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Como a Metalfrio vende gelo na Sibéria

A fabricante de refrigeradores Metalfrio dobrou as vendas nos últimos quatro anos ao chegar a lugares do mundo onde poucas empresas brasileiras imaginam algum dia ir

Eduardo Moreira Caio, da Metalfrio: 400 000 milhas acumuladas em voos apenas no ano passado (Paulo Vitale/EXAME.com)

Eduardo Moreira Caio, da Metalfrio: 400 000 milhas acumuladas em voos apenas no ano passado (Paulo Vitale/EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 4 de março de 2011 às 19h13.

Todos os meses o paulistano Luiz Eduardo Moreira Caio repete um pequeno ritual. Separa dois ternos, seis camisas, dois pares de sapatos, luvas e cachecol (conforme a época do ano e o destino) e passa uma semana viajando por países como Turquia, Iraque e Filipinas. Os deslocamentos são tantos, e tão frequentes, que apenas em 2009 Caio acumulou 400 000 milhas aéreas. Sua rotina nos aeroportos lembra a do personagem de George Clooney no filme Amor Sem Escalas, que sonha em juntar 10 milhões de milhas e ganhar um cartão de fidelidade superespecial da companhia aérea.

Presidente da fabricante de refrigeradores comerciais Metalfrio, Caio está à frente de uma das mais agressivas - e surpreendentes - expansões internacionais entre as empresas brasileiras. Desde 2006, a companhia fundada por seu pai no início da década de 60 comprou quatro fabricantes de refrigeradores com linhas de produção no México, na Rússia e na Turquia - com investimentos de cerca de 100 milhões de reais. Nesse período, a Metalfrio subiu do 12º para o quinto lugar entre as empresas brasileiras mais internacionalizadas, de acordo com um levantamento da Fundação Dom Cabral. O faturamento passou de 295 milhões para 643 milhões de reais - 42% vindos do exterior. Para aumentar essa parcela, Caio estuda agora a abertura de uma nova fábrica, desta vez no Sudeste Asiático. "Nossas maiores oportunidades estão em países como Índia, Malásia e Sri Lanka", diz.

Caio não é um herdeiro. É um profissional, na acepção da palavra. A Metalfrio foi vendida para a Continental em 1994, passou para o controle da alemã BSH sete anos depois e, desde 2004, pertence à gestora de recursos Artesia, controlada por Marcelo Faria de Lima e Márcio Camargo, ex-sócios do banco Garantia. Durante todo esse tempo, Caio ficou responsável pela gestão do negócio. Na época da venda para a Artesia, a companhia tinha 50% do mercado nacional de freezers comerciais e seus líderes concluíram que seria mais fácil ganhar terreno no exterior do que chegar aos rincões do Brasil.

Foi quando Caio iniciou sua intensa jornada de viagens a destinos pouco usuais - onde só agora grandes companhias globais, como Coca-Cola, Pepsi e ABInBev, começam a ganhar espaço. "Na Índia, apenas 5% dos bares têm geladeira", diz ele, que se tornou um dos maiores fornecedores da Coca-Cola no país. "Lá podemos crescer dois dígitos por ano nas próximas duas décadas." Uma das fronteiras mais recentes para a Metalfrio é o Iraque, país para o qual começou a fornecer freezers a grandes fabricantes de bebidas e sorvetes, como a Pepsico e a Nestlé, há cerca de um ano.


Apesar de atraentes, esse novos mercados impõem desafios. Alguns são velhos conhecidos - infraestrutura precária, corrupção e burocracia. Na Rússia, por exemplo, os fiscais do governo chegam a exigir cópias assinadas de 15 000 folhas com dados financeiros de um único trimestre. No Cazaquistão, as estradas montanhosas do país são mais precárias que as do interior brasileiro. Depois de ver algumas cargas chegar ao destino danificadas pelos solavancos do caminho, a Metalfrio criou uma embalagem que leva o dobro de quantidade de isopor e plástico-bolha.

No caso da Sibéria, para onde a Metalfrio vende geladeiras há cerca de três anos, a adaptação foi no produto. Em vez de gelar, o aparelho aquece latas e garrafas para manter o líquido nas condições ideais, num lugar em que a temperatura ambiente chega a 30 graus negativos. Para evitar conflito com a realidade desses lugares, o primeiro mandamento da cartilha de expansão da Metalfrio é buscar um sócio local. Foi assim na Turquia, onde os antigos donos da empresa adquirida permaneceram com 21% de participação. Além disso, a companhia também dá preferência à contratação de executivos da própria região - hoje há apenas cinco brasileiros expatriados.

A prova de fogo para a expansão internacional da Metalfrio foi a recente crise. Seu faturamento caiu 11% em 2009. Uma fábrica no México e duas na Turquia foram fechadas. Ainda assim, após um programa de corte de custos e graças à recuperação de alguns mercados, a Metalfrio transformou o prejuízo de 2008 num lucro de 35 milhões de reais no ano passado.

Diante dos resultados, a tendência de que o Brasil deixe de ser a principal fonte de receitas para a Metalfrio parece irreversível. "Essa estratégia deixa a companhia menos exposta a crises isoladas", diz Dirk Boehe, professor de negócios internacionais do Insper. Para Caio, isso significa que o ritual de fazer as malas e acumular milhares de milhas todos os meses ainda deve durar um bocado de tempo.

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