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Na Lego, até tijolinhos cor-de-rosa

Com as vendas em alta, tudo poderia ser uma grande festa para a Lego. Mas a empresa continua querendo se reinventar — e uma das formas de fazer isso é vender mais para as meninas

Loja em Tóquio: até os 5 anos de idade, meninos e meninas gostam dos bloquinhos. Depois, elas perdem o interesse  (Kazuhiro Nogi/AFP)

Loja em Tóquio: até os 5 anos de idade, meninos e meninas gostam dos bloquinhos. Depois, elas perdem o interesse (Kazuhiro Nogi/AFP)

DR

Da Redação

Publicado em 30 de abril de 2011 às 08h00.

Nos 4 minutos necessários para ler este artigo da primeira à última linha, cerca de 210 000 peças de Lego serão produzidas. Com quase 80 anos de existência, a fabricante de brinquedos dinamarquesa exibe um vigor invejável. Considerando-se o apelo dos eletrônicos e das novas possibilidades de lazer e diversão trazidas pela internet, não deixa de ser surpreendente que a velha brincadeira de construir utilizando blocos continue conquistando adeptos.

Pelo último balanço, anunciado em março, o faturamento da Lego cresceu 27% e atingiu 2,8 bilhões de dólares, o lucro de 666 milhões foi recorde e a fatia no mercado global subiu de 4,8% para 5,9%, o que consolidou a empresa como a quarta maior indústria de brinquedos do planeta. Isso tudo num mercado estagnado e partindo de uma boa base — a Lego manteve o faturamento e a rentabilidade em alta mesmo nos piores momentos da última crise econômica mundial.

Mesmo com números tão bons, a Lego está empenhada em uma reformulação típica de empresas em busca do tempo perdido. Dos 242 itens do catálogo atual, 209 foram renovados ao longo do último ano ou são totalmente novos. Uma das inovações de 2010 foi o Lego Universe, jogo em que a brincadeira de montar se torna virtual e, graças à internet, pode ser compartilhada por crianças geograficamente distantes umas das outras.

A empresa também lançou recentemente seus primeiros jogos de mesa, ainda não disponíveis no Brasil. E até seus tradicionais tijolinhos passaram por uma reformulação. Para tentar vender mais para as meninas, quatro novos produtos da linha Belville, cujo tema é a vida na fazenda, chegaram às lojas com tons suaves e cor predominante rosa.

Pesquisas mostram que, até os 5 anos, o mesmo número de meninos e meninas brinca com os produtos da Lego. Depois dessa idade, as meninas começam a se interessar por outros brinquedos e acabam respondendo por apenas 20% das vendas. 


O que explica a inquietude da Lego é a crise vivida no final dos anos 90. Em 1998, a empresa começou a perder dinheiro e no biênio 2003-2004 bateu no fundo do poço, com quedas no faturamento de 26% e 20%, respectivamente. Foi nessa época que Kjeld Kirk Kristiansen, neto do fundador, perdeu o cargo de principal executivo e a gestão foi profissionalizada — situação mantida até hoje.

Dessa fase ficaram algumas lições. Adaptar a logística às reais necessidades do mercado foi uma delas. A empresa oferecia entregas diárias a seus principais clientes, mas a maior parte deles não precisava desse serviço. Reduzir os estoques foi outra. Por último, mas não menos importante, a empresa passou a dar a devida atenção à necessidade de ampliar seu público.

Marcas que se tornam sinônimo de um produto — a ponto de seus nomes serem citados como substantivos, como é o caso da Lego — correm o risco de se tornar reféns de seus carros-chefe. Qualquer mudança é vista com receio pelos controladores —  e, muitas vezes, também pelo mercado consumidor.

A Gillette é um exemplo de marca que enfrentou dificuldades para expandir seu mercado para além das lâminas e cremes de barbear. “Esse movimento de expansão é muito delicado, pois tem de ser feito sem ameaçar a identidade da marca, o maior patrimônio da empresa”, diz Lizzie Sorensen, uma das fundadoras da 32FMG, consultoria de branding de Nova York.

Novas e velhas fronteiras

Nos próximos anos, o objetivo da Lego é reforçar três diferentes mercados consumidores. O principal deles é o dos Estados Unidos, o maior do mundo para o setor de brinquedos. A fatia da Lego está em 5%, mas seus executivos avaliam que haja espaço para crescer. O mesmo vale para o Leste Europeu, onde as vendas crescem acima da média.


E, claro, há os mercados emergentes — mais precisamente Brasil, China, México e Índia. No ano passado, a operação brasileira da Lego cresceu 30% no embalo da economia aquecida. “Cada criança brasileira costumava ganhar, em média, seis brinquedos por ano.

Agora, com a proliferação das festas de aniversário nas escolas, a média subiu para oito”, diz Synésio Batista da Costa, presidente da Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos, conhecida pela sigla Abrinq.

O primeiro passo da estratégia de crescimento no Brasil foi dado há três anos, com a redução dos preços. “Precisávamos aumentar nossa competitividade nos pontos de venda”, diz Robério Esteves, diretor de operações da Lego no Brasil.

Dessa forma, uma parcela maior dos produtos da empresa entrou na faixa abaixo dos 50 reais, considerada teto para boa parte dos consumidores.

Há exatamente um ano foi inaugurada a primeira loja exclusiva da marca no país, no Shopping Cidade Jardim, um dos mais sofisticados de São Paulo. A empresa ainda não definiu os próximos passos. Para reforçar a presença da marca, não está descartada a construção de um parque Legoland no Brasil — possibilidade que começa a ser debatida nas reuniões dos executivos, tijolinho por tijolinho.

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