Índio da Costa, do Cruzeiro do Sul: investidores mais retraídos (Fernando Moraes/EXAME.com)
Da Redação
Publicado em 2 de julho de 2012 às 07h41.
São Paulo - Por muito tempo, o banco mineiro BMG foi alvo da cobiça da concorrência. Dono de uma carteira de empréstimos que crescia muito mais rápido que a média do mercado e mais rentável que seus pares, o BMG foi sondado pelas maiores instituições financeiras do país, todas interessadas em adquiri-lo.
Na época, o banco tinha uma invejável operação de crédito consignado, modalidade de empréstimo para funcionários públicos e aposentados. Ricardo Guimarães, presidente do BMG, recusou as propostas porque estava interessado em fazer uma oferta de ações na bolsa — como, aliás, fizeram outros dez bancos médios no país em 2007.
Mas o BMG não abriu o capital, não foi vendido e acabou tendo de enfrentar sozinho a virada por que passou o setor. Em 2008, com o aumento brutal da concorrência, seus resultados começaram a piorar. Agora, a instituição busca uma nova injeção de recursos — e, nessa nova realidade, não tem sido tão fácil encontrar interessados.
Embora ainda seja superior à média do setor, a rentabilidade do BMG caiu pela metade nos últimos cinco anos. “Queremos vender de 20% a 30% do banco, mas ninguém está batendo à porta”, diz Márcio Alaor de Araújo, vice-presidente da instituição. “O mercado está difícil.”
O BMG é um dos principais bancos de médio porte do país. Tem 19 bilhões de reais em ativos, o que o coloca na 19ª posição entre as maiores instituições financeiras que operam aqui. Com o tamanho que tem, é natural que seus resultados sirvam de termômetro para o setor. A vida, em resumo, não está fácil para os bancos médios brasileiros.
Os resultados de todos eles têm piorado. Em 2011, três dessas instituições ficaram com seu patrimônio líquido abaixo dos níveis mínimos exigidos pelo Banco Central e acabaram vendidos — o Matone, adquirido pelo Original, controlado pelo frigorífico JBS; o Schahin, pelo BMG; e o Prosper, pelo Cruzeiro do Sul.
Outro, o Morada, foi liquidado pelo BC porque não tinha capital suficiente para manter sua operação (e não havia compradores interessados em salvar a instituição, que tinha 700 milhões de reais em ativos).
Dois soçobraram por suspeita de fraude, o PanAmericano e o Cruzeiro do Sul, que era controlado pelo banqueiro Luis Octavio Índio da Costa e sofreu intervenção do BC em junho — jogando, mais uma vez, uma sombra sobre a credibilidade do setor.
O que leva a essa série de más notícias? A crise de 2008 foi um divisor de águas para os bancos médios. Por não ter redes de agências e grandes somas de depósitos em conta-corrente, precisam levantar dinheiro com investidores para se financiar. Como o pânico pós-Lehman Brothers diminuiu o apetite por risco no mundo todo, essas captações ficaram bem mais difíceis.
A crise, afinal, teve sua origem justamente nos bancos de investimento americanos, que também não têm depósitos e dependem do mercado, dia a dia, para se financiar.
Diante dessa mudança, os bancos brasileiros passaram a conseguir dinheiro vendendo suas carteiras de crédito para os grandes, como Bradesco e Banco do Brasil — com isso, recebiam recursos de forma antecipada pelos empréstimos que faziam. Tudo ia bem até que surgiu a denúncia de fraude no PanAmericano.
Seus diretores foram acusados de vender a mesma carteira a mais de uma instituição, o que colocou esse modelo de financiamento sob suspeita. Banco do Brasil, Bradesco, Itaú e Santander, que eram os maiores compradores de carteiras do país, praticamente saíram desse mercado num primeiro momento.
Passado o susto inicial, eles voltaram a comprar, mas bem menos do que faziam antes e na base do subsídio: o BC permitiu o uso de parte dos depósitos compulsórios, um dinheiro que fica parado com baixa remuneração, para a aquisição de carteiras.
Para os bancos especializados em crédito consignado, outro fator tem tornado o momento difícil: o forte aumento da concorrência. Banco do Brasil, Bradesco, Itaú e Santander entraram em peso nesse segmento a partir de 2009 e, hoje, são responsáveis por mais da metade desses financiamentos.
A competição, naturalmente, não tem sido de igual para igual. Como contam com uma ampla rede de agências, os líderes chegam com mais facilidade aos clientes. E os bancos médios acabam dependendo dos “pastinhas”, aqueles profissionais autônomos que fazem a ponte entre a instituição e o tomador do empréstimo.
As comissões pagas aos pastinhas, nesse novo cenário, estão aumentando: há quem cobre até 25% do valor do crédito (no passado, não passava de 10%). Custa caro e, para os bancos, não há nenhuma garantia de fidelidade. É comum que os pastinhas tentem roubar os clientes que já tomaram empréstimos em outros bancos, oferecendo juros menores.
“O pastinha é pago assim que o crédito é concedido, então o banco que fez o empréstimo perde o cliente e o valor da comissão”, diz Érico Ferreira, presidente da Associação Nacional das Instituições de Crédito. Assim, é natural que os resultados desses bancos tenham piorado. A rentabilidade do Bonsucesso, um dos líderes em consignado, caiu 61% em 2011.
O Fibra, que é controlado pelo grupo Vicunha e há dois anos comprou a operação de consignado do Sofisa, teve prejuízo de 83 milhões de reais. O Rural também fechou o ano no vermelho e decidiu encerrar as operações de consignado.
Como enfrentar essa nova fase? Que modelo sustentará os bancos médios? As respostas estão em aberto, mas já dá para vislumbrar o que não fazer. De forma geral, os bancos estão substituindo os empréstimos consignados por linhas de financiamento a pequenas e médias empresas, um nicho, por enquanto, menos concorrido.
Bancos especializados nesse segmento, como Daycoval, Indusval e Pine, conseguiram melhorar seus retornos em 2011. Para as instituições que ainda operam com o consignado, uma medida do Banco Central pode ajudar a desanuviar o ambiente. O governo está criando uma “central de crédito” — banco de dados que reúne os empréstimos feitos pelos bancos médios.
O objetivo é permitir que instituições interessadas em comprar esses créditos saibam exatamente o que está ocorrendo com eles — uma forma de mostrar ao mercado quem está fazendo as coisas direito. Mesmo assim, há forças que atuam em sentido contrário. A principal é a queda dos juros, que forçará os bancões a vasculhar o mercado em busca de clientes.
A concorrência fatalmente chegará às pequenas empresas. Quem encontrar um novo modelo agora estará mais bem preparado para o acirramento da competição que vem aí.