de fazer um plano claro do que, no fim das contas, elas querem. Londres, em 2012, fez isso. O Brasil não soube fazer.

Os governos Lula-Dilma tomaram o partido das empreiteiras, dos interesses particulares e da dupla Fifa-COI, aos quais cedeu o poder de decidir sobre questões urbanas de primeira importância. Estão colhendo agora os resultados do que plantaram.

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