Julio Fontana Neto, presidente da Rumo: “Precisamos de previsibilidade” (Germano Lüders/Exame)
André Jankavski
Publicado em 30 de agosto de 2018 às 05h22.
Última atualização em 30 de agosto de 2018 às 05h22.
A Rumo é a maior empresa de transporte ferroviário do país. É dona de 12.000 quilômetros de linhas, que passam por 459 cidades brasileiras. Brasília não faz parte do roteiro, mas tem sido o local mais visitado pela cúpula da companhia, cuja sede fica em Curitiba, no Paraná. Julio Fontana Neto, presidente da Rumo, vai à capital federal ao menos a cada 15 dias. Ricardo Lewin, diretor de relações com investidores, fica por lá três vezes por semana. O objetivo central das viagens é resolver uma pendência com o governo que se arrasta há três anos e vem paralisando uma parte relevante dos investimentos da empresa.
A tese foi comprada pelo governo, que há dois anos editou a Lei no 13.334, permitindo a renovação antecipada de concessões ferroviárias. O pedido de renovação da Rumo, feito em 2015, foi analisado pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e pela Secretaria Especial do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), criada pela mesma lei. Os dois órgãos aprovaram o pedido neste ano. “Está bem encaminhado o projeto. Discutimos mais de 80 propostas para a Malha Paulista”, diz Tarcísio Freitas, secretário do PPI. Em agosto, o processo foi enviado ao Tribunal de Contas da União, que tem prazo de 45 dias para dar um parecer final. Em meados de agosto, porém, o Ministério Público Federal e a Procuradoria–Geral da República consideraram a Lei no 13.334 inconstitucional. Agora, cabe ao Supremo Tribunal Federal decidir a questão — e não há um prazo para isso acontecer.
EXAME apurou que a Rumo aguarda, ainda, outra decisão judicial, relativa ao leilão da Ferrovia Norte-Sul, que estava previsto para este ano. Segundo executivos próximos à empresa, ela pretende participar (Fontana Neto não comenta). As condições do leilão estão sendo analisadas pelo procurador Júlio Marcelo, do Tribunal de Contas da União. “Precisamos de mais tempo do que o previsto inicialmente para entender os custos, os benefícios e os eventuais problemas da operação. Não podemos analisar correndo contra o relógio”, diz Marcelo. Enquanto as respostas não vêm, a empresa mantém parados cerca de 3 bilhões de reais, o equivalente à metade do faturamento anual. Além disso, a Rumo conseguiu em agosto um empréstimo de 2,9 bilhões do BNDES, dinheiro que poderia ser usado na Malha Paulista ou na Norte-Sul.
A Rumo tem mais um desafio: voltar ao azul. A última vez em que a empresa deu lucro foi em 2013, antes da fusão com a ALL. Após a fusão, anunciada em 2014 e aprovada no ano seguinte, a Rumo passou a corrigir os problemas das ferrovias herdadas da ALL, e isso consumiu recursos. Havia casos extremos. Na entrada para o porto de Paranaguá, no Paraná, os trilhos e os suportes, conhecidos como dormentes, estavam em estado de conservação tão ruim que os trens precisavam parar 5 quilômetros antes do porto — o transporte no trecho final era feito por caminhões. Para realizar os reparos, a empresa captou 10 bilhões de reais, pouco mais da metade por meio de duas ofertas de ações e o restante com a emissão de títulos de dívida no mercado externo, elevando seu endividamento.
Com a situação normalizada, esperava–se que a Rumo desse lucro no segundo trimestre deste ano. A geração de caixa voltou a aumentar — desde 2014, a alta supera os 300% — e as receitas também, mas a companhia ainda ficou no prejuízo (veja quadro na pág. 37). Fontana culpa a greve dos caminhoneiros, que paralisou o escoamento da safra. Antes disso, segundo ele, estava tudo bem: o volume transportado em abril havia sido recorde, em razão do aumento da produção de soja.
Agora, Fontana diz que a empresa dará lucro no terceiro trimestre. Os analistas estão divididos. “As incertezas sobre as concessões estão deixando as ações voláteis, mas, mesmo que isso não seja resolvido agora, a companhia gera caixa e tem boa saúde financeira. Deve começar a apresentar resultados melhores”, diz Pedro Galdi, analista da corretora Mirae Asset. Para Adeodato Volpi Netto, estrategista-chefe da empresa de análises Eleven Financial, o problema é que a empresa promete muito mas entrega pouco. “Há meses parece que a Rumo vai dar um salto, mas não acontece nada. Ela gera caixa, recebe aportes de recursos e, ainda assim, o lucro não aparece”, diz. As ações da companhia valorizaram 31% nos últimos 12 meses, mais que o triplo do índice Bovespa no período. Em agosto (até o dia 27), porém, após a divulgação dos resultados, os papéis caíram 9%, enquanto o Ibovespa teve uma baixa de 3%.
Fontana Neto diz estar confiante que a Rumo conseguirá renovar a concessão da Malha Paulista. Ele afirma que “amplos setores da sociedade” sabem que é necessário modernizar as ferrovias do país e atrair investimentos para o setor. Isso ninguém discute. Para a Rumo, porém, é importante que o governo e a Justiça decidam rapidamente de que forma os investimentos poderão ser feitos. Em final de mandato, e sem clareza quanto a quem vai ocupar o Planalto em 2019, é um cenário incerto.