Lula e o “amigo” Ahmadinejad, do Irã: perda sem compensação (Ricardo Stuckert/Veja)
Da Redação
Publicado em 18 de fevereiro de 2011 às 11h38.
Vai chegando ao seu fim, com a melancolia de um enterro em tarde de chuva, o período de inépcia mais prolongado que a política externa brasileira já viveu em sua história moderna. Ainda há tempo suficiente, até o dia 31 de dezembro próximo, para o governo engrossar o notável prontuário de desastres que construiu com sua diplomacia nos últimos oito anos; a experiência tem mostrado, repetidamente, que não se deve subestimar sua capacidade de piorar o que está ruim nessa área. Mas o funeral ora em andamento, de qualquer forma, já está de excelente tamanho. Nada poderia ilustrar isso tão bem quanto a assinatura pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, dias atrás, da humilhante capitulação do Brasil em seu último rompante de “diplomacia independente” — depois de nomear a si mesmo como o opositor número 1 das sanções internacionais contra o Irã, descobriu que estava falando sozinho e acabou fazendo exatamente o oposto do que queria.
É uma coisa triste, realmente, e o presidente da República, em sua curiosa tendência de exibir sempre mais soberba a cada besteira em que se mete, não colabora em nada para limitar o prejuízo. Poderia ter assinado o papel concordando com as sanções e ficado quieto. Mas não: mandou dizer que assinou “contrariado”, como querendo que o desculpem, de algum jeito, por ter dito uma coisa e feito outra. É o tipo da tentativa inútil, claro, porque na comunidade internacional ninguém está interessado no que ele acha, e sim no que assinou. De qualquer forma, é um fecho adequado para essa instigante sucessão de desventuras que tem sido, para a diplomacia brasileira, a decisão de apostar no Irã e em seu regime sinistro como parceiros prioritários na estratégia de mostrar ao mundo que o Brasil é uma “potência independente”. Nada, rigorosamente, saiu certo para o presidente Lula, o Itamaraty e os cérebros geopolíticos do governo desde que deram seu primeiro passo nessa balada. De lá para cá, só houve perda sem compensação, a tal ponto que vem ao caso imaginar se Lula não estaria perguntando a si próprio, a esta altura, por que raios ele foi se meter com essa história de Irã e com esses aiatolás que parecem sempre um feixe de bananas de dinamite à espera de um fósforo. Será que não havia algum jeito mais fácil de fazer política externa independente?
Por conta dessa parceria, Lula já se enrolou em apoiar como legítimas as últimas eleições presidenciais no Irã, denunciadas como uma maciça operação de fraude na comunidade internacional; na ocasião, opinou que os protestos da oposição iraniana, perseguida com prisões maciças, torturas e condenações à forca, eram “chororô” de torcida que perde num jogo de Flamengo e Vasco. Assegurou, para hilaridade mundial, que o Brasil havia “resolvido” em poucos dias um problema que as grandes potências não conseguem resolver há 30 anos; tratava-se do “acordo” que imaginava ter obtido do Irã garantindo seu bom comportamento nuclear e eliminando a necessidade de sanções, uma bobagem da qual ninguém se lembra mais. Aconteceu justamente o contrário: as sanções foram aprovadas praticamente por unanimidade na ONU e acabam, agora, por receber a adesão do Brasil. Lula insiste em falar no “meu amigo Ahmadinejad”, referindo-se ao presidente do Irã — uma coisa constrangedora, quando o homem, obviamente, não é nem poderia ser amigo dele. Enfim, e para abreviar a lista, Lula acabou metido numa extravagante disputa em torno do apedrejamento de mulheres adúlteras no Irã. Saiu no prejuízo, é claro. Primeiro ficou a favor dos carrascos, alegando que seria uma “avacalhação” interferir nas leis do Irã; depois ofereceu “asilo”, no Brasil, à condenada. Acabou ouvindo das autoridades do Irã que deve cuidar da própria vida. E o “meu amigo” Ahmadinejad? Sumiu.
Até não muito tempo atrás, Lula parecia a caminho de construir uma boa reputação internacional para si. Hoje, junto com sua política externa, ela se aproxima da sepultura.