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Como Ben Bernanke entrará para a história?

Ben Bernanke deixa o Fed em janeiro e, por ora, é visto como o homem que evitou a segunda Grande Depressão — mas seu legado depende de como seu sucessor vai lidar com as inovações que ele adotou

Bernanke e Greenspan: o atual presidente do Fed inovou — e muito — em relação às políticas de seu antecessor  (Tom Brown/Getty Images)

Bernanke e Greenspan: o atual presidente do Fed inovou — e muito — em relação às políticas de seu antecessor (Tom Brown/Getty Images)

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Da Redação

Publicado em 10 de outubro de 2013 às 14h40.

São Paulo - Num discurso para a turma de formandos da Universidade Princeton em junho, Ben Bernanke, presidente do Federal Reserve, banco central americano, deixou de lado o figurino normalmente sério por alguns instantes para arriscar uma piada. Contou que, como quer retornar à carreira acadêmica, tinha enviado uma mensagem à direção daquele campus, de onde saiu para Washington, para saber se o aceitariam de volta.

“A resposta foi: ‘Princeton recebe mais currículos de gente qualificada do que é capaz de acomodar’ ”, disse antes de ouvir as gargalhadas da plateia. A única coisa verdadeira nessa anedota inventada por Bernanke é que ele quer mesmo voltar para o mundo acadêmico.  

O economista de 59 anos deixará o banco central americano em janeiro e é, obviamente, cedo para cravar qual será seu legado. Seu antecessor, Alan Greenspan, saiu da instituição em janeiro de 2006 sob aplausos por ter promovido o crescimento da economia com a inflação sob controle.

Pouco tempo depois, era apontado como um dos maiores culpados da crise financeira mundial de 2008. Bernanke ainda não foi julgado pelo tempo, mas os serviços já prestados lhe garantem um lugar de destaque na história econômica. Boa parte dos economistas reconhece que foi ele quem evitou que os Estados Unidos e o restante do mundo enfrentassem uma segunda Grande Depressão.

Quando Bernanke entrou no Fed, era esperado que se mantivesse fiel às políticas de Greenspan. E, no começo, foi exatamente o que fez. Surpreendido pelo estouro da bolha imobiliária em 2007, de imediato utilizou o receituário tradicional para estimular a economia. Entre setembro de 2007 e dezembro de 2008, cortou a taxa de juro de 5,25% ao ano para perto de zero.

Mesmo assim, a economia não reagiu. Foi então que Bernanke colocou em prática medidas inovadoras com base no que aprendeu ao longo de décadas de estudos sobre a Grande Depressão dos anos 30. 

Sua intervenção mais famosa é chamada de quantitative easing, que consiste na compra de títulos de longo prazo do governo e títulos lastreados em hipotecas em poder dos bancos. Até agora, 2,7 trilhões de dólares foram injetados nas instituições financeiras. Elas, com uma liquidez maior, passaram a emprestar mais para empresas e consumidores.

Bernanke também mudou o estilo de gerenciamento da instituição. Passou a fazer coletivas de imprensa trimestrais e a divulgar uma meta de inflação do governo — algo impensável para antecessores como o mítico Paul Volcker, que dizia que os investidores não sabiam distinguir entre uma previsão e uma promessa.


“O Fed foi criativo nas respostas para a crise, ajudou a evitar um colapso e trouxe o crescimento de volta”, diz o economista Kenneth Rogoff, professor da Universidade Harvard. O FMI estima que a fórmula de Bernanke será responsável por elevar o PIB mundial em 1% neste ano. Os resultados têm sido positivos, e o banco central anda falando em parar com o quantitative easing.

“Bernanke foi agressivo na medida em que a situação exigia”, diz Donald Kohn, ex-vice presidente do Fed cotado para a vaga de Bernanke — é o azarão da disputa.

No páreo, ainda estão Larry Summers, ex-secretário do Tesouro, e Janet Yellen, atual vice-presidente do Fed. No mercado financeiro, o nome mais temido é Summers, por ele já ter declarado que as medidas de estímulo têm menos eficácia para a economia real do que a maioria supõe. O medo é que Summers retire rapidamente as políticas criadas por Bernanke. E isso poderia ter um impacto sobre o crescimento.

Segundo um estudo do banco francês BNP Paribas, uma retirada abrupta dos estímulos poderia diminuir o PIB americano em até 0,75 ponto percentual em dois anos e 500 000 postos de trabalho deixariam de ser criados. Para o FMI, uma saída desastrada poderia provocar uma retração de 1,5 ponto percentual no PIB mundial em três anos.

O problema é que, se as medidas de estímulo demorarem a ser desmontadas, também haverá confusão. O risco, nesse caso, é o surgimento de uma nova bolha. Com excesso de dinheiro barato por muito tempo, os investidores tendem a arriscar mais e mais — e isso costuma terminar mal.

“A história poderá lembrar de Bernanke como alguém que subestimou os riscos da política monetária não convencional”, diz Michael Spence, ganhador do Prêmio Nobel de Economia em 2001. Como se vê, Bernanke não depende só dele mesmo para entrar no seleto grupo dos maiores banqueiros centrais da história.

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