Revista Exame

A Novartis vai do Cataflam à terapia genética

Vasant Narasimhan, presidente da Novartis, investe para fazer da segunda maior farmacêutica do mundo uma referência em inovação digital

Vasant Narasimhan: 9 bilhões de dólares para desenvolver novos medicamentos (Novartis/Divulgação)

Vasant Narasimhan: 9 bilhões de dólares para desenvolver novos medicamentos (Novartis/Divulgação)

NB

Naiara Bertão

Publicado em 11 de abril de 2019 às 05h42.

Última atualização em 25 de julho de 2019 às 14h46.

Aos 43 anos, Vasant Narasimhan, americano descendente de indianos, acumula um diploma de ciências biológicas pela Universidade de Chicago e outros dois pela Universidade Harvard: um na escola de medicina e um mestrado em políticas públicas na escola de governo John F. Kennedy. É ainda membro da Academia Nacional de Medicina dos Estados Unidos e do conselho de administração da Harvard Medical School. Desde fevereiro de 2018, está à frente da segunda maior farmacêutica do mundo, a suíça Novartis, onde entrou em 2007.

Narasimhan levou para a empresa sua visão sobre o futuro da medicina. Para ele, as melhores oportunidades estão na combinação do físico — pílulas e injeções — com o digital — aplicativos e análises de dados. “Vamos continuar produzindo as pílulas e as vacinas que as pessoas conhecem, mas agora podemos tirar células do corpo, reprogramá-las e colocá-las novamente, curando doenças com terapia genética”, diz. Em 2018, a Novartis, cujo faturamento bateu 49 bilhões de dólares, investiu 9 bilhões no desenvolvimento de drogas para ir além de blockbusters como Ritalina e Cataflam. Narasimhan concedeu a seguinte entrevista durante uma viagem recente ao Brasil.

O senhor assumiu o comando da Novartis em fevereiro de 2018. Por que essa visita ao Brasil agora?

Estou viajando para conhecer todos os países em que a Novartis está. O Brasil é o 31o país que conheci e é o 11o maior mercado da Novartis no mundo em termos de vendas, com 2 500 funcionários. Quero conhecer a realidade de cada local em que estamos. Temos uma grande transformação cultural em curso e eu estou disposto a conversar com as pessoas ao vivo para engajá-las nessa nova proposta.

Qual é essa transformação cultural?

Historicamente, somos uma organização com decisões vindas de cima para baixo. Agora, estamos disseminando uma cultura “sem chefe”. Ser um líder, na minha opinião, é muito mais sobre habilitar as pessoas para se sentirem mais responsáveis e motivadas em fazer seu trabalho. Eu acredito que esse é o futuro das empresas que queiram crescer via inovação. Companhias de tecnologia já estão adotando essa postura e acho que nós temos de fazer o mesmo.

Como a Novartis está inovando?

Fizemos uma grande mudança de postura. Deixamos de caminhar para ser um diversificado conglomerado de saúde e resolvemos focar a inovação e os medicamentos. Mas, para inovar em medicamentos, tivemos de mergulhar nas melhores tecnologias para melhorar a saúde humana. Adicionamos aos nossos esforços -áreas como terapia genética, terapia celular e novas tecnologias para tratar doenças. Creio que, nos próximos dez anos, as novas áreas serão uma importante oportunidade para tratar a saúde humana. Também devem liderar o crescimento da Novartis.

Queremos ser uma companhia de medicina que cubra toda a variedade de tecnologias que melhoram a saúde. Ainda vamos continuar produzindo as pílulas que as pessoas tomam todos os dias, mas agora podemos tirar células para fora do corpo, reprogramá-las e colocá-las novamente. Precisamos continuar inovando o modelo de pagamento do sistema de saúde, e ser mais criativos para dar acesso a novas tecnologias e remédios. Queremos introduzir no Brasil inovações que já estamos introduzindo na Europa e nos Estados Unidos. Queremos que as autoridades trabalhem com a gente, que a Anvisa continue modernizando o ambiente regulatório. Precisamos que o governo financie inovação em saúde, e não apenas distribua remédios.

Como o Brasil pode melhorar o modelo de pagamento em saúde?

O primeiro passo é investir em prevenção de doenças como diabetes e hipertensão. Isso envolve investimentos em educação, regulamentação do setor de alimentos e olhar para o mercado de cigarros. É uma das maiores oportunidades que todos os governos têm. Em segundo lugar, é preciso pensar onde investir em medicina que tire custos do sistema. Um dos medicamentos que temos para problemas no coração, na verdade, reduz custos.

Então, o desafio para o sistema de saúde é pagar mais agora para reduzir os custos em quatro ou cinco anos. Trata-se de uma mudança de mentalidade. E isso é difícil para os ministros de saúde fazerem. Outro ponto é o controle do desperdício. Há muito desperdício no sistema de saúde, muito porque não existem bons dados. Então, um dos principais investimentos que precisam ser feitos é em um robusto sistema de dados.

O senhor defende que a Novartis seja referência em inovação digital. O que isso significa na prática?

Um bom exemplo é que recentemente passamos a usar um sistema chamado Sense, que nos permite rastrear como todos os nossos testes clínicos em todo o mundo, em 52 países, estão se saindo em tempo real. E projetar quais testes têm pacientes suficientes, quais estão custando demais, em quais estamos tendo problemas de qualidade. Outra área é a de testes clínicos em que os pacientes usam o celular. Por meio da captura do olhar, é possível saber se os medicamentos estão funcionando.

No ano passado, nossa divisão de genéricos Sandoz lançou o reSET-O para pacientes com transtorno de uso de opioide. O aplicativo é recomendado com prescrição médica. Ele usa conceitos da terapia cognitiva comportamental para interagir com o paciente, fazer perguntas, coletar respostas e dados e analisar tudo para saber sua evolução. O app pode ser usado para tratamento de alguns vícios ou condições neurológicas e estamos estudando sua aplicação em outras áreas da medicina.

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