Revista Exame

Economia carbono zero: Bloomberg quer acelerar

Em entrevista exclusiva, o bilionário e filantropo fala sobre guerra, ESG, favela e a transição para a economia de baixo carbono. Para ele, a economia não está mudando tão rapidamente quanto deveria

Michael Bloomberg: “Quanto mais empoderarmos cidades, estados e empresas, mais rápido chegaremos a uma economia de energia limpa” (Alastair Grant - Pool/Getty Images)

Michael Bloomberg: “Quanto mais empoderarmos cidades, estados e empresas, mais rápido chegaremos a uma economia de energia limpa” (Alastair Grant - Pool/Getty Images)

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Rodrigo Caetano

Publicado em 13 de outubro de 2022 às 06h00.

Michael Bloomberg está preocupado. No Acordo de Paris, praticamente todos os países do mundo se comprometeram a chegar a uma economia carbono zero até 2050, com algumas metas para 2030. Bloomberg, no entanto, está olhando para 2023. Em entrevista exclusiva à EXAME, o bilionário fala sobre sua visão de futuro e faz um alerta: nada pode parar a transição energética.

A transição para a economia de baixo carbono está acontecendo. Não é a primeira vez que a humanidade enfrenta uma mudança na matriz energética e, sempre que isso acontece, surgem conflitos que terminam em guerra e miséria. O ESG surge, justamente, como uma maneira de pensar as mudanças econômicas de forma holística e evitar externalidades para garantir uma transição justa. Então, por que a Europa está em guerra?A invasão da Ucrânia deixou claro que a dependência dos combustíveis fósseis é não apenas um problema ambiental e de saúde pública mas também um risco econômico e de segurança.

Globalmente, não estamos progredindo tão rápido quanto poderíamos. Mais transparência e dados melhores vão nos ajudar a acelerar esse progresso e a responsabilizar governos e empresas. Assim como acabar com subsídios e outras políticas que privilegiam os combustíveis fósseis. Também precisamos de parcerias mais fortes entre governo e setor privado.

O mundo pós-pandemia seguirá globalizado ou há uma tendência de retornar ao protecionismo e ao nacionalismo?
O aumento do comércio global foi um dos principais motivos que fizeram a extrema pobreza desabar no meio século anterior à pandemia. O mundo nunca foi tão interconectado, e todos os grandes desafios que enfrentamos ­— do combate às mudanças climáticas à prevenção da próxima pandemia — requerem mais colaboração e cooperação. Ao mesmo tempo que alguns governos nacionais recorreram a medidas protecionistas, outros grupos estão trabalhando em conjunto mais próximos do que nunca, especialmente as cidades. Líderes municipais são avaliados por resultados e, portanto, precisam fazer as coisas acontecer. Cada vez mais eles estão se unindo a redes, compartilhando ideias e estratégias e espalhando ideias que funcionam.

As consequências das mudanças climáticas já podem ser sentidas. No mundo todo, eventos climáticos extremos, como secas e inundações, estão mais frequentes. O progresso das negociações climáticas globais, no entanto, parece seguir o mesmo ritmo há décadas: constante, mas lento. Como acelerar essas negociações e qual é o papel do setor privado nesse processo?
Após a ECO-92, no Rio de Janeiro, durante anos os governos nacionais eram os únicos com voz nas negociações climáticas, e pouco progresso foi feito em direção a um acordo global. Mas, em determinado momento, as cidades, os estados e as empresas fomentaram os avanços a partir do zero. Em Nova York, cortamos 13% das emissões em seis anos. Um número cada vez maior de cidades está agindo e, quando elas o fazem, mostram aos governos nacionais como o combate às mudanças climáticas e o crescimento econômico andam lado a lado. Mais e mais companhias também estão progredindo na redução das emissões. Elas entendem os incentivos de agir e os riscos de não agir. Quanto mais empoderarmos cidades, estados e empresas, mais rápido chegaremos a uma economia de energia limpa.

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Antes da invasão da Ucrânia, grandes investidores estavam fomentando a agenda ESG e direcionando recursos praticamente infinitos para as energias limpas. Agora, muitos falam em voltar para os combustíveis fósseis, inclusive o carvão. As emissões chegaram a níveis recordes. Trata-se de um reposicionamento em virtude de circunstâncias momentâneas, ou o financiamento da transição energética está sob risco?
O carvão está com os dias contados e a invasão da Ucrânia não vai mudar isso. As energias eólica e solar já são mais baratas do que o carvão na maior parte do mundo e o preço continua a cair à medida que a tecnologia avança. A Bloomberg Philanthropies, por meio da iniciativa Beyond Coal, ajudou a fechar dois terços das usinas a carvão dos Estados Unidos e metade da Europa. Vemos que é possível expandir o acesso a energia confiável e cortar emissões ao mesmo tempo, só não estamos nos movendo tão rapidamente quanto podemos. Para mudar isso, estamos trabalhando com os governos para aumentar a produção de energia limpa, inclusive no Brasil. Dados melhores terão um papel importante para acelerar a transição.

Ainda temos poucas informações sobre quanto as empresas emitem individualmente, por exemplo, e os dados que possuímos não são padronizados. Isso significa que os investidores não conseguem fazer comparações precisas e o público não pode cobrar o progresso das empresas. Estamos trabalhando em algumas frentes para resolver isso. A Bloomberg ajudou a criar um comitê de líderes políticos e empresariais, por exemplo. Recentemente, esse comitê anunciou planos para lançar uma nova plataforma climática aberta, que estará disponível para investidores, reguladores, cientistas e o público em geral.

Isso vai unir e padronizar os dados climáticos do setor privado pela primeira vez. Ao mesmo tempo, a Força-Tarefa para Divulgações Financeiras Relacionadas ao Clima (TCFD) vem ajudando as empresas a medir os riscos e as oportunidades que enfrentam a partir das mudanças climáticas. Empresários e investidores querem essas informações, e os esforços são bem recebidos. Cerca de 3.900 organizações endossam as recomendações da TCFD. Em nível local, muitas comunidades estão utilizando o poder da tecnologia para se organizar e promover mudanças.

No Brasil, as favelas se tornaram um hub de inovação social, sendo chamadas de “a maior startup do país”. Como conectar essas forças locais de inovação e colaboração com o ecossistema das grandes empresas e investidores?
A filantropia tem um papel importante nisso. Nossa fundação criou uma competição, a Mayors Challenge, que convida cidades a propor novas ideias para grandes desafios. Diversas cidades brasileiras foram finalistas, e São Paulo ganhou o grande prêmio em 2016, com um programa que conecta pequenos produtores rurais a mercados e restaurantes, o que traz benefícios para o meio ambiente, a economia local e a saúde pública.

Um dos critérios do prêmio é a possibilidade de replicar a ideia em outras cidades. Também apoiamos o Earthshot Prize, criado pelo Príncipe William para estimular e apoiar a inovação no combate às mudanças climáticas. Em setembro, durante a Assembleia Geral da ONU, fizemos um seminário em Nova York para destacar os finalistas do prêmio e conectá-los a financiadores e oportunidades de escalar seus trabalhos.

Outra maneira de apoiar a inovação do zero é por meio da colaboração. Todos os anos, sediamos o Bloomberg New Economy Forum, conferência voltada para a criação de parcerias entre fronteiras e os setores público e privado. Um dos líderes destacados pelo fórum é Edu Lyra, CEO e cofundador da Gerando Falcões, organização focada no combate à pobreza no Brasil. Essa é uma oportunidade para apresentar o trabalho dele e de outros empreendedores e líderes do terceiro setor a uma audiência de líderes globais influentes.


(Publicidade/Exame)


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