Revista Exame

É cedo para comemorar os resultados na Caixa

Enquanto a Petrobras teve o pior resultado em oito anos, a Caixa Econômica Federal obteve recorde de lucro. Acerto na estratégia? O precedente do subprime americano mostra que é bom ter cautela na conclusão


	E se a economia apertar?: sob instruções do governo, a Caixa baixou o juro e deu crédito para imóveis como nunca
 (Alexandre Battibugli/EXAME.com)

E se a economia apertar?: sob instruções do governo, a Caixa baixou o juro e deu crédito para imóveis como nunca (Alexandre Battibugli/EXAME.com)

DR

Da Redação

Publicado em 31 de maio de 2013 às 17h34.

São Paulo - A Caixa Econômica Federal está em estado de graça, pelo que se pode ver nos números sobre seu desempenho em 2012, recém-divulgados. Para começar, fornece um contraste brilhante com outra vaca sagrada, e muito mais gorda, na coleção de estatais brasileiras — a Petrobras, que vem sendo laboriosamente arruinada por todo tipo de decisões empresariais tóxicas, ditadas por interesses políticos ou resultantes de pura e simples inépcia.

Enquanto a Petrobras se tornou a pior entre as dez maiores empresas de petróleo do mundo — seu lucro, em 2012, caiu mais de um terço em relação a 2011, a produção diminuiu, os custos de operação chegaram ao dobro do que eram seis anos atrás —, a CEF encheu o peito de medalhas. Alcançou um lucro recorde no ano passado, ou mais de 6 bilhões de reais (o Banco do Brasil, logo depois da Caixa, anunciou o dobro de lucro: 12 bilhões).

Conquistou cerca de 6,5 milhões de novos clientes. Aumentou mais de 40% o volume de crédito oferecido à praça, um avanço muito superior ao de todo o sistema bancário privado. Tudo isso, naturalmente, resulta numa cascata de dinheiro para dentro do Tesouro Nacional — perto de 3 bilhões de reais em dividendos, limpinhos, mais outros 5 bilhões em impostos.

Mais até que os números, a performance atual da CEF estaria a revelar o acerto estratégico da gestão que vem sendo imprimida a seus negócios. De novo a comparação com a Petrobras é uma lástima.

Como nenhum ser atualmente vivo sobre a face da Terra ignora, a Petrobras é donatária, desde 2006, de uma fabulosa fortuna no fundo do mar — o pré-sal, esse bendito pré-sal que o ex-presidente Lula invoca todo santo dia para canonizar a si próprio e garantir que o Brasil será daqui a pouco um dos países mais ricos do mundo, etc., etc.

Nestes sete anos, a Petrobras afundou-se na situação descrita acima. Teve em 2012 seu pior resultado dos últimos oito anos, aumentou sua dívida sete vezes e promoveu a maior destruição jamais vista no valor de suas ações — o valor de mercado da empresa caiu de 510 bilhões de reais, em 2008, para menos de 220 bilhões, em fevereiro de 2013.

Já a CEF, nesse mesmo período de tempo, expandiu como nunca seu crédito. Passou a cobrar juros mais baixos que a concorrência privada. Reduziu as tarifas cobradas dos clientes. Executou, em suma, as instruções gerais do governo para diminuir o custo dos empréstimos tomados pelo público.

Mais ainda, a Caixa, ao fazer tudo isso, não sacrificou seu lucro: seu resultado de 2012 foi um recorde. Também não aumentou a inadimplência.

Quando se multiplica dramaticamente o volume de dinheiro emprestado à clientela, a expectativa é que se multiplique, também, o volume de gente que não paga, mas não foi isso o que aconteceu — a inadimplência ficou por volta dos 2%, a menor de todo o mercado. O primeiro impulso, diante disso, é ver no momento vivido hoje pela CEF uma lição para outras estatais e para o setor bancário privado.

Já o segundo impulso recomenda cautela. Como ensina a experiência, qualquer coisa que tenha algo a ver com o governo deve ser tratada como um porco-espinho — ou seja, com extremo cuidado. No caso, a notável expansão do crédito e o baixo índice atual de inadimplência se devem ao descarrego de recursos no financiamento imobiliário, com juros subsidiados e prestações mais suaves para o devedor.

No começo pode ser fácil, sobretudo em situações de pleno emprego, como a que vive hoje o Brasil — mas, quando a economia aperta, o setor é também o primeiro a botar a língua de fora.

O precedente clássico é a decisão do governo americano, em 1999, de determinar que o Fannie Mae, organismo oficial de financiamento imobiliário dos Estados Unidos, emprestasse dinheiro a juros reduzidos para permitir a compra de casas pelos clientes subprime, como se dizia então — gente sem renda e garantias para levantar empréstimos na rede bancária.

Menos de dez anos depois, com a expressão subprime transformada em maldição, veio o terremoto. É melhor esperar mais um tempo antes de fazer a festa.

Acompanhe tudo sobre:BancosCaixaCapitalização da PetrobrasDesempenhoEdição 1036EmpresasEmpresas abertasEmpresas americanasEmpresas brasileirasEmpresas estataisEstatais brasileirasFannie MaeGás e combustíveisgestao-de-negociosInadimplênciaIndústria do petróleoLucroPetrobrasPetróleo

Mais de Revista Exame

Borgonha 2024: a safra mais desafiadora e inesquecível da década

Maior mercado do Brasil, São Paulo mostra resiliência com alta renda e vislumbra retomada do centro

Entre luxo e baixa renda, classe média perde espaço no mercado imobiliário

A super onda do imóvel popular: como o MCMV vem impulsionando as construtoras de baixa renda